Estudo de geógrafo aponta novo perfil da violência no campo

O crime na área rural brasileira mudou de perfil. Em vez de matar de forma indiscriminada, os assassinos agora escolhem suas vítimas, praticam tortura e intimidação para expulsar os pequenos agricultores da terra. A nova forma de agir foi verificada pelo geógrafo Francisco José Avelino Júnior.

Professor da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), ele acaba de finalizar uma tese de doutorado na Universidade de São Paulo (USP). O estudo traz um panorama histórico sobre a violência no campo em Mato Grosso do Sul, mas também destaca os dados mais recentes sobre o tema em todo o Brasil.

"Não só aqui no estado, mas em quase todo o Brasil, o número de assassinatos tem diminuído. Em compensação, tem aumentado o número de ações terroristas, ameaças de despejo, queima de terras, invasão de casas, seqüestro de pertences e intimidação do trabalhador. O assassinato passa a ser seletivo", diz Avelino.

As principais vítimas fatais agora são líderes camponeses, advogados, políticos e agentes sociais que agem em defesa dos direitos de trabalhadores rurais. Eles fazem parte de organização que, a partir da década 80, passaram a atuar no campo. Entre elas, Comissão Pastoral da Terra (CPT), a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

O estudo do pesquisador do Mato Grosso do Sul confirma a tendência apontada no último relatório da Comissão Pastoral da Terra (CPT) de aumento e profissionalização dos assassinos da área rural. Em 2003, 73 pessoas morreram em conflitos no campo. Esse número caiu para 39 em 2004. Mas, em compensação, o número de pessoas envolvidas nos conflitos agrários subiu de 1,6 mil para 1,8 mil.

Balanço da Comissão Pastoral da Terra aponta 161 ameaças de morte em 2004

Dados parciais da Comissão Pastoral da Terra (CPT), indicam que 161 pessoas foram ameaçadas de morte no país, em 2004, em decorrência dos conflitos agrários. Só no estado do Pará foram denunciadas 40 ameaças, entre elas a da agente pastoral Dorothy Stang, assassinada no sábado (12) em Anapu. Nessa mesma região, a CPT registra duas outras pessoas ameaçadas de morte: Domingos Araújo Gomes e Ondino Ferreira da Conceição, ambos líderes de movimentos sociais que atuam contra grileiros e madereiros.

Em entrevista coletiva à imprensa, Dom Tomás Balduino, presidente da CPT, acusou o governo do Pará de estar envolvido nos crimes ocorridos no estado. "A corrupção está instalada, há um desgoverno e a polícia não é de confiança", afirmou. Os policiais, acrescentou, agem como pistoleiros: "O pistoleiro é o soldado, é quem anda fardado."

O presidente da CPT afirmou ainda que as questões agrárias no estado do Pará são um grande desafio para o governo federal, porque o crime organizado atua na região como "um Estado paralelo". E acusou o governo do estado de estar pactuado com o crime organizado: "Eles financiam as campanhas políticas, eles entram e saem do palácio do governo com tranquilidade."

Na opinião de Dom Tomás Balduino, o assassinato da missionária Dorothy Stang será solucionado. Entretanto, alertou, o que deve ser observado pelo governo é o que está por trás dos crimes, é a reforma agrária que deve ser feita: "O que está acontecendo com esse país é intolerável e não só no Pará. O Estado brasilieiro precisa assumir para que a justiça social seja aplicada".

Sobre a presença do Exército na região dos crimes, Dom Tomás Balduíno disse acreditar que os 2 mil soldados não vão resolver a questão de forma definitiva. Argumentou que durante a ditadura militar "também tentaram resolver", mas reforçou que está cobrando a presença do Estado, embora não goste de ver situações como essa conduzidas pelos militares. E alertou que é o governo precisa fornecer a infra-estrutura adequada à ação dos policiais na região.