ONGs e índios defendem plano de desenvolvimento exclusivo para a Amazônia

Somente por meio de investimentos será possível salvar a Amazônia brasileira. A afirmação foi feita hoje (8) pelo índio Gecinaldo Sateré-Maué, representante da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), na cerimônia de lançamento do Plano Amazônia Sustentável (PAS), no Palácio do Planalto.

Gecinaldo lembrou o que está ocorrendo na Terra Indígena Raposa Serra do Sol e pediu mais consciência do governo federal: “Não somos perigo para a soberania nacional. Queremos construir nossa pátria e proteger nossas fronteiras. Só assim poderemos salvar a Amazônia. Caso contrário, estamos com os dias contados.”

Segundo ele, um programa voltado exclusivamente para a região não deve sustentar-se no “desenvolvimento predatório que impera na Amazônia, mas no desenvolvimento sustentável".

Para Adílson Viera, que representou movimentos sociais e organizações não-governamentais (ONGs) na cerimônia, o governo federal deve preocupar-se não apenas em ter planos, mas em transformá-los “em ações concretas”.

Durante o evento, o governador do Amazonas, Eduardo Braga, que falou em nome dos governadores dos estados  amazônicos, lembrou que a região ainda é comentada por muitos “sob o escudo de interesses legítimos, mas escondendo interesses econômicos”.

“Não basta termos políticas de prevenção e controle, mas alternativas para homens e mulheres da Amazônia se sustentarem”, disse Braga, que classificou o PAS de “inovador”, por prever, para os habitantes da região, mais acesso a políticas públicas.

A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, também reforçou que é tarefa do governo federal criar, "não um plano de desenvolvimento da Amazônia, mas um plano de desenvolvimento para a Amazônia".

"[A Amazônia] não é apenas uma imensa quantidade de árvores. Existem mais de 23 milhões de pessoas [vivendo na região]. A agenda do desenvolvimento sustentável precisa acontecer com maior velocidade. Não tem como governar mais da metade da população brasileira só com a Polícia Federal e o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis)."

Plano para Amazônia terá crédito especial para reflorestamento

O Plano Amazônia Sustentável (PAS), lançado hoje (8) pelo governo federal, além de sistematizar os programas para a região já existentes, vai incluir medidas como a criação de uma linha de crédito especial para o reflorestamento e a recuperação de áreas degradas.

De acordo com a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, apenas para o processo de reflorestamento de áreas degradadas, o crédito deve ultrapassar R$ 1 bilhão. Os recursos, segundo a ministra, virão do orçamento do governo federal e dos fundos constitucionais.

“O PAS é um programa que vem sendo implementado com um conjunto de medidas que já estão em curso e outras que foram apresentadas aqui e que ainda serão aprofundadas”, explicou.

As ações de georeferenciamento, de apoio às práticas produtivas e medidas emergenciais, segundo Marina, também fazem parte do pacote proposto pelo governo federal para o desenvolvimento sustentável da região Amazônica.

O plano também inclui medidas estruturantes, como o crédito, a recuperação de áreas e o uso e manejo dos recursos florestais, além de um programa da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) de expansão de conhecimento e assistência técnica.

Essas medidas, segundo a ministra, se estendem por toda a região Amazônica, enquanto outras medidas emergenciais terão foco em municípios prioritários, onde há problemas de "tensionamentos sociais", como na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima.

Parecer da Funai reafirma que Aracruz ocupou área indígena no Espírito Santo

A disputa por 11 mil hectares de terra no norte capixaba chega hoje (28) a um momento importante. O presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Mércio Pereira Gomes, receberá do procurador-geral da entidade um parecer sobre o caso. A área, no município de Aracruz, é motivo de disputa entre 2 mil indígenas e a maior empresa de celulose de eucalipto, Aracruz, responsável por um terço da produção mundial.

O parecer prévio da Funai reafirma que a área pertence aos povos indígenas Tupiniquim e Guarani. O documento teve de ser elaborado porque a Aracruz Celulose contestou judicialmente a demarcação das terras. Dos 18 mil hectares concedidos originalmente aos índios, a empresa diz ter direito a 11 mil.

Os argumentos da companhia foram considerados “muito frágeis”, segundo o procurador Luiz Fernando Villares declarou à Agência Brasil. “A Aracruz fala que não existe ocupação indígena na área porque quem ocupa é a empresa”, afirma.

Mas a ocupação de fato, segundo Villares, começou com “um vício lá atrás”.  “Foi a expulsão dos índios, o que não justifica e nem legitima a propriedade da Aracruz hoje”, afirma o procurador.

Nas décadas de 50 e 60, o governo do Espírito Santo expropriou as terras, que eram ocupadas tradicionalmente pelos povos indígenas, segundo levantamento da procuradoria da Funai. A área foi repassada à Aracruz, que começou a plantar eucaliptos, e também a outros proprietários particulares, que depois venderam terras à empresa. Dos 18 mil hectares originalmente ocupados pelos indígenas, 11 mil estariam hoje sob domínio da Aracruz.

“Na verdade a Aracruz, como particular, comprou uma terra que era indígena”, afirma. “Hoje os índios não ocupam [as terras], porque quem ocupa é a Aracruz”.

Na petição de 400 páginas que enviou à Funai, a Aracruz argumenta que tem direito às terras, por ocupá-las há cerca de 50 anos. “Mas já é uma jurisprudência do STF [Supremo Tribunal Federal], que a ocupação tradicional não pode ser interrompida por uma expulsão dos índios do lugar”, contesta Villares. “Se lá atrás, eles foram expulsos do seu território, essa ocupação ainda continua, mesmo que não seja verificada fisicamente”.

Além do parecer sobre as questões jurídicas, Villares entregou ao presidente da Funai um documento sobre os aspectos antropológicos referentes à contestação da Aracruz, feito pela Diretoria de Assuntos Fundiários (DAF) da Funai.

Dos 18 mil hectares reivindicados pelos indígenas, Villares afirma que 7 mil hectares já foram contemplados em decretos de homologação assinados pelo então ministro da Justiça Íris Rezende. Essa área é de propriedade da União e os índios têm a posse e o usufruto da terra.

Se aprovar o parecer, Mércio Gomes tem de enviá-los ao ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos. Cabe ao ministro publicar a portaria reconhecendo a terra como indígena e determinando que a Funai demarque a área.

Villares disse que o prazo legal para o envio terminou na segunda-feira passada (21). De acordo com ele, houve atraso por causa do tamanho da contestação enviada pela Aracruz, há cerca de dois meses. Só a petição tinha 400 páginas, além de 18 volumes de documentos anexos.