Ibama inicia campanha Operação Mata Nativa para combater desmatamento na caatinga

O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) lançará amanhã (25) a Operação Mata Nativa, inicialmente na região de caatinga do Araripe (PE), contra o desmatamento desse bioma. Segundo João Arnaldo Novaes, superintendente do Ibama de Pernambuco, a região é o segundo maior pólo de gesso do mundo e o maior do Brasil.

"Nós temos verificado que o maior foco de desmatamento de caatinga está sendo a geração de matriz energética, ou seja, de lenha e carvão" afirmou Novaes. Segundo ele, as empresas que usam o produto florestal como fonte de energia estão "aquecendo" o mercado ilegal de madeira. Ele afirmou que a indústria siderúrgica e o pólo de gesso são responsáveis pelo uso de quase dois milhões de estéreos de lenha – medida de volume que equivale a um metro cúbico – por ano.

Segundo ele, estudos recentes mostram que a caatinga perdeu 30% da cobertura florestal nos últimos dez anos. "Com essa ação nós pretendemos reverter isso, exercendo um controle sobre o consumo florestal em cada empresa, pelo tipo de forno que possui", afirmou.

Novaes disse que os instrumentos de fiscalização do Ibama eram muito frágeis e explicou como será feito o controle a partir de agora: "Vamos passar a fazer um cálculo do consumo de cada empresa pelo tipo de forno que ela possui e fazer a conferência da produção através do ICMS [Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços]. Então nós vamos cruzar os dados e verificar a demanda de consumo de lenha daquela empresa".

De acordo com o superintendente, "a meta é fazer com que todo consumo de produtos florestais da caatinga seja oriundo de manejo florestal sustentável". Ele informou que esse modo de exploração não causa um impacto representativo ao meio ambiente e não põe em risco a biodiversidade. "Além de beneficiar diretamente o meio ambiente, ainda teremos a garantia da criação de centenas ou milhares de empregos diretos e indiretos", acrescentou.

Segundo Novaes, a campanha de proteção à caatinga é permanente, será estendida a outras regiões e nos próximos seis meses conseguirá conter o desmatamento de mais de 15 mil hectares de floresta. Ele afirmou ainda que junto com a operação será lançada a campanha "Seja Legal" para que as empresas, a sociedade e o governo cobrem e colaborem para que o consumo de produtos florestais seja feito de forma sustentável.

Em Tapajós, comunidades farão manejo madeireiro em grande escala

Ela será a primeira floresta nacional (Flona) do país onde as populações residentes farão manejo madeireiro em grande escala. Em Santarém (Pará), as comunidades da Flona Tapajós devem iniciar o trabalho em outubro. A iniciativa ocorrerá por meio do projeto Ambé, apoiado pelo PróManejo/Ibama.

"O manejo acontecerá em uma área não-populacional de até 200 mil hectares [a área total da Flona é de 551.498 mil hectares]", contou Viviane Gonçalves, coordenadora das ações do PróManejo na Flona Tapajós. Essa iniciativa vai acontecer por meio do projeto Ambé, apoiado pelo PróManejo/Ibama.

As associações e cooperativas locais executarão a atividade em caráter piloto – na Flona existem quatro associações intercomunitárias, nove associações comunitárias e uma cooperativa. "O dinheiro da venda da madeira vai para elas e para os fundos gerais que elas mesmas criaram", explicou Gonçalves.

O PróManejo é um subprograma do Programa Piloto de Proteção das Florestas Tropicais Brasileiras (PPG7), criado a partir da Eco-92 e mantido com verba da cooperação internacional, majoritariamente alemã, e sob a coordenação-geral do Ministério do Meio Ambiente.

As ações do PróManejo na Flona Tapajós se iniciaram oficialmente em 1999. Hoje, estão envolvidas 400 das 1.100 famílias residentes na unidade de conservação. "O que nós temos desenvolvido são iniciativas de manejo madeireiro e não-madeireiro em pequena escala. O objetivo é melhorar a qualidade de vida dos moradores e também gerar referências para outras Flonas da Amazônia", pontuou a coordenadora.

Entre essas atividades, está a produção de óleos essenciais (de copaíba e andiroba), destinada para a indústria de cosméticos do Rio de Janeiro; itens feitos com o chamado couro ecológico produzido a partir da seringa, vendidos para o mercado nacional e para turistas locais; e a confecção de móveis rústicos a partir de madeiras caídas, que é comercializada principalmente na região Sudeste.

"O projeto de financiamento dessas três atividades termina no ano que vem, mas acredito que elas já conquistaram a autonomia", comentou Gonçalves.

O Ministério do Meio Ambiente (MMA) afirma que está estudando uma série de 15 indicadores para avaliar o manejo das florestas. "Esse indicadores foram criados no âmbito do Tratado de Cooperação Amazônica. Até o final do ano, teremos os indicadores validados", contou o diretor de Florestas do MMA, Tasso Azevedo. "Um dos indicadores interessantes é o numero de projetos de manejo florestal certificados segundo padrões sociais, ambientais e econômicos, reconhecidos internacionalmente."

Lei de gestão de florestas é aprovada

A aprovação ontem (6/7), pelo plenário da Câmara Federal do projeto de lei 4776 do executivo, que estabelece a gestão de florestas públicas para a produção sustentável, cria o Serviço Florestal Brasileiro – SBF e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal – FNDF é comemorada pelo WWF-Brasil como um passo importante para o combate ao desmatamento ilegal e o incentivo à modernização do setor florestal brasileiro.  

“É preciso, agora, que o Ministério do Meio Ambiente divulgue quais as áreas públicas disponíveis, pois só 20% delas poderão ser licitadas nos primeiros 10 anos para a exploração privada e sustentável, e os empresários precisam se preparar para isso”, diz Denise Hamú, secretária geral (CEO) do WWF-Brasil . Ela lembra ainda que aumentará a demanda de fiscalização pelo IBAMA e que é preciso que o governo invista mais recursos em suas ações de fomento ao setor florestal, aumentando os recursos destinados ao Centro Nacional de Apoio ao Manejo Florestal – Cenaflor, um centro especializado do Ibama. 

“É fundamental que o Cenaflor possa cumprir com sua missão de treinar os engenheiros florestais para elaborarem os planos de manejo das florestas a serem exploradas e capacitar os funcionários do Ibama para que façam análises criteriosas dos planos de manejo”, diz Mauro Armelin, coordenador de políticas florestais do WWF-Brasil.  O projeto de lei prevê recursos somente para o FNDF, que receberá 70% dos recursos arrecadados, e os 30% restantes irão para o Ibama para as ações de fiscalização.  O dado positivo é que a sociedade civil estará representada no FNDF para decidir, juntamente com os representantes do governo, sobre o uso dos recursos desse órgão de fomento. 

Pelo projeto de lei aprovado, caberá ao SBF o estabelecimento de um plano anual de outorga decidido no seu Conselho Consultivo, o Conaflor e só poderão ser usadas terras com floresta natural.  As concessões serão feitas por um prazo a ser definido conforme o ciclo de colheita. No texto aprovado na Câmara Federal o prazo máximo da concessão florestal foi reduzido de 60 para 40 anos, sendo submetidas a auditoria independente ao final deste prazo. Será também exigido o EIA Rima para essas áreas.

O projeto de lei deve ainda ser aprovado no Senado e a nova lei regulamentada.  Se tudo correr dentro do previsto, os primeiros contratos de concessão poderão ser assinados no segundo semestre de 2006.

Manejo Florestal, grilagem de terras e presença do Estado de Direito na Amazônia

O Projeto de Lei n◦ 4776/2005, que dispõe sobre a concessão de florestas públicas para a exploração madeireira, vem provocando forte polêmica entre ambientalistas, especialistas em florestas e questões amazônicas, autoridades governamentais e membros do Congresso Nacional. Matéria extensa e complexa que dá gancho para interpretações variadas e suscita intermináveis discussões, focadas com maior vigor na Amazônia. Mas, é bom lembrar, que o PL incide também sobre outros biomas como a Mata Atlântica, o Cerrado e a Caatinga, nos quais o interesse se volta para as florestas plantadas e os subprodutos da exploração florestal.

O ISA publicou notícias e análises exaustivas sobre o texto do Projeto de Lei n° 4776/05, e não cabe retomá-las aqui de forma sistemática, para nos concentrarmos em três grandes questões subjacentes a essa discussão, que vão além da letra da lei proposta, como o manejo florestal, a grilagem e o Estado de Direito na Amazônia.

Algumas das críticas ao PL se fundamentam nas disposições que prevêem a concessão de áreas extensas às empresas privadas, para regimes de exploração de longo prazo, até 60 anos, considerados excessivos, ensejando receios de que impliquem na privatização de terras públicas e até na “internacionalização” da Amazônia (no caso de concessões a empresas estrangeiras). Essas críticas possivelmente decorrem de leituras do PL sob a ótica das políticas fundiárias formais, que se orientam para módulos agrários de menor extensão apropriados à produção agropecuária.

A este respeito, a lógica do manejo florestal, para contrapor-se efetivamente à mera extração florestal, responde satisfatoriamente a estas críticas, pois não se pode imaginar que a exploração florestal possa pretender alguma sustentabilidade ambiental atuando em pequenas extensões de terra, ou em curtos ciclos produtivos, pois não haveria possibilidade de regeneração ou reposição dos estoques explorados. Já os receios de que a posse duradoura de particulares sobre as terras possa gerar direitos de propriedade, ou resultar em alienação da soberania do estado, nos parecem exagerados, ou, de qualquer forma, deveriam remeter à discussão de outros dispositivos legais mais objetivamente relacionados, que não este PL.

Por outro lado, estamos longe de dispor de certezas científicas sobre a sustentabilidade do manejo de florestas nativas e heterogêneas. No mínimo, a exploração, mesmo seletiva, implica o empobrecimento da floresta, não apenas pela redução na população de espécies economicamente mais valorizadas, mas pelo impacto à própria biodiversidade, além da abertura de estradas e picadas que fragilizam a floresta e favorecem a sua fragmentação. Portanto, a concessão florestal não é uma panacéia de proteção florestal, mas apenas um mal menor, quando comparada à mera apropriação ilegal das terras e dos seus recursos que prevalece no modelo, até aqui predominante, de ocupação predatória da Amazônia.

Porém, o melhor, do ponto de vista da integridade da floresta, seria a sua preservação até que existam soluções técnicas e científicas que garantam a sustentabilidade da exploração florestal. Mas a sobrevivência das populações, ou dos empreendimentos que dependem dessa exploração estaria prejudicada, o que põe em xeque a viabilidade política desta opção. Aliás, o projeto conta com o apoio destas populações porque prevê o reconhecimento de suas áreas antes que sejam destinadas à concessão.

Além disso, a tese de que a valorização dos produtos da “floresta em pé” é a alternativa estratégica à sua substituição por áreas de pastagem ou cultivo também estaria comprometida pela eventual indisponibilidade, ainda que temporária, dos recursos madeireiros, que já têm algum valor reconhecido no mercado.

Portanto, assim como as críticas ao PL têm um fundo legítimo de desconfiança, no sentido de que o menos mal não deve ser festejado, parece lícito que o governo necessite de melhor instrumento legal para tentar gerir o bonde desgovernado da indústria madeireira. A intervenção do ISA e de outras ONGs nesse processo se deu nestes limites, reivindicando a discussão pública do PL antes do seu envio ao Congresso e sugerindo alterações que minimizam os riscos da lei, que foram acolhidas, até aqui, em grande medida.

Mas há outras questões de fundo relacionadas aos méritos e aos riscos do PL. Subjacente a ele há uma tática para tentar separar a máfia da grilagem da máfia da exploração predatória. No modelo atual elas andam juntas, pois a segunda depende da primeira para atestar, ainda que de forma precária ou criminosa, a disponibilidade de áreas “privadas” para a exploração florestal, o que deixa de ser necessário no regime de concessões. Para os grileiros ficam as penas da lei, para os madeireiros se abre uma alternativa legal. Parece-nos uma tática correta e indispensável para qualquer esforço que pretenda controlar a situação de fato.

No entanto, como poder concedente, o estado estará, sob o proposto marco legal, inteiramente comprometido com o que vier a acontecer nas áreas concedidas, para o bem ou para o mal. Da atual condição de omisso ou conivente, o poder público passará a protagonista. Não haverá como dissociar a responsabilidade do concessionário da do poder concedente. E isto põe em questão, mais do que nunca, a capacidade, ou incapacidade, do estado (governo federal) em atuar no chão. Por essa razão a participação da sociedade civil organizada na fiscalização dos mecanismos de segurança e dos recursos financeiros previstos no projeto é crucial.

Ao dispor sobre a criação do Serviço Florestal Brasileiro, o PL reconhece, implicitamente, a incapacidade crônica do IBAMA em gerir a política florestal, que, de resto, ficou extravagantemente demonstrada com a recente Operação Curupira, que desbaratou a “máfia verde” incrustada nos setores público e privado. Por um lado, parece correto o princípio de que não deve ser o mesmo agente público responsável por conceder e por fiscalizar as concessões. Por outro, a providência sugere que poderá haver mais capacidade para conceder, mas nada garante que haverá mais capacidade para fiscalizar. E se esta não houver, o poder concedente será objetivamente responsável por qualquer estrago que vier a ocorrer.

Assim, a questão decisiva sobre se a nova lei representará vantagem ou desvantagem comparativa em relação ao modelo atual está além da letra da lei e remete à questão da capacidade do estado em operar com um mínimo de eficiência nas situações concretas locais. Sem isto, o PL pode vir a ser mais uma lei a ser burlada. E para isto será necessário muito mais do que o PL: a superação do crônico divórcio entre a burocracia e a realidade, entre a postura cartorial do estado, que pode ser subvertida, e a sua eventual capacidade de estar presente e de operar efetivamente em regiões remotas.

Os céticos dizem que a questão do estado não tem solução (pelo menos à vista), e a experiência real do passado e do presente justificam o seu ceticismo. Por exemplo: os cargos de confiança a serem criados no âmbito do Serviço Florestal serão preenchidos por indicações da base política dos governos? Alguém garante que não?

O ISA entende que o PL (e a lei que dele deve decorrer) não constitui a sangria desatada ou o retrocesso que muitos apontam, assim como não garante, por si mesmo, uma política florestal saneada. Acatamos o intento do governo em dispor de um novo instrumento legal, mas nos resguardamos para cobrar o que nos parece mais essencial: a efetiva vontade política de se fazer presente no chão e de aplicar a legislação, o que é incompatível com o loteamento da administração segundo interesses políticos locais, freqüentemente associados aos interesses do modelo predatório.