Pela sustentabilidade da BR-163

ISA – Cerca de 230 convidados, entre os quais representantes do poder público e de organizações não-governamentais, lideranças indígenas e pesquisadores, estarão reunidos entre 18 e 20/11, em Sinop (MT). Eles participarão do Encontro BR-163 Sustentável – Desafios e Sustentabilidade ao longo da Cuiabá-Santarém, que tem como objetivo elaborar um conjunto de propostas socioambientais para o eixo matogrossense da BR-163, também conhecida como Rodovia Cuiabá-Santarém, cujo término da pavimentação integra o Plano Plurianual (PPA) 2004-2007, encaminhado ao Congresso pelo presidente Lula em agosto.

Cerca de 230 convidados, entre os quais, representantes do poder público federal, regional e local e de organizações não-governamentais, produtores rurais, lideranças indígenas e pesquisadores, estarão reunidos entre 18 e 20/11, no campus da Universidade Estadual do Mato Grosso (Unemat), em Sinop (MT), para elaborar um conjunto de propostas socioambientais para o eixo mato-grossense da BR-163, também conhecida como Rodovia Cuiabá-Santarém.

O Encontro BR-163 Sustentável é uma iniciativa do Instituto Socioambiental (ISA), desenvolvida em parceria com o Fórum Matogrossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento (Formad), Instituto Centro de Vida (ICV), UNEMAT, Instituto de Pesquisas Ambiental da Amazônia (IPAM), WWF-Brasil, The Nature Conservancy (TNC) e Conservation International (CI), e com o apoio do Grupo Agroflorestal de Proteção Ambiental (GAPA), do Greenpeace, da Fundação Viver, Produzir e Preservar (FVPP), do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Água Boa, da ONG Roncador-Araguaia, da Associação Terra Indígena Xingu (ATIX), do Grupo de Trabalho Amazônico (GTA), da Rainforest Foundation US, da Norwegian Rainforest Foundation, da Rainforest Action Network, da ICCO, da União Européia, da Moore Foundation e da Environmental Defense (EDF).

A BR-163, construída no início da década de 70 para fomentar a colonização e a produção agrícola na Amazônia, estende-se por 1.764 quilômetros, dos quais apenas 801 quilômetros estão pavimentados – trecho de Cuiabá a Nova Santa Helena (MT), próximo à divisa com o Pará. A conclusão de seu asfaltamento, que estava prevista no Programa Avança Brasil, de Fernando Henrique Cardoso, mas não saiu do papel, permanece em destaque no Plano Plurianual (PPA) 2004-2007, encaminhado ao Congresso em agosto, como um dos principais projetos do Ministério dos Transportes.

O governo Lula pretende realizar a obra, estimada em R$ 760 milhões, em parceria com a iniciativa privada e com recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Empresas interessadas no empreendimento – as trades agrícolas AMaggi, Bunge, Cargill, Dreyfus, ADM e Coabra; companhias da Zona Franca de Manaus; a Petrobrás; e as construturas Andrade & Gutierrrez, Estcaon, Norberto Odebrecht e Queiroz Galvão – formalizaram, há três meses, um convênio para participar de sua licitação, que ainda não foi aberta pela União.

Considerada fundamental para reduzir o custo do escoamento desoja para mercados externos, a conclusão da Rodovia Cuiabá-Santarém é definida como um marco pelo governador do Mato Grosso, Blairo Maggi, que estima uma economia anual de US$ 40 milhões sobre estoques e capital de giro. O Mato Grosso é principal produtor do grão do país – a safra 2001/2002 totalizou 12,6 milhões de toneladas, mais de 10% da safra nacional (52,2 milhões de toneladas), dos quais 59% foi destinado à exportação -, e as principais trades agrícolas possuem unidades de recebimento, secagem e armazenagem de grãos em diversas cidades do Estado.

A produção da soja vem ocupando áreas de pastagem degradadas, assim como avança sobre novas locais, entre os quais o entorno do Parque Indígena do Xingu (PIX), onde cerca de 100 projetos agropecuários foram instalados nos últimos 30 anos com incentivos fiscais da Sudam, o que vem provocando vários efeitos, como a contaminação das nascentes do Bacia do Xingu – leia mais sobre o tema no Especial o Xingu na Mira da Soja.

Para evitar que a conclusão da Rodovia Cuiabá-Santarém tenha como desdobramento no Mato Grosso, que já detém um dos índices mais elevados de desmatamento da Amazônia Legal – até 2001, correspondente a 21,6% da área total do Estado -, novos desmatamentos, migração desordenada, grilagem e ocupação irregular de terras públicas, concentração fundiária, aumento da criminalidade, entre outros, os participantes do Encontro BR-163 Sustentável pretendem definir uma série de propostas relacionadas ao ordenamento territorial, à sustentabilidade, à conservação dos recursos hídricos da região e à melhoria da qualidade da população local.

As reivindicações deverão ser encaminhadas ao governo federal no início do próximo ano, após a sistematização do conjunto de propostas, incluindo as que serão levantadas em relação ao eixo paraense durante um novo encontro, que será realizado em meados de dezembro, em Santarém (PA).


A construção da BR-163 e os Panará

O trajeto da Rodovia Cuiabá-Santarém cortou as terras tradicionais do Povo Paraná, que vivia originalmente s cabeceiras do Rio Peixoto de Azevedo, na divisa do Mato Grosso e Pará. Contatados pelos irmãos Villas-Boas pela primeira vez no dia 4 de fevereiro de 1973, os Panará ocupavam dez aldeias e tinham uma população estimada entre 300 e 600 pessoas. “Apesar de arredios antes do primeiro contato, os Panará aos poucos foram sendo atraídos pelo trabalho de construção da Cuiabá-Santarém e pelos veículos que chegavam com a abertura da BR-163 ao trafégo, em dezembro de 1973. Incapazes de associar o surgimento das novas doenças à presença dos brancos, passaram a frequentar a estrada e instalaram uma pequena aldeia a apenas quatro quilômetros dela. As doenças foram se espalhando para outras aldeias, provocando conflitos entre os próprios índios”, cita o livro Panará – A Saga dos Índios Gigantes, publicado pelo ISA em 1998.

Além de abordar a quase dizimação dos Panará, reduzidos a 79 indívidos em 1975, quando foram forçadamente transferidos para o Parque Indígena do Xingu (PIX), a publicação tem como foco descrever a reconquista de parte do território tradicional pelos índios em 1995. Outra vitória da saga dos Paraná foi a obtenção, em julho deste ano, de uma indenização de R$ 1,2 milhão da União pelos danos morais e materiais causados pelo contato.

ISA, Cristiane Fontes, 14/11/2003.

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