Primeira índia mestra em direito critica equívocos sobre índios nos livros escolares

Brasília – No Dia do Índio, muitos protestos e reivindicações foram organizados em todas as regiões do país. Os índios brasileiros querem mais respeito e reconhecimento. Atualmente, existem cerca de 700 mil índios espalhados em 230 diferentes povos.

Para a primeira índia com mestrado em direito no país, a advogada Fernanda Kaingang, não há motivos de comemoração se pensarmos na situação de “penúria, miséria e violação de direitos” que ainda se encontram muitos povos.

Na opinião da diretora-executiva do Instituto Indígena Brasileiro para a Propriedade Intelectual (Inbrapi), é possível apenas celebrar o fato de o Brasil ainda concentrar uma grande diversidade cultural.

“O problema é que ainda existe muita falta de informação das pessoas com relação aos povos indígenas e suas diversidades e especificidades. É um preconceito mascarado", denuncia Fernanda Kaingang, gaúcha, pós-graduada na Universidade de Brasília (UnB).

"Os livros escolares trazem informações equivocadas dos índios. Sempre falam que nós só cassamos e pescamos. Não, nós não fazemos parte do passado, nós somos parte do presente do país e temos muito a contribuir com o Brasil.”

No Inbrapi, a advogada trabalha pela defesa dos conhecimentos tradicionais das tribos e com o devido reconhecimento das tecnologias indígenas. Ela diz que Brasil ainda possui políticas públicas insuficientes para os índios e a educação permanece em segundo plano.

“Os índices de analfabetismo são enormes, são maiores que no resto da população. Não existem política públicas para povos indígenas em nível superior. Não se pensou que um índio poderia fazer uma graduação e muito menos uma pós-graduação. Foi um surpresa quando me formei a primeira mestra indígena em direito no país.”

De acordo com Fernanda Kaingang, a geração dela é consciente com relação os problemas enfrentados pelos seus povos, como a insuficiência de terras, desnutrição de crianças e desrespeito aos direitos humanos. Por isso, a universidade foi vista como uma possibilidade de “adquirir conhecimentos e atuar na luta de povos”.

“Nós sabemos exatamente o que queremos. Nós queremos de volta a nossa auto-determinação, de dizer como vai ser nossa educação, de ter as nossas terras, de ver respeitadas as nossas terras. Queremos ver nossas crianças tendo aulas nas línguas indígenas. Enfim, que possamos ser brasileiros, mas com uma cultura específica anterior ao próprio Brasil."

Essa luta, segunda a advogada, requer mudanças estruturais nas organizações que hoje apóiam as causas indígenas, como a Fundação Nacional do Índio (Funai).

“A Funai deve ser urgentemente reestrutura e fortalecida, tanto no que diz respeito aos recursos quanto na infra-estrutura, nos funcionários. Ter realmente o apoio efetivo do governo, que deveria elaborar política específicas e consistentes para os índios”, opina Fernanda Kaingang.

"Queremos parlamentares conscientizados e não necessariamente índios políticos, mas se acontecem seria ótimo, mas o que buscamos mesmo são pessoas capazes de apoiar nossa luta, nossa causa, que é legítima. É mais que uma questão de formação ou de ideologia, é uma questão de vida, de tradição e história.”
 

Índios Xavante retornam à terra tradicional em Mato Grosso

Os índios Xavante da terra Marãiwatséde, de Mato Grosso, conseguiram, na segunda-feira (5), o direito legal de retornar à sua terra tradicional. Pelo menos 1.500 índios poderão viver na área de onde foram retirados há 40 anos, por aviões da Força Área Brasileira, por fazendeiros e padres. Durante todo esse tempo, a área ficou ocupada por fazendeiros, jagunços e moradores de assentamentos da reforma agrária.

A peregrinação dos indígenas foi longa. Eles passaram por vários territórios, sofreram com a retirada forçada e com as doenças que mataram dois terços da aldeia. Cerca de 230 índios foram retirados das terras. Segundo o coordenador do Programa Xavante e administrador da Fundação Nacional do Índio (Funai) em Goiânia, Edson Beirez, eles foram persistentes e pacientes em esperar pela decisão da Justiça.

“Ficamos surpresos com a postura dos índios em esperar a decisão judicial de forma tranqüila. Os Xavantes são conhecidos como guerreiros, mas ficamos bastante satisfeitos porque a decisão foi favorável e, finalmente, a justiça foi feita. A decisão tem uma significância grande na sobrevivência cultural dos Xavantes”, destacou Beirez, em entrevista à Agência Brasil.

O processo tramitava na Justiça desde 1995. Em 2004, a ministra Ellen Gracie, atual presidente do Supremo Tribunal Federal, concedeu uma liminar favorável aos Cavantes. Eles ocuparam cerca de 40 mil hectares e já têm uma aldeia formada. Faltava a decisão da Justiça sobre a devolução da terra, em sua totalidade, aos índios. A área soma 165 mil hectares e se localiza nos municípios de São Félix do Araguaia e Alto da Boa Vista, em Mato Grosso.

Na opinião do presidente da Funai, Mércio Pereira Gomes, a decisão mostra “que a justiça tarda, mas não falha” e que a história dos índios é quase de “genocídio”, já que vários morreram apenas 15 dias após a retirada de 1966.

“Eles foram vivendo em várias terras, mas sempre pensando em voltar para a Marãiwatséde. Lutaram muito, demos nosso apoio, e eles esperaram a sentença da Justiça. Essa decisão é importante porque reconhece de fato a terra indígena, de direito, e prevê a retirada daqueles que não são indígenas. Ficamos muito felizes. Podemos comemorar que a justiça tarda, mas não falha”, avaliou Pereira.

O sertanista da Funai na região Denivaldo da Rocha conta que a comunidade indígena está em festa e que tudo que os índios queriam na vida era ocupar suas terras tradicionais. “O cacique veio falar comigo, me cumprimentar e contar que a aldeia está em festa , e que os índios estão muito felizes com a decisão”.

A decisão da 5º Vara da Justiça Federal de Cuiabá, assinada pelo juiz José Pires da Cunha, prevê a desocupação dos fazendeiros, posseiros e qualquer outro invasor da terra de Marãiwatséde imediatamente, e que essa pessoas façam o reflorestamento da área.

O juiz determina ainda que os posseiros cadastrados no Programa de Reforma Agrária, cerca de 3 mil famílias, sejam reassentados na fazenda Guanabara, próxima à terra indígena. Elas não terão direito a nenhuma indenização, já que, na opinião do juiz, as ocupações foram de má-fé.

Para presidente da SBPC, conselho de biossegurança “não funcionou”

A aprovação da Medida Provisória 327, que traz modificações à Lei de Biossegurança, é motivo de preocupação para o presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Ennio Candotti. Ele lembrou que a lei já existe e define objetivamente os papéis da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) e do Conselho de Biossegurança (CNBS).

“A medida atropela um sereno exame da questão. A Lei de Biossegurança foi feita por acordos. As liberações comerciais devem passar por avaliação técnica. Mas outras questões, como interesses políticos, também devem ser levadas em conta. Esse papel, no entanto, cabe ao conselho de ministros”, afirmou, em entrevista hoje (22) à Agência Brasil.

O CNBS analisa a viabilidade econômica dos projetos. É ligado diretamente à Presidência da República e formado por 11 ministros – o da Casa Civil preside as sessões. E pode vetar projetos já aprovados pela CTNBio.

Na opinião do professor Candotti, o conselho de ministros "não funcionou" nos 13 meses de atuação da CTNBio, já que não foi consultado sobre as divergências entre os membros da comissão.

“O Congresso Nacional não levou em consideração a possibilidade de levar as questões ao conselho superior. Eu recomendaria ao governo um exame cuidadoso da questão. O conselho nacional deve receber as responsabilidades que lhe cabem, ou não tem razaão de existir. O Congresso não pode legislar sobre questões que ele já definiu”, disse.

O texto da MP 327 trata de três pontos centrais: a liberação comercial de uma variedade de algodão transgênico ainda não liberada pela CTNBio; a mudança no sistema de votação da Comissão, que agora passaria a ser de maioria absoluta e não mais de maioria simples; e também a permissão do cultivo de trangênicos nas zonas de amortecimento (faixas de 500 metros entre as plantações e as áreas ambientalmente protegidas) de unidades de conservação.

A MP seguiu para apreciação no Senado Federal.

Ambientalista considera aprovação da MP 327 “descaso com a população”

A ambientalista Gabriela Vuolo, da Organização Não-Governamental(ONG) Greenpeace, considerou lamentável a aprovação, na Câmara dos Deputados, da MP 327, que altera as regras para o plantio de transgênicos no entorno das unidades de conservação. Em entrevista à Agência Brasil, ela disse que a medida “comprova o descaso com as questões ambientais, com a população”.

Entre os principais pontos da MP, está também a liberação comercial de uma variedade de algodão transgênico, ainda não liberado pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), que já foi plantado e colhido. Na opinião de Gabriela Vuolo, está "acontecendo o mesmo que ocorreu com a soja, a política do fato consumado".

Outro ponto da MP 327 diz respeito à mudança no sistema de votação da CTNBio. Agora, para liberar comercialmente um produto transgênico, o quórum será de 14 votos, ou seja, maioria absoluta, e não mais de dois terços (18 votos) como foi todo o processo durante os 13 meses de funcionamento da comissão. No total, A CTNBio é formada por 27 membros.

Segundo a ambientalista, a entidade não vai desistir da luta: “vamos continuar lutando para que a biossegurança do Brasil seja respeitada. A segurança das pessoas, dos agricultores, deve ser garantida. Essa aprovação da Câmara mostra uma tendência muito séria de privilegiar uma minoria, como a bancada ruralista, os grandes agricultores, o lobby do agronegócio e da indústria de biotecnologia”.

A medida provisória permite o cultivo de transgênicos nas zonas de amortecimento (faixas de 500 metros entre as plantações e as áreas ambientalmente protegidas) de unidades de conservação, em áreas de proteção de mananciais de água utilizável para o abastecimento público e nas áreas declaradas como prioritárias para a conservação da biodiversidade.

A MP segue para preciação no Senado Federal,e deve ser votada somente na próxima legislatura. "Vamos aguardar a votação no Senado. Se também for aprovada, vamos recorrer ao Executivo, ao próprio presidente, para que ele vete a MP", acrescentou Vuolo.