Falta de reconhecimento e de livros é falha no acordo sobre educação indígena, diz educador

Manaus – A falta de reconhecimento formal da categoria escolar indígena e a carência de livros didáticos específicos são as principais lacunas no Termo de Compromisso celebrado entre o Ministério Público Federal (MPF), o Ministério da Educação (MEC), a Fundação Nacional do Índio (Funai) e a Secretaria Estadual de Educação (Seduc), em março de 2003.

A opinião é de José Mario Mura, presidente do Conselho Estadual de Educação Escolar Indígena do Amazonas. "A construção de escolas avançou lentamente, assim como a formação de professores indígenas. Nossas grandes vitórias foram a merenda escolar e a estruturação do conselho, que hoje tem local e material para funcionar", afirmou.

Pelo acordo, a Seduc se comprometeu a regularizar as escolas indígenas, estabelecer mecanismos que obrigasse os municípios a ofertar educação escolar indígena, realizar seminários para capacitar prefeitos e secretários municipais de educação sobre o tema, dar condições de funcionamento ao Conselho Escolar Indígena e responsabilizar-se pela formação de professores indígenas.

O MEC ficou responsável por apoiar técnica e financeiramente a formação dos professores indígenas, capacitar técnicos das secretarias estaduais e municipais em gestão e financiamento e dar apoio à produção de material didático. A Funai deveria auxiliar na implementação de controle social e gestão das escolas indígenas, fiscalizar a efetividade da prestação da educação escolar indígena e apoiar técnica e financeiramente a formação de professores indígenas.

O Termo de Acordo não cumprido deu origem a uma decisão da 5ª Vara de Justiça Federal do Amazonas, em 10 de março deste ano, determinando que o MEC, a Seduc e a Funai apresentassem um diagnóstico, elaborado em conjunto, do quadro atual da educação escolar indígena no estado, indicando medidas a serem tomadas por cada um deles. Se o diagnóstico não fosse apresentado em 30 dias, os três órgãos estariam sujeitos a uma multa diária de R$ 5 mil.

A decisão deu origem a uma Ação de Execução Diversa por Título Extrajudicial. A União, o governo estadual e a Funai já se manifestaram. A Procuradoria Geral do Estado do Amazonas, inclusive, impetrou um embargo de execução e um agravo de instrumento, para suspender a necessidade de apresentar o diagnóstico – e, conseqüentemente, a possibilidade de cobrança da multa. O processo está concluso e aguarda despacho de Brunno Christiano Cardoso, juiz-substituto da 5ª Vara Federal, responsável pelas execuções fiscais – o que deve acontecer amanhã, segundo a assessoria de comunicação da Justiça Federal do Amazonas.

CPI da Biopirataria chama Blairo Maggi e presidente do Ibama para depor sobre tráfico de madeira

Brasília – O governador do Mato Grosso, Blairo Maggi, e o presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Marcus Luiz Barroso Barros, serão convidados a debater o tráfico ilegal de madeira na Amazônia. A decisão foi tomada durante reunião extraordinária da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Biopirataria, nesta terça-feira (7). Outros 11 funcionários do instituto e do governo estadual também serão convocados.

A audiência, solicitada pelo relator da CPI, deputado Sarney Filho (PV-MA), ainda não tem data marcada. Sarney Filho afirma que neste debate serão discutidas questões como a substituição das Autorizações para Transporte de Produtos Florestais (ATPFs) por um sistema digital que dificultaria as fraudes, além do monitoramento da floresta no estado feito por satélite e que foi desativado. "O problema do desmatamento na Amazônia é antigo, mas as rédeas estão soltas", diz o deputado.

De acordo com o presidente da CPI, deputado Antônio Carlos Mendes Thame (PSDB-SP), há um outro aspecto que deveria ser investigado, e que não foi divulgado pela imprensa. "A madeira apreendida, que está nos depósitos do Ibama, muitas vezes é doada para uma organização não-governamental (ong). Como a ong não tem como tratar da madeira, contrata uma madeireira, e esta, de posse do contrato, vai até o Ibama e requisita um pacote de ATPFs, para pegar a quantidade de madeira que quiser", afirmou o presidente da comissão.

Mendes Thame destacou ainda que o principal objetivo da CPI é elaborar uma nova legislação sobre preservação ambiental e combate à biopirataria. "Além de apurar as denúncias e encaminhar todo o material de que dispomos para o Ministério Público e Polícia Federal, pretendemos reunir subsídios para atualizar a legislação no combate a esses atos ilícitos".

Funai em Manaus terá chefe indígena

Os protestos surtiram efeito. A ocupação do escritório da Fundação Nacional do Índio (Funai) de Manaus (AM) por mais de 300 índios, durante todo o mês de janeiro passado, tinha como principal reivindicação o afastamento do então administrador regional e uma maior participação dos povos indígenas na gestão do órgão.

Na sexta-feira passada, 03 de junho, a Funai anunciou Pedro Garcia, da etnia tariano e uma das principais lideranças indígenas do estado, como novo chefe do órgão na capital amazonense. A nomeação de um líder indígena é inédita no Amazonas, estado com 4,26% de sua população de origem indígena (censo IBGE 2000). Técnico em agro-pecuária, ex-presidente da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn) e candidato derrotado à prefeitura de São Gabriel da Cachoeira pelo Partido dos Trabalhadores, Pedro Garcia falou com o ISA sobre sua missão à frente da Funai em Manaus, os principais problemas a serem enfrentados, o preconceito inclusive.

Como você recebeu a notícia da nomeação?

Soube pelo jornal, mas ainda não fui comunicado oficialmente. Apesar do meu nome estar na lista, não imaginava que seria nomeado. Agora tenho muito que conversar com o pessoal pois a Funai é um órgão muito problemático.

Qual o principal problema a ser enfrentado?

A política indigenista do governo federal não é clara, e uma boa administração em Manaus vai depender de uma definição desta política. Nossa idéia é termos uma ponte com o governo federal e discutir uma política realmente voltada para os povos indígenas.

Quais são as questões regionais mais urgentes?

Temos que criar programas de trabalho para melhorar as condições de vida das comunidades. Em primeiro lugar vem a segurança alimentar, que é o principal problema em muitos lugares. O investimento em educação indígena também deve ser priorizado, assim como o trabalho pela legalização das terras indígenas que hoje estão sem proteção. Temos que acabar com a visão de que a demarcação de terras indígenas atrapalha o desenvolvimento regional. Ela só atrapalha os interesses de quem disputa terra com os índios.

Quais mudanças você pretende realizar na gestão da Funai em Manaus?

Minha primeira idéia é democratizar a administração, deixá-la menos verticalizada. Temos que ouvir mais as lideranças de cada povo, de cada comunidade, incentivar a participação de todos nas decisões e na busca de consensos que possam redirecionar a política indigenista no estado. O modelo atual, muito vertical, não atende as necessidades da maioria.

Como você vê sua relação com outras etnias da região de Manaus?

Temos onze municípios sob a administração da Funai de Manaus, muitos deles habitados pelos povos Murá e Munduruku. Eu nunca tive problemas com nenhum deles nem com liderança de povo algum. Como participo do PPTAL – Projeto Integrado de Proteção às Terras e Populações Indígenas da Amazônia Legal Brasileira – , acompanho os processos de demarcação de terras e isso me deixa próximo aos outros povos. Como as experiências nos últimos anos foram muito ruins, acho que todos vão estar dispostos a melhorar.

Como você vai lidar com os funcionários não-indígenas da Funai?

Tenho que ter muita tranqüilidade para assumir o cargo, pois quero estabelecer boas relações como todos. Uma das primeiras coisas a fazer é visitar os 11 postos da Funai na região e ouvir as necessidades dos funcionários. Tenho também que analisar as questões internas do órgão, como a falta de recursos, que, sem dúvida, é um outro grande problema. A ocupação em janeiro evidenciou isso. Acredito que só com um bom planejamento poderemos aproveitar o que temos da melhor maneira, visitando as comunidades com mais freqüência e, assim, evitar o isolamento da Funai, tão criticado.

Teme sofrer algum tipo de preconceito?

A resistência dos não-indígenas sempre existiu, ainda que muitas vezes de forma velada. Vamos superar estas dificuldades. Tem muita gente que faz provocações para gerar alguma crise, mas vou colocar a cabeça para a funcionar. Quem reclamar que “está sendo mandado por um índio” precisa entender que as coisas mudaram muito e todos têm que perceber isso. Faz parte da atualização da questão indígena.

Você pretende conversar com o presidente da Funai sobre a falta de recursos?

Tenho que ir à Brasília para um treinamento em gerência, que vai ser muito importante, e quero aproveitar para manter contato com o presidente da Funai no sentido de ampliar o orçamento para 2006.

Governo desmantela quadrilha que atuava há 14 anos no Mato Grosso

As ações de combate ao desmatamento na Amazônia desmontaram uma quadrilha que atuava há 14 anos no Mato Grosso fraudando autorizações para exploração de madeira. Desenvolvidas desde setembro de 2004 pelo Ibama, Polícia Federal e Ministério Público Federal, as investigações levaram a Justiça a decretar a prisão de 89 envolvidos, responsáveis pela exploração ilegal de 1,9 milhão de metros cúbicos de madeira, suficientes para carregar 76 mil caminhões. Se enfileirados, cobririam a distância entre o Rio de Janeiro e Brasília. O início do desmantelamento da quadrilha foi anunciado hoje pelos ministros do Meio Ambiente, Marina Silva, e da Justiça, Márcio Thomaz Bastos.

Do total de envolvidos na investigação policial, 42 são empresários e 47 são servidores do Ibama – 39 de carreira e oito de cargos comissionados. Desses 39 servidores, 21 já haviam ocupado cargos de confiança na instituição antes de janeiro de 2003. Todos já respondem a processo administrativo disciplinar, e o Diário Oficial da União de hoje publica a exoneração dos oito que ocupavam cargos em comissão, dentre eles o gerente-executivo do Ibama no Mato Grosso. Os servidores de carreira só poderão ser demitidos após a conclusão do processo.

Além da decretação da prisão dos envolvidos e dos processos administrativos, novas medidas estão sendo tomadas imediatamente, começando pela chamada Operação Arribação. Com isso, fica firmado um convênio permanente do Ibama com a Polícia Federal para apuração de denúncias na Amazônia.

O Ibama do Mato Grosso estará sob intervenção por 60 dias, e já conta com uma equipe substituta. O interventor é o procurador que liderou as investigações, Elielson Ayres de Souza. O fornecimento de novas Autorizações de Transporte de Produtos Florestais (ATPFs) está suspenso por 30 dias, e todos os servidores que operavam sistemas de controle  estão descredenciados. A partir desta data, nenhum dos servidores que atuavam no setor terão acesso aos sistemas de Fluxo de Produtos e Subprodutos da Floresta (Sismad), Integrado de Controle e Monitoramento dos Recursos Florestais (Sisprof) e Integrado de Cadastro e Fiscalização (Sicaf).

Ao mesmo tempo, foi ajuizada uma ação civil pública contra a Fundação Estadual do Meio Ambiente do Mato Grosso (Fema/MT), para que deixe de autorizar desmatamentos considerando uma reserva legal de apenas 50% em propriedades rurais situadas em áreas de transição entre Cerrado e Amazônia ou de florestas. Além disso, a Justiça Federal no Estado entendeu como necessária a busca e apreensão de processos de autorização de desmatamento expedidos pela Fundação.

Governo recebe críticas em sessão solene do meio ambiente

“Estamos perdendo a guerra do meio ambiente, como vimos pelos últimos dados do desmatamento da Amazônia.” Essa foi a denúncia feita pelo deputado Sarney Filho (PV-MA) na sessão solene em homenagem à semana do meio ambiente. Entre 2003 e 2004, 26 mil km2 da Amazônia foram desmatados, o equivalente ao estado do Alagoas, o que representa um crescimento de 6% em relação ao período anterior. O deputado criticou fortemente a política ambiental do governo, na presença da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. Para ele, os esforços de "pessoas tenazes" como Marina não vêm encontrando respaldo suficiente no Governo para a concretização do princípio de transversalização da questão ambiental.

Sarney Filho assinalou que a Amazônia é apenas a face mais visível de uma série de sinais de que já passa da hora de mudar de atitude perante o meio ambiente. O deputado criticou medidas como a Lei de Biossegurança, a importação de pneus usados, o projeto de construção de mais uma usina atômica e a transposição do rio São Francisco "sem uma discussão adequada" e sem a prévia revitalização da Bacia. "No âmbito do Poder Legislativo, nossa parcela de culpa é grande", acrescentou. Ele citou, por exemplo, o projeto da Mata Atlântica, com o objetivo de proteger os 7% de vegetação remanescente, que, após anos de tramitação na Câmara, ainda se encontra no Senado.

A ministra deixou ao PT o encargo de responder e só rebateu ao sair da sessão, ao ser abordada pela imprensa. "Esperamos poder executar pela primeira vez, neste ano, o plano integrado contra o desmatamento", disse, explicando que há R$ 400 milhões previstos para ações integradas entre Ibama, Polícia Federal e outros ministérios. "Recebemos o governo em 2003 com taxa de crescimento do desmatamento de 27% e baixamos para 6% no ano passado, mas ainda assim ficou muito acima do que esperávamos", reconheceu a ministra à imprensa, após deixar a sessão solene.

Recursos ao Ministério

O deputado Jorge Pinheiro fez um apelo à Câmara para que sejam destinados mais recursos ao Ministério do Meio Ambiente no Orçamento de 2006, que será discutido na Casa daqui a alguns meses. Ele defendeu a necessidade de se aparelhar melhor o Ibama para fiscalizar e cuidar das unidades de conservação e dos parques que estão sendo criados.

Pinheiro defendeu que, embora existam situações irreversíveis geradas pela agressão ao meio ambiente, como a devastação da Mata Atlântica, há outras que podem ser mudadas. "Podemos salvar a Amazônia e outras matas importantes, podemos minimizar o impacto das agressões ao cerrado, mas para isso é preciso recursos", afirmou.

Especialistas culpam desmatamento por emissão de gases

O desmatamento da Amazônia é o principal responsável pela emissão de gases poluentes no Brasil. Assim, evitar a destruição da floresta é o grande desafio que o País terá para reduzir as emissões, que causam o efeito estufa. A conclusão foi unânime durante audiência pública promovida pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, que reuniu a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e diversos especialistas para discutir a Política Nacional sobre Mudanças Climáticas. As ações inseridas nessa política seguem determinações previstas pelo Protocolo de Quioto, em vigor desde fevereiro deste ano.

De acordo com o pesquisador Délcio Rodrigues, do Instituto Vitae Civilis, o Brasil é o sexto maior emissor mundial de gases que causam o efeito estufa, "mas a maior parte dessa poluição não é causada pelas indústrias e sim pelas queimadas". Rodrigues fez uma análise das mudanças climáticas no País para afirmar aos deputados que os efeitos da poluição já se fazem sentir. Como exemplo, ele citou o violento ciclone que atingiu Santa Catarina no ano passado.

Para o coordenador de pesquisas do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, Paulo Moutinho, o Brasil precisa de ações efetivas para combater o problema. "70% das emissões de gases vêm do desmatamento”, informou.

Marina Silva assinalou que 13 ministérios estão envolvidos no plano de combate ao desmatamento, que cresceu 6% no último ano e, entre os anos de 2003 e 2004, atingiu 26 mil quilômetros quadrados de floresta.

Créditos de carbono

Também foi debatida a regulamentação do mercado de créditos de carbono, que funciona com a compra, por parte de países e empresas poluidoras, de cotas de gases que deixam de ser emitidos por projetos considerados limpos em países em desenvolvimento.

Atualmente, o País conta com dois projetos certificados, que recebem entre 4 e 6 dólares (entre R$ 10 e R$ 15) por tonelada de carbono que deixa de ser liberado na atmosfera.

O debate foi solicitado pelo deputado Paulo Marinho (PL-MA), que cobrou ontem no plenário da Câmara a adesão dos Estados Unidos ao Protocolo de Quioto. "Eles (EUA) são os maiores poluidores do planeta", reclamou. O parlamentar também cobrou medidas concretas para regulamentar o mercado do seqüestro de carbono. "Li na revista Exame artigo que trata de compra de crédito de carbono, por um organismo alemão, de uma entidade ambiental brasileira. Mas, nesta Casa, até o momento, nada há de concreto que regulamente essa atividade."

Reforço do protocolo

O diretor do Programa de Proteção Ambiental do Ministério do Meio Ambiente, Rui de Góes Leite Barros, informou que o Brasil deve entrar imediatamente nas negociações para a segunda fase do Protocolo de Quioto, que vai estabelecer as normas de redução da poluição mundial a partir de 2012. "O Brasil tem interesse no reforço do protocolo e no estabelecimento de uma cobrança mais efetiva aos países desenvolvidos para que reduzam a sua poluição", afirmou Barros. "Mas isso só pode ser conquistado na discussão internacional".

O diretor afirmou ainda que o País não deve considerar o mercado de carbono, previsto no protocolo, como a única forma de reduzir a poluição. Segundo ele, é preciso adotar outras iniciativas ambientais, como medidas concretas contra o desmatamento.

MP que “interditou” 8,2 milhões de hectares no Pará para criação de UCs pode ser derrubada na Câmara

O Ministério do Meio Ambiente (MMA) está trabalhando contra o tempo para impedir a derrubada na Câmara dos Deputados de um dos pilares do “Pacote Verde”, lançado em fevereiro pelo governo. Corre risco de ser rejeitada a Medida Provisória 239/05, que possibilitou a “interdição administrativa provisória” de 8,2 milhões de hectares ao longo da rodovia BR-163, no Pará, para permitir a realização de estudos visando a criação de Unidades de Conservação (UCs) na região. A iniciativa é considerada fundamental para conter o corte indiscriminado das árvores e a grilagem de terras em uma das áreas de maior conflito fundiário e desmatamento da Amazônia e é extensiva a todo o País. O relator da matéria, deputado Nicias Ribeiro (PSDB-PA), fez um parecer contrário à MP, que deverá ser votado em plenário na próxima terça ou quarta feira.

A ameaça de desaprovação do texto proposto pelo governo paira sobre o Palácio do Planalto pouco depois de ser anunciado, no último dia 18 de maio, o número alarmante de 26 mil quilômetros quadrados de florestas desmatadas na Amazônia, de agosto de 2003 a agosto de 2004. Trata-se do segundo maior índice da história, que só perde para os 29 mil quilômetros quadrados desmatados no período entre 1994 e 1995. O anúncio repercutiu negativamente na imprensa nacional e internacional e a taxa apresentada foi interpretada como uma séria derrota para a administração Lula.

Na última quarta-feira, dia 25 de maio, no MMA, a ministra Marina Silva esteve com Ribeiro e tentou convencê-lo a mudar o teor de seu relatório. Não chegaram a um acordo, mas as negociações prosseguirão até a véspera da votação. A assessoria do deputado deverá apresentar uma nova proposta ao ministério na segunda-feira, dia 30 de maio. O encontro com Marina aconteceu por exigência do parlamentar paraense, que se recusou a discutir o problema com representantes de escalão inferior. Também estavam presentes o secretário de Biodiversidade e Florestas do MMA, João Paulo Capobianco, e o deputado Luciano Zica (PT-SP), um dos principais negociadores do governo para o tema.

Na noite da terça-feira, dia 24, o governo havia fechado um acordo com Ribeiro ao aceitar modificar o texto da MP para deixar claro que, nos empreendimentos legalizados em áreas já alteradas (para agricultura, pecuária e garimpos), poderia ser feito o corte de vegetação em processo de regeneração, arbustos nativos daninhos ao pasto, por exemplo. No dia seguinte, o deputado voltou atrás e atacou de forma contundente a medida e o governo. “A MP dá ao presidente da República um poder discricionário, autoritário, ditatorial e imperial. Ela paralisa uma série de empresas e atividades econômicas como fazendas, garimpos e madeireiras, mesmo que elas estejam legalizadas”, afirmou Ribeiro à TV Câmara. Pouco depois, ele reuniu-se com a ministra Marina Silva.

Existe a suspeita de que o deputado Nicias voltou a endurecer o discurso por pressão de seu partido, o PSDB, e da bancada ruralista na Câmara, que estaria interessada em derrubar ou pelo menos flexibilizar ao máximo a MP. Cogitou-se, por exemplo, limitar o alcance da medida à Amazônia e a um período de tempo menor – o texto atual estipula um prazo de seis meses, que pode ser renovado por mais seis meses, para a realização dos estudos que poderão legitimar a criação das UCs. A oposição também propôs a retirada do regime de urgência constitucional do Projeto de Lei (PL) nº 4.776/05, que pretende regulamentar a gestão de florestas públicas e também poderá ser votado durante a semana.

Por outro lado, o PSDB estaria tentando desgastar o governo no maior número possível de frentes. O motivo seria a “guerra” que envolve a chamada CPI dos Correios, aprovada na quarta-feira, dia 25, e que poderá investigar denúncias de corrupção que pesam sobre o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), presidente de seu partido e um dos principais aliados do Palácio do Planalto.

“O ex-presidente FHC, do PSDB, editou medida muito mais drástica e impopular para os ruralistas, quando do lançamento dos dados recordes de desmatamento, entre 1994 e 1995, com o aumento da reserva legal de 50% para 80% na Amazônia”, lembra o advogado André Lima, do ISA. Ele conta que, depois disso, o governo tucano também conteve energicamente, em 2001, a pressão ruralista que tentou a rejeitar Medida Provisória que previa a alteração (MP nº 2166/01).

“Não há acordo em relação a tentar limitar o alcance da medida apenas à Amazônia ou retirar o pedido de urgência do PL nº 4.776 (da gestão de florestas públicas). Isso nós não vamos aceitar. Também não está em discussão a tentativa de diminuir os prazos”, garantiu João Paulo Capobianco, ao término da reunião. Ele confirma que a MP corre riscos, mas considera que é possível chegar a um consenso antes da votação. “O deputado Nicias concorda que é necessário manter a essência do texto, ou seja, nas áreas de floresta primária, a vegetação deve continuar intocada.”

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A MP e o Pacote Verde

Publicada em 18 de fevereiro deste ano, a MP 239 prevê o instrumento legal da “limitação administrativa provisória” que autorizou o governo a paralisar todas as atividades econômicas efetiva ou potencialmente causadoras de degradação ambiental em uma área de florestas primárias (ainda intocadas) de 8,2 milhões de hectares, no Pará, ao longo da BR-163. Em outras palavras, ficou proibido o corte raso de floresta no local. A intenção é de realizar estudos com vistas à criação de Unidades de Conservação na região. O território abrangido pela medida inclui terras nos municípios de Altamira, Itaituba, Jacareacanga, Novo Progresso e Trairão, todos localizados no sudoeste do Pará.

A publicação da MP faz parte do chamado “Pacote Verde” apresentado pelo governo federal para tentar conter a violência, a grilagem de terras e o desmatamento em toda a Amazônia, sobretudo no Pará. O conjunto de medidas foi tomado em resposta ao assassinato da missionária Doroty Stang, no dia 12 de fevereiro, em Anapu (PA). A freira estadunidense foi morta a mando de fazendeiros por defender trabalhadores rurais e pequenos agricultores que disputam terras com latifundiários da região. Além da MP 239, o governo também criou 5,2 milhões de hectares de áreas protegidas, localizadas em vários estados da Amazônia e enviou ao Congresso o PL nº 4.776. (Para saber mais clique aqui).

Organizações da sociedade civil se mobilizam

Uma carta assinada por mais de 27 instituições, entre elas o ISA, já está circulando em Brasília e pela Internet pedindo a aprovação da MP nº 239 (confira a íntegra abaixo). Contando as organizações filiadas à Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA), mais de 300 entidades estão apoiando a mobilização. A idéia é pressionar os parlamentares pela aprovação da medida. Os responsáveis pelo documento estão recomendando que todos aqueles interessados na questão enviem-no aos deputados por e-mail (veja lista abaixo).

“A eventual rejeição da MP nº 239 representará uma vergonha sem precedentes para a sociedade brasileira às vésperas da Conferência das Partes (COP) da Convenção da Diversidade Biológica (CDB), que será sediada aqui no Brasil, no ano que vem”, constata André Lima. O advogado do ISA também avalia que o Congresso Nacional não aprovou nada de relevância estratégica e de dimensão nacional para a proteção da biodiversidade durante o mandato atual. “Esta legislatura poderá entrar para a história como uma das piores dos últimos 20 anos em matéria socioambiental, infelizmente”.

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Secretário nega falta de diálogo e diz que floresta só se conserva se for rentável "de pé"

Brasília – O secretário de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente, João Paulo Capobianco, afirma que o governo vem adotando as medidas necessárias para combater o desmatamento na Amazônia e escuta os especialistas nas discussões ambientais, ao contrário do que o geógrafo Aziz Ab’Saber declarou. Em entrevista, à Agência Brasil, Capobianco reiterou a ênfase no Projeto de Lei de Gestão de Florestas Públicas para conter a devastação no norte do país. "Só conseguiremos preservar a floresta se, em termos de emprego e geração de renda, ela for mais interessante de pé do que derrubada".

Agência Brasil: Com relação aos novos dados de desmatamento na região amazônica, o professor Aziz Ab’Saber afirma que o Ministério do Meio Ambiente "está totalmente enfraquecido" e não consegue efetuar as medidas necessárias. O senhor concorda?

João Paulo Capobianco: Os dados se referem a um período em que o novo sistema de monitoramento (o Deter) ainda não estava operacional. Esse sistema, construído graças a um esforço muito grande do governo – não só do MMA –, acompanha em tempo real o desmatamento e começou a funcionar no início deste ano. Até então, você verificava um ano depois. Com base nesse sistema já realizamos, em 2005, um conjunto de operações de inteligência que resultou na apreensão de 75 mil metros cúbicos de madeira. Isso em quatro meses, sendo que em 2002 (último ano do governo Fernando Henrique Cardoso) inteiro haviam sido apreendidos 40 mil metros cúbicos. Nunca se fiscalizou tanto como agora.

ABr: Vocês já têm os dados referentes a desmatamento nos quatro primeiros meses de 2005? É possível fazer uma previsão de desmatamento para o ano?

Capobianco:Ainda estamos sistematizando esses dados. O que podemos dizer é que a capacidade de desmatar foi intensificada. Mato Grosso (estado que respondeu por 48,1% do desmatamento total na Amazônia de agosto de 2003 a agosto de 2004), por exemplo, iniciou o desmatamento em janeiro, época da chuva. Normalmente, isso acontecia a partir de abril.

ABr: O professor Aziz Ab’Saber também criticou o projeto de Lei de Gestão de Florestas Públicas, uma das principais apostas do ministério contra o desmatamento. Segundo ele, o projeto resultou de pressão de ONGs interessadas e deixa de promover um redirecionamento do uso dessas áreas – que, na opinião dele, deveriam priorizar a proteção da biodiversidade. Além disso, ele disse, poderia se complicar a retomada dessas áreas no futuro, pela presença de entidades e empresas estrangeiras.

Capobianco: É preciso dizer que o governo atual possui o recorde histórico de criação de reservas na Amazônia. Foram 8,3 milhões de quilômetros quadrados, dos quais 60 % são áreas de proteção integral. E o uso sustentável, previsto nos outros 40 % das áreas, também promove a proteção à biodiversidade. É uma visão estreita essa (de que as duas coisas não são compatíveis). A iniciativa do projeto não tem nada a ver com pressão de ONGs. Elas não fazem manejo e não terão, portanto, nenhum benefício nesse sentido. Nosso entendimento é o de que o desmatamento não será combatido com controle. A Amazônia não será preservada só com polícia, mas também com medidas de macroeconomia. Nosso objetivo para as florestas públicas é mantê-las públicas e como florestas. Com relação a qualquer vínculo internacional, o que cabe esclarecer é que o manejo só será permitido a cooperativas nacionais e empresas regularmente constituídas no Brasil.

ABr: O professor também se queixa de que os especialistas não estariam sendo ouvidos nesse e em outros projetos.

Capobianco Foram ouvidos vários especialistas, em dezenas de ocasiões. A proposta passou por reuniões, seminários. Foi aprovada pela Comissão Nacional de Florestas – na qual governo, academia, empresários, estados, municípios, ONGs e a própria Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC, da qual Ab’Saber é presidente de honra) estão representados. Depois de encaminhada ao Congresso como projeto de lei, passou por audiências públicas. A ministra Marina Silva e sua equipe técnica receberam o professor Aziz em longa audiência.O que há é divergência de visão, de encaminhamento. Não falta de diálogo.

Ministério do Meio Ambiente está "enfraquecido" na defesa da Amazônia, diz geógrafo

Brasília – O geógrafo Aziz Ab’Saber contribuiu para o conhecimento da história geoecológica do país ao buscar a relação do homem com o meio ambiente. Foi pioneiro também ao propor a empresários que colaborassem para reflorestar áreas de acordo com suas características. Hoje, suas idéias inovadoras, que antes causavam resistência quando Ab’Saber era jovem, são modelo para a geografia brasileira.

Em entrevista à Agência Brasil, o professor Aziz, presidente de honra da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e professor emérito do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP), diz que "existe no sul do Pará um estado paralelo em que fazendeiros e madeireiros ditam as próprias regras", desmatando sem qualquer medo de serem repreendidos.

Ab’Saber avalia que o Ministério do Meio Ambiente está "enfraquecido" na defesa da Amazônia, ainda que tenha o poderoso instrumento tecnológico de observar a Terra a partir de satélites. "O mais importante é a capacidade de desenvolver ações em relação ao que está sendo observado", comenta ao analisar os índices de desmatamento da Amazônia.

Segundo levantamentos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), divulgados na semana passada, a Amazônia perdeu uma área de mais de 26 mil quilômetros quadrados de agosto de 2003 a agosto de 2004: um território quase do tamanho do estado de Alagoas.

Agência Brasil: Além de ser o segundo maior desmatamento já verificado na Amazônia, como o senhor avalia esse problema?

Aziz Ab’Saber: Não é só o problema do desmatamento da Amazônia que me preocupa. Uma série de fatos recentes demonstra uma espécie de estado paralelo formado por fazendeiros e madeireiros. Os fazendeiros fazem o que querem, desafiando o poder público. Dão um atestado de que eles estão tentando se isolar de qualquer presença do Estado. Além deles, tem também os madeireiros, que confabulam com os fazendeiros e compram as árvores que sobram à medida que as atividades dos primeiros avançam. Então, a situação é muito mais grave do que se pensa.

ABr: Tem ainda a questão das populações tradicionais, como os povos indígenas…

Ab’Saber: Quanto às populações tradicionais, o problema é muito sério. Enquanto os fazendeiros dominam tudo e causam medo nas populações tradicionais, como índios, eles vão fazendo tudo o que querem. Eu, pessoalmente, julgo que, no momento, está havendo um governo paralelo no centro-sul do Pará, sem que haja nenhuma atitude dos diversos níveis do governo Lula para traçar uma estratégia que evite isso.

ABr: E como o senhor vê a ação do governo diante desse quadro?

Ab’Saber: O Ministério do Meio Ambiente está totalmente enfraquecido e não tem condições de tomar atitudes corretas para defender a Amazônia. Poderia, por meio de um plano, programa ou projeto, organizar-se melhor no centro-sul do Pará e em outras áreas onde o desmatamento ainda tem esses outros fatores. O que, para nós, significa um problema muito sério, do ponto de vista da observação internacional. Lá nos Estados Unidos houve tempo em que eles diziam: "Os brasileiros não têm competência para gerenciar a Amazônia."E o problema é esse no momento.

ABr: O que imediatamente essa falta de gerenciamento provoca?

Ab’Saber: Essas dificuldades de gerenciamento dão então abertura para aqueles que estão de olho na Amazônia, não só pela floresta, mas pela água doce, pelos recursos minerais, pelas florestas que têm fármacos, uma série de produtos de importância econômica e social. E ainda pelo petróleo que foi descoberto no oeste da Amazônia, na Amazônia Ocidental. Ela, com seus 4,2 milhões de quilômetros quadrados de zona equatorial, é uma reserva de biodiversidade máxima do planeta Terra. E não pode ser colocada nas mãos de especuladores em função de uma invasão complicada do capitalismo.

Colaborou Lana Cristina

Ab’Saber alerta para risco de entregar Amazônia a grupos internacionais

Brasília – O projeto de Lei de Gestão de Florestas Públicas, de autoria do governo, é criticado pelo geógrafo Aziz Ab’Saber neste terceiro trecho da entrevista concedida à Agência Brasil. Para ele, se aprovado como está, o texto permitirá a entrega de parte das florestas amazônicas a grupos internacionais, que não entendem de seu uso sustentado.

ABr: O que o senhor acha do projeto de gestão de florestas do governo?

Ab’Saber: Esse projeto é o maior escândalo em relação à inteligência brasileira de todos os tempos. Vai ser um crime histórico. Ele partiu do Ministério do Meio Ambiente, forçado por gente que era de organizações não-governamentais, as chamadas ONGs. Todas as ONGs estão dentro do ministério, com algumas das pessoas mais cretinas desse país. Então é evidente que o ministério não vai ter condições de fazer nada favorável à defesa da Amazônia e das florestas. É preciso saber que as pessoas, que estão ao lado de dona Marina Silva (ministra do Meio Ambiente), foram até a Suíça oferecer o gerenciamento de algumas Flonas, as Florestas Nacionais, para estrangeiros.

ABr: Por que isso será um "crime histórico"?

Ab’Saber:Tentando conciliar esse erro estúpido, de florestas para ONGs, partiu de dentro do ministério a idéia de propor, paralelamente, o aluguel das Flonas para empresas particulares, que podem ser brasileiras ou internacionais. Isso porque existe uma cláusula que diz que as pessoas que têm a concessão podem repassar, vender para outros. É uma situação grave, por falta de inteligência. Porque as Flonas foram preservadas no passado, como possíveis áreas de exploração sustentada. Mas acontece que mudou o quadro, agora todas as áreas foram perturbadas e sobraram as Flonas. Era hora de dar o direcionamento para utilizar as Flonas como reservas de biodiversidade intocáveis. E o governo não sabe mudar o ideário, em função da necessidade de defender a Amazônia.

Uma das coisas que me deixam indignado é aquela expressão, no projeto, que diz que as florestas serão concedidas para ONGs estrangeiras. Depois tem uma frase assim, bem curtinha, "desde que seja para um gerenciamento auto-sustentado". Como se as pessoas que estão na Suíça, na França, ou em qualquer parte da Europa Ocidental, tivessem capacidade para fazer um gerenciamento auto-sustentado de uma área que eles mal conhecem. E, ao mesmo tempo, eles vão achar que as Flonas alugadas vão ser trabalhadas de modo discreto, limitado, por 30 ou 60 anos. E o mais grave é isso, se as Flonas forem parar nas mãos de organizações, instituições, empresas estrangeiras, a discussão mais tarde, se houver governos mais inteligentes no futuro, sobre a retomada de áreas que foram contratadas rapidamente nesse fim de governo do presidente Lula, não poderá ser mais discutida em instituições jurídicas nacionais, terá que ser no foro internacional. Eu acho que o povo brasileiro tem que estar consciente de tudo isso que está acontecendo.

ABr: Quais são os riscos do manejo?

Ab’Saber:Basta lembrar que cada Flona dessa pode ter 2 mil ou 2,5 mil quilômetros quadrados, e que as madeiras que estarão disponíveis para o aluguel não se encontram agrupadas na borda da floresta. Então, para poder explorar essas árvores, que têm troncos de madeira nobre, é preciso levar primeiro os mateiros, gente simples que, para ganhar uma miséria, vai até o coração dessas Florestas Nacionais, buscar o lugar onde tenha uma árvore, duas ou três. Depois dos mateiros, entram os moto-serristas, os que levam a moto-serra pela trilha e fazem o corte. Depois, tem que organizar caminhos. E, como tem árvore que está a 200 metros da borda, outra a 5 quilômetros, outras a 7 quilômetros, já imaginou o que vai acontecer com essas florestas?

Colaborou Lana Cristina