Marina descarta pressão para licenciamento ambiental do projeto de integração do S. Francisco

Para que o projeto de Integração do São Francisco saia do papel, deve passar por todas as etapas de audiências pública estipuladas pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), ter seu Estudo de Impacto Ambiental (EIA) aprovado e a licença prévia concedida para o início de licitação das obras.

A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, disse que no cronograma de licenciamento ambiental não há pressão ou atitude do seu ministério, ou do Ibama, para que se tenha um licenciamento "a toque de caixa". A ministra presidiu hoje a reunião extraordinária do Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH), onde foi aprovado parecer da Agência Nacional de Águas (ANA) sobre a capacidade hídrica do Rio são Francisco.

"Não há pressão para um licenciamento a toque de caixa em fevereiro ou qualquer data que não signifique resolver adequadamente todas as questões que devam ser resolvidas no âmbito do licenciamento ambiental", afirmou Marina Silva.

A ministra acrescentou que o processo de audiências públicas, iniciado no fim de semana, é complexo e que não "há insinuação de atropelamento do que deva ser tecnicamente observado".

No fim de semana, Fortaleza sediou durante cerca de seis horas a primeira audiência pública do projeto. De acordo com João Urbano Cagnin, diretor técnico do Ministério da Integração Nacional, as maiores preocupações dos participantes da audiência foram quanto ao local por onde a água passará, o custo dessa água e a questão das desapropriações ao longo do canal.

"São preocupações legítimas e as audiências nos ajudam a levantar estas questões e a dar respostas concretas. Vai haver um programa de ação fundiária, ao longo dos canais, que beneficiará os pequenos produtores rurais de agricultura familiar. Além disso, há um decreto declarando de utilidade pública uma faixa de cinco quilômetros a partir das margens dos canais. O Instituto Brasileiro de Colonização e Reforma Agrária (Incra) já começou a fazer o levantamento na região", contou.

Mais sete audiências estão programadas até o dia 2 de fevereiro, no Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia e Minas Gerais

Conferência Terra e Água termina após participação de 40 movimentos e 9 mil militantes

A Conferência Nacional Terra e Água reuniu nove mil trabalhadores, durante os quatro dias de debate, em Brasília. Conseguiu, pela primeira vez, unir mais de 40 entidades representativas de movimentos sociais, que lutam pela causa da posse da terra e do uso racional dos recursos hídricos.

Além disso, elaborou um documento, o Manifesto da Terra e da Água, a ser entregue ao presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, com as reivindicações de todos. Nele, há uma crítica ao modelo econômico do governo e ao modelo agrícola desenvolvido no Brasil. A principal reivindicação é pela Reforma Agrária.

"No documento, pedimos ainda acesso à terra, à uma energia que não agrida o meio ambiente, distribuição de renda e respeito à natureza. O manifesto chama a atenção para o problema da política econômica do governo, porque é um dos entraves para o desenvolvimento de uma economia voltada para o mercado interno, para o desenvolvimento interno e não para as exportações", disse o representante da Comissão Pastoral da Terra (CPT), Isidoro Revers.

Isidoro disse que a expectativa dos grupos presentes foi superada, tanto do ponto de vista da quantidade de participantes quanto da qualidade das discussões. O evento se encerra com uma marcha, que seguiu do Ginásio Esportivo Nilson Nelson até o Banco Central.

Manifesto da Conferência Nacional Terra e Água pede urgência na reforma agrária

A Conferência Nacional Terra e Água termina hoje, em Brasília, e o manifesto que será entregue ao presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva já está pronto. Ele foi lido, pela manhã, para os cerca de nove mil participantes, entre trabalhadores rurais, atingidos por barragens, quilombolas, ribeirinhos e indígenas. Segundo o documento, foi reafirmada, durante a conferência "a necessidade urgente de uma reforma agrária ampla, massiva e participativa".

Além disso, o texto diz que é "fundamental e urgente a democratização do acesso à terra, com a garantia da autonomia dos territórios das populações tradicionais, fortalecendo a agricultura familiar e camponesa, garantindo o direito à água, ao acesso aos recursos naturais, à produção de alimentos saudáveis, à soberania alimentar e à preservação da biodiversidade".

As mais de 40 entidades que produziram o manifesto se comprometem "a buscar uma relação diferente, respeitosa e integral, com a terra, a água", por meio da luta por mudanças na estrutura fundiária. "A luta e o compromisso dos participantes da Conferência Nacional Terra e Água são pela construção de um projeto de sociedade justa, igualitária, solidária, democrática e sustentável", afirma o documento.

Ao longo do texto os manifestantes acusam "a política formulada no governo FHC e mantida no governo Lula" como a principal causa do agravamento da situação social e da degradação ambiental. Segundo o documento, a pobreza e a desigualdade foram mantidas, além de taxas de desemprego insustentáveis. Como conseqüências do modelo, cita a marginalização, criminalidade, impunidade e insegurança e exemplifica com casos como o assassinato de sem-terra em Minas Gerais e os crimes contra os indígenas da Reserva Raposa Serra do Sol.

De acordo com o documento, "é fundamental a realização de uma mudança profunda na atual política macro-econômica, reduzindo as taxas de juros e o superávit primário" (relação entre receita e despesa do governo), utilizando os recursos para a geração de empregos e expansão de serviços públicos.

Pequenos agricultores criticam modelo que prioriza o agronegócio

Durante a Conferência Nacional Terra e Água, realizada em Brasília, os pequenos agricultores criticaram a hegemonia do agronegócio no país. Segundo o coordenador do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Romário Rossetto, o agronegócio gera 5% dos empregos no Brasil, enquanto a maioria, 84% deles, é gerado pela agricultura familiar.

"A produção dita do agronegócio em propriedades acima de mil hectares é de 21% no caso da soja. Enquanto nas que têm até 100 hectares são produzidas 32% da soja do país. O agronegócio desemprega pelo uso de altas tecnologias, substituindo a mão-de-obra familiar", ressalta Romário Rossetto. Ele acrescenta que o problema da posse da terra no Brasil não está só no desenvolvimento agrário mas na política econômica do governo federal.

Paulo Kageyama, diretor do Programa Nacional de Conservação da Biodiversidade, do Ministério do Meio Ambiente, diz que houve uma priorização do governo em relação ao nivelamento da balança comercial para que "as contas ficassem melhor", gerando assim o superávit primário. "Estamos fazendo todo o empenho para que o lado da agricultura familiar seja visível também. Sempre pareceu que este lado era pouco produtivo, o que não é verdade. A produção de alimentos no Brasil é feita basicamente pela agricultura familiar", reforça.

Kageyama concorda com a discrepância de empregos gerados e disse que cinco milhões de agricultores vivem da agricultura familiar no campo, enquanto há 500 mil grandes propriedades. "São 10% contra 90%. A grande maioria das propriedades é de agricultura familiar", acrescenta.

Ele diz ainda que a luta dos movimentos sociais na conferência é importante para fazer frente à força do agronegócio. "Estamos dando total apoio a esta mobilização. Esperamos que haja um contrabalanceamento, que este segmento [agricultura familiar] tenha muita importância também, porque socialmente é muito importante e cria empregos", defende.