Mortalidade de crianças indígenas deve voltar a cair este ano, indicam parciais

Brasília – Um levantamento parcial da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) indica que a mortalidade infantil dentro das aldeias indígenas brasileiras deve voltar a cair este ano. Até outubro, foram registradas 35,3 mortes para cada mil nascimentos.

De acordo com o presidente da Funasa, Paulo Lustosa, os números ainda são parciais, mas já correspondem a uma parte significativa do ano, pondendo indicar uma tendência de redução na estatística em relação a 2005, quando a mortalidade infantil entre crianças indígenas foi de 53,1 mortes para cada mil nascimentos.

“O Brasil possui 170 etnias indígenas, cada uma tem hábitos e costumes distintos. Estamos fazendo com que a nossa medicina não queria se impor aos índios”, disse o presidente da Funasa durante a 1ª Mostra Nacional de Saúde Indígena, em Brasília. “Estamos buscando a integração aproveitando muito da sabedoria das populações indígenas e suas práticas."

Em 2000, quando a Funasa tornou-se responsável pelas ações em saúde indígena, 74,6 crianças em cada mil nascidas morriam antes de completar um ano de idade – recorte de tempo usado para o cálculo da mortalidade infantil. Já no ano seguinte, em 2001, o índice caiu para 57, 2 mortes para cada mil crianças nascidas vivas.

Em 2002 e 2004, a mortalidade infantil de crianças indígenas continuou a trajetória de queda, com 55,7 e 48,6 mortes para cada mil nascimentos, respectivamente. De acordo com a Funasa, o aumento registrado em 2005 foi resultado das mortes por desnutrição infantil em Mato Grosso do Sul.

Pelos cálculos do Instituto Socioambiental (ISA), no ano passado, a desnutrição infantil vitimou 50,9 crianças indígenas para cada grupo de mil indivíduos. Em 2004, esse índice teria ficado em 48 mortes por desnutrição infantil para cada grupo de mil indivíduos.

O ISA atribui boa parte dos problemas na área de saúde indígena à centralização de recursos na Funasa e ao pouco diálogo com as entidades indígenas representativas.

No início deste ano, o Ministério Público Federal criou um grupo de trabalho para investigar problemas nos convênios firmados entre o governo e as organizações que realizam o atendimento à saúde indígena. 

Mais duas crianças indígenas morrem de leishmaniose em Mato Grosso do Sul

Duas crianças da aldeia indígena de Pirakúa, no município de Bela Vista (MS) morreram vítimas de leishmaniose visceral, ou calazar. Um menino de três anos morreu na madrugada desta segunda-feira (4), depois da morte de seu irmão, de dois anos, na sexta-feira.

Em menos de três dias, foram duas mortes por leishmaniose, confirmada após exame laboratorial solicitado por uma equipe da Funasa (Fundação Nacional de Saúde) em Dourados (MS). Com esses casos, segundo o coordenador regional da Funasa em Campo Grande (MS), Gaspar Francisco Hickmann, aumenta a suspeita de que a leishmaniose causou a morte de outras crianças indígenas na região. "Qualquer pessoa com leishmaniose, indígena ou não, vai ter desnutrição. Os dois irmãos que morreram estavam desnutridos, mas o que nós avaliamos é que a desnutrição nesse caso foi conseqüência da leishmaniose, já que não é desnutrição que leva a pessoa a ter essa doença, que também reduz a resistência imunológica", informou.

Ainda de acordo com Hickmann, a desnutrição só consta como causa principal na declaração de óbito de duas das 16 crianças Guarani-Kaiowás. "Nos demais casos, a desnutrição aparece como fator coadjuvante. Isso significa que no momento do óbito se observou a existência de outro quadro. As causas podem ser diversas. Há casos de crianças que ficaram internadas por mais de seis meses e não é possível que não tenham recebido alimento dentro do hospital", afirmou.

O coordenador regional do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) em Mato Grosso do Sul, Egon Heck, disse acreditar que "se não houver uma política que inclua ações a médio e longo prazo, a sociedade terá de conviver com a continuidade de notícias sobre a morte de crianças". E considerou que as mortes, "seja por desnutrição ou por leishmaniose, devem-se à falta de articulação do governo com os povos indígenas. As mortes se devem a uma falta de estrutura, mesmo. São doenças de alto grau de periculosidade, mas podem ser curadas, quando identificadas e tratadas. Por isso, nada justifica que as mortes continuem ocorrendo mesmo que sejam geradas por causas múltiplas ".

A leishmaniose é transmitida pela picada do mosquito Lutzomya, também conhecido por mosquito palha ou cangalhinha. Para a transmissão, o parasita causador da doença tem que passar de um animal, ou mesmo do homem, para o vetor. O Centro de Controle de Zoonozes de Dourados colheu amostra de 350 cachorros nas aldeias da reserva indígena do município. O resultado dos exames sairá nos próximos dias.

Nos últimos três anos, Mato Grosso do Sul registrou 1.539 casos de leishimaniose, com 121 óbitos, dos quais 41% em Campo Grande, capital do Estado.

Segundo o coordenador da Funasa, a falta de exames pode ter contribuído para a morte das crianças. "O problema é que os hospitais não fizeram exames laboratoriais para identificar os casos, se havia presença da leishmaniose ou não. Esse procedimento tinha que ter sido feito pelos hospitais", alertou.

A Funasa solicitou à Secretaria de Saúde de Dourados a realização de um inquérito sorológico e entomológico para identificar a presença ou não do mosquito transmissor da doença. "O inquérito sorológico se faz por meio da coleta em cães suspeitos, por amostragem", explicou Hickmann, que aguarda o resultado dos exames.

No sábado (2), mais duas crianças haviam morrido na região: uma de um ano, por complicações decorrentes de paralisia cerebral, em Campo Grande; e outra de quatro meses, por insuficiência respiratória e broncopneumonia.

Indígenas reclamam que não estão sendo ouvidos sobre mortes de crianças

"Estamos muito tristes com a morte de dezenas de nossas crianças nestes últimos meses. Ao mesmo tempo em que agradecemos todo apoio e ajuda que estão procurando nos dar, nos sentimos indignados por não estarmos sendo ouvidos e respeitados em muitos aspectos do nosso jeito de ser e nossos direitos". A declaração faz parte do documento divulgado nesta semana pela Comissão de Direitos Indígenas do Povo Kaiowá–Guarani.

Segundo as lideranças indígenas que assinam a nota, as mortes e desnutrição são causadas por vários fatores, mas a falta de terra é apontada como raiz dos problemas. "Aqui no Mato Grosso do Sul, nós indígenas fomos sendo expulsos de nossas terras, assassinados para a entrada de gado e, depois, de grandes plantações monocultoras como a soja. Foi um processo de violência contra as pessoas e contra as nossas formas de vida. As matas, onde podíamos caçar, foram destruídas pelos madeireiros e os tratores dos fazendeiros. Era lá que podíamos coletar alimentos como as frutas, o mel e a matéria prima para fazer nossas casas e utensílios", afirma o texto.

A Comissão avalia também que o assunto não pode ser tratado como se fosse um problema que se resolve ao "dar comida aos índios", nem a cultura indígena pode ser julgada como responsável pelas mortes. Dessa forma, as soluções vão além da distribuição de cestas básicas, sem levar em conta se o tipo de alimentos está adaptado aos seus costumes. "Nós precisamos, especialmente, de terras homologadas e respeitadas, sem invasores. Mas acima de tudo exigimos respeito e justiça. Não queremos ser mais uma vez objeto de caridade ou de projetos paternalistas. Temos o direto de ser diferentes e livres, de exercer nossa autonomia , sendo ouvidos na estruturação de políticas para nossos povos", conclui.

O Estado do Mato Grosso do Sul já registrou neste ano oito mortes de crianças índias por desnutrição. Seis casos ocorreram em Dourados, um em Japorã e outro em Iguatemi. Mais duas crianças morreram no dia 04 de marçono estado, mas a Fundação Nacional de Saúde (Funasa), órgão do Ministério da Saúde responsável pelo atendimento à saúde do índio, não aponta a desnutrição como causa dessas mortes.

Mortes de crianças indígenas exige explicações sobre eficiência de políticas públicas, diz senador

O senador Juvêncio da Fonseca (PDT-MS) disse há pouco que os índices de mortalidade entre as crianças indígenas, cinco vezes maiores do que entre crianças brancas, exigem explicações do governo sobre as políticas públicas para os índios.

O secretário de Segurança Alimentar e Nutricional do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, José Giacomo Baccarin, afirmou que a situação é grave, mas a mortalidade infantil nas aldeias já é bem menor do que em anos anteriores.

A Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado realiza neste momento audiência pública sobre a morte de crianças indígenas em Mato Grosso do Sul, da qual participam representantes de órgãos federais e da Prefeitura de Dourados (MS).

Comissão da Câmara investigará mortes de crianças indígenas

A Câmara dos Deputados aprovou hoje requerimentos para a criação de comissão externa que investigará as mortes de crianças indígenas por desnutrição, ocorridas na região Centro Oeste. A comissão fará levantamentos sobre a morte de 12 crianças, seis em Dourados (MS) e a outras seis em Campinópolis (MT). Ao todo foram aprovados quatro requerimentos de deputados propondo criação da comissões para apurar denúncias sobre a morte de crianças índias por desnutrição.

A comissão externa será formada por sete deputados, um de cada partido, de acordo com a representação na Câmara. Os autores dos quatro requerimentos – deputados Sarney Filho (PV-MA), Geraldo Resende (PPS-MS), Rafael Guerra (PSDB-MG) e Perpétua Almeida (PcdoB-AC) – também deverão integrar a comissão, que deverá ser formada até o inicio da próxima semana.

Mortalidade infantil em aldeias indígenas cai 17% em 2004

A mortalidade infantil entre os povos indígenas caiu 17% desde o começo do ano, segundo dados divulgados em agosto pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa). De acordo com o coordenador do Departamento de Saúde Indígena (Dsai) da Funasa, Alexandre Padilha, o número ultrapassa a meta estabelecida, que era a redução de 15% da mortalidade entre crianças durante todo ano.

Padilha informou também que a Funasa conseguiu ampliar a vacinação, implantar equipes de saúde bucal nos 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (Dseis) existentes no país e reduzir os casos de tuberculose.

Mas o coordenador admite que ainda existem muitos desafios na área de saúde indígena. “São problemas que surgem do fato de serem populações que vivem em locais isolados, de difícil acesso geográfico, da dificuldade de fixação de profissionais de nível superior, como médico e enfermeiros, questões que tem a ver com hábitos culturais, mas existe um esforço do Ministério da Saúde, da Funasa e das lideranças indígenas para enfrentar esses problemas”, diz.

Na tentativa de elaborar soluções conjuntas para esses problemas, foi criado um comitê consultivo da política de atenção à saúde dos povos indígenas, que reuniu nesta quinta-feira representantes de organizações não-governamentais, universidades, prefeituras, representantes indígenas, de instituições acadêmicas, da Fundação Nacional do Índio (Funai) e do Ministério do Meio Ambiente.

“A função do comitê será debater opiniões, definir questões políticas, ser um espaço consultivo para orientar juntamente com a Funasa como deve ser a gestão da saúde indígena”, explica Padilha.

O representante indígena Genival de Oliveira, membro da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), critica a mistura de interesses políticos com as questões de saúde indígena.

“Os representantes das coordenações indígenas regionais têm muitos interesses políticos e a saúde não pode entrar nessa questão de partidarismo nem de politicagem, esse é o maior entrave visto hoje por mim”, afirma. Uma outra preocupação das tribos representadas por Genival diz respeito à formação dos agentes de saúde indígena. Segundo ele, a maioria não sabe ler nem escrever.