Tradições indígenas sustentam demarcação em área contínua, defende AGU

Estudos realizados durante o processo de demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol mostram que os hábitos culturais das etnias da região – como o ritual de casamento entre aldeias e a movimentação nômade para o plantio de alimentos – sustentam a necessidade de a terra ser demarcada em área contínua. É o que afirma o advogado-geral da União, José Antonio Dias Toffoli.

“Eles [os índios] plantam em determinada área, ficam com suas aldeias em determinada área e depois migram para áreas vizinhas. Não tem como se estabelecer uma forma de demarcação em ilhas porque esses índios têm uma mobilidade do ponto de vista da sua agricultura.”

Ao participar de entrevista a emissoras de rádio no estúdio da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), em Brasília, Toffoli ressaltou que a Constituição brasileira não prevê “nações indígenas” ou “territórios indígenas” mas “áreas indígenas”, de propriedade da União. "Não se está dando propriedade aos índios. O que se está dando é o usufruto dessas áreas pela demarcação.”

Quanto à possibilidade de a demarcação em área contínua comprometer as atividades do Exército na região, o magistrado considerou “contra-senso” que um órgão do Estado brasileiro não possa entrar numa uma área de propriedade da União. “É preciso disciplinar essa ação e isso já é feito.”

Segundo o ministro, diversas áreas indígenas no Brasil já abrigam quartéis e brigadas das Forças Armadas e, na Amazônia, quase 80% dos soldados são descendentes de índios.

“O fato de os índios estarem integrados à sociedade não tira deles o direito do usufruto das áreas historicamente ocupadas. Temos que acabar com essa história de que existem brasileiros e existem índios. Todos somos brasileiros. A presença dos índios é uma das causas de nossas fronteiras terem o tamanho que têm hoje.”

Toffoli lembrou ainda que dos 300 fazendeiros com propriedades na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, 294 foram indenizados e retirados da área e que a exceção de seis fazendeiros – todos produtores de arroz – não pode ser suficiente para modificar ou anular a demarcação.

“O Estado brasileiro não pode ficar em uma posição de ceder a seis pessoas por questões particulares de investimento e de interesse, até porque esses investimentos estão sendo indenizados e pagos pelo Estado para que eles deixem aquela área.”

PF prende líder dos arrozeiros na terra indígena Raposa Serra do Sol

Agentes da Polícia Federal prenderam hoje (6) na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, o líder dos arrozeiros e prefeito de Pacaraima, Paulo César Quartiero.

A informação foi confirmada pela assessoria de imprensa da PF em Brasília, que alegou não ter conhecimento sobre as circunstâncias da prisão, porque os delegados responsáveis estão momentaneamente sem comunicação. A reportagem tentou contato com eles e também com Quartiero por telefones celulares, mas os aparelhos estavam desligados ou fora da área de cobertura.

A prisão ocorreu um dia após funcionários do arrozeiro terem baleado índios que construíam barracos na Fazenda Depósito, de sua propriedade (leia mais ao lado). Quartiero  lidera o movimento de resistência à retirada de não-indígenas da reserva. Hoje à noite, a assessoria de imprensa da PF informou à Agência Brasil que o ruralista teria sido preso em flagrante por porte ilegal de armas.

Até o fim do mês, o Supremo Tribunal Federal (STF) deve julgar ações pendentes que contestam o decreto de demarcação da reserva em área contínua e decidir se os produtores podem ou não permanecer no local. Recentemente, uma operação de retirada deles foi suspensa pelo Supremo.

Durante a operação, Quartiero chegou a ser preso pela PF por desacato, mas foi libertado após algumas horas, mediante pagamento de fiança.

Não podemos infligir uma segunda derrota a eles

Para Viveiros de Castro, professor do Museu Nacional da UFRJ, os conflitos na reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima, são a prova do insuperável estranhamento que ainda temos em relação aos índios

Flávio Pinheiro e Laura Greenhalgh

Eduardo Viveiros de Castro, professor do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro, é considerado “o” antropólogo da atualidade. Dele diz Claude Lévi-Strauss, seu colega e mentor, seguramente um dos maiores pensadores do século 20: “Viveiros de Castro é o fundador de uma nova escola na antropologia. Com ele me sinto em completa harmonia intelectual”. Quem há de questionar o mestre frânces que, nos anos 50, sacudiu os pilares das ciências sociais com a publicação de Tristes Trópicos, relato de experiências com os índios brasileiros nos anos 30?

Pois muitos questionam Viveiros de Castro. E muitos o criticarão por esta entrevista ao caderno Aliás. Numa semana em que os conflitos entre índios e rizicultores (informalmente tratados de “arrozeiros”), lá na distante reserva Raposa Serra do Sol (Roraima), ganharam estridência e manchetes de jornais, o professor sai em defesa dos macuxis, wapixanas e outros grupos indígenas que habitam uma faixa de terra contínua de 1,7 milhão de hectares, palco de discórdias que sintetizam 500 anos de Brasil. A estridência ficou por conta de uma palestra do general Augusto Heleno, comandante militar da Amazônia, feita no Clube Militar do Rio de Janeiro. O general foi contundente: disse que a política indigenista é lamentável e caótica, ganhando imediata adesão de seus pares. Augusto Heleno, que chefiou a missão brasileira no Haiti, também bateu pesado ao reagir contra a decisão da Justiça que determina a saída dos não-índios da reserva: “Como um brasileiro está impedido de entrar numa terra porque ela é indígena? Isso não entra na minha cabeça.”

Também não entra na cabeça de Viveiros de Castro que os indígenas possam ser vistos como ameaça à soberania nacional. Ao contrário, entende que eles contribuem com a soberania. Atribui tanta polêmica ao alto grau de desinformação em torno das reservas existentes no País e, em particular, da Raposa Serra do Sol. “As terras não são dos índios, mas da União. Eles têm o usufruto, o que é bem diferente. Já os arrozeiros querem a propriedade.” O entrevistado contesta números, analisa o modelo de colonização da Amazônia e tenta desfazer discursos que, na sua opinião, são alarmistas. Mas é condescendente com o general: “Ele está sendo usado neste conflito. É claro que o Exército tem de atuar lá, defendendo nossas fronteiras. Mas o que está em jogo são os interesses em torno de uma questão fundiária”.

Ex-professor da École de Hautes Études en Sciences Sociales, de Paris, da Universidade de Chicago e da Universidade de Cambridge, Viveiros de Castro é autor de vários livros, entre eles, Arawete, os Deuses Canibais (Zahar), que resulta de pesquisa de campo com índios do Pará, e A Inconstância da Alma Selvagem (Cosac & Naify), uma coletânea de ensaios que revela sua principal contribuição para a antropologia. Trata-se do “perspectivismo amazônico”, a proposição teórica que guia todas as suas formulações.

Leia a entrevista no site do jornal O Estado de S.Paulo >

Aumento o número de índios assassinados no país

O número de índios assassinados cresceu 64% de 2006 para 2007, passando de 56 para 92 casos registrados em uma população total de 734 mil indígenas no país. A maior parte dos casos, ocorreu em Mato Grosso do Sul, onde 80 índios foram mortos nesse período: 27 em 2006 e 53 em 2007, indicando um aumento de 99% nos crimes de um ano para outro.

As informações fazem parte do relatório Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil 2006/2007, elaborado pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi), entidade ligada à Igreja Católica que acompanha a questão indígena há 36 anos e desde 1998 publica o relatório bianual. O relatório foi apresentado hoje (10) na 46ª Assembléia Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), em Itaici, no município de Indaiatuba, São Paulo.

O documento, que aborda também questões de invasão de terras, trabalho escravo e falta de assistência nas áreas da saúde e educação indígenas, aponta a questão fundiária como o principal fator responsável pelo aumento na violência entre e contra os índios.

Segundo a organizadora do relatório, Lúcia Rangel, pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), o aumento de assassinatos é resultado da crescente tensão no cotidiano das comunidades indígenas em Mato Grosso do Sul.

Ela disse que, por falta de terras, os índios vivem em acampamentos à beira das estradas ou “confinadas” em reservas, como a de Dourados, no sul do estado, onde 12 mil índios da etnia Guarani-Kaiowá vivem em cerca de 3,4 mil hectares. De acordo com o relatório, a maior parte dos assassinatos que tiveram autoria identificada foi cometida por índios.

“É uma população que não tem onde plantar, não tem como reproduzir seus meios básicos de vida, e daí decorre uma série de problemas, como desnutrição e mortalidade infantil, suicídio de jovens e conflitos internos, com assassinatos de índios por índios, e também de indígenas por seguranças de fazendeiros que não querem abrir mão de uma parte das suas terras.”

Conforme o levantamento do Cimi, um índio da reserva de Dourados dispõe de um espaço 20 vezes menor do que o de uma cabeça de gado no estado: para o gado, há em média 7 hectares de terra, enquanto na reserva de Dourados há cerca de 0,3 hectare por pessoa (o equivalente a um espaço de 30 metros quadrados ou faixa de uma sala de três por dez metros).

Lúcia Rangel lembrou que a reserva foi criada para reunir índios da etnia Guarani-Kaiwoá que estavam dispersos em Mato Grosso do Sul antes da ocupação do estado com a criação de gado e o plantio em larga escala de algodão, milho e soja e, mais recentemente, de cana-de-açúcar destinada ao biodiesel. Em Mato Grosso do Sul, além de Dourados, quatro áreas foram destinadas à etnia que, segundo o Cimi, reúne cerca de 40 mil índios no estado. As cinco áreas totalizam 40 mil hectares. Porém, os índios reivindicam da Funai a demarcação de mais 100 terras que no passado teriam sido ocupadas por eles, e a disputa pela posse de tais áreas vem gerando conflitos externos.

Uma das reivindicações da etnia é reaver suas antigas aldeias em Mato Grosso do Sul, disse a pesquisadora. “O estado deu prioridade a um projeto de desenvolvimento baseado no agronegócio, com plantações em larga escala e criação do gado em detrimento da demarcação da terra indígena, e o índios ficaram sem as terras.”.

O relatório também destaca o impacto negativo para os índios do trabalho em usinas e fazendas de cana-de-açúcar, por falta de outras alternativas de subsistência. Houve quatro assassinatos em alojamento de usinas e dois casos de trabalho escravo comprovados pelo Ministério do Trabalho no ano passado – um em março, envolvendo 150 índios, e outro, em novembro, com mais de 1.100 indígenas encontrados em situações de trabalhodegradante.

Também foram relacionados casos de violência contra índios, com assassinatos, exploração ilegal e invasão de terras indígenas, em 2006 e 2007, nos estados do Maranhão, Pernambuco e Espírito Santo.

No Maranhão, segundo estado com maior número de assassinatos, foram registrados 10 mortes de índios Guajajara no período em episódios relacionados à invasão de aldeias por madeireiros e ao contato com a estrada de ferro da empresa Vale do Rio Doce, que corta a terra indígena.

No Espírito Santo, foi destacada a disputa por terras entre os índios Tupinikim e Guarani e a empresa Aracruz Celulose, com uma série de conflitos violentos que só cessaram no ano passado com a demarcação definitiva das terras indígenas. O relatório atribui o aumento da violência contra os povos indígenas à omissão e lentidão do governo federal em demarcar as terras.

Índios cometeram maioria dos assassinatos de indígenas apontados pelo Cimi

O relatório revela ainda que a maioria dos 149 assassinatos registrados nesse período entre indígenas, com autoria definida, foi cometida por pessoas das próprias comunidades, em situações de brigas, muitas delas familiares. Mais da metade do total dos crimes ocorreu em Mato Grosso do Sul.

Para a antropóloga Lúcia Rangel, coordenadora do levantamento, o aumento da violência entre os próprios índios é reflexo das condições degradantes a que eles estão submetidos, principalmente em Mato Grosso do Sul, por estarem “confinados” em pequenas reservas onde há superpopulação e condições precárias de saúde e subsistência.

A antropóloga explicou que, apesar das várias comunidades de uma mesma reserva – como é o caso de Dourados, onde estão os Guarani-Kaiwoá – terem a mesma cultura e falarem a mesma língua, elas estão organizados em unidades autônomas (chamadas tekohá) baseadas em relações familiares e com chefias políticas e religiosas independentes.

“Quando várias dessas unidades são colocadas em uma área sem espaço, começam a competir entre si, o conflito vai aumentando e entra-se num ciclo de violência interna que não se resolverá, a não ser que cada uma das unidades retome a terra que corresponde ao seu tekohá.”, afirmou Lúcia Rangel, referindo-se à reivindicação dos 45 mil índios da etnia Guarani-Kiaowá por 100 áreas de terra no estado.

Ao comentar os suicídios registrados entre jovens indígenas no país (33 em 2006 e 28 em 2007), a antropóloga disse que trata-se de um fenômeno de difícil compreensão. “Parece um grito de alerta da juventude de que as coisas não vão bem, de que a vida está violenta, de que são ameaçados, e eles buscam no mundo dos espíritos a segurança e a paz que não encontram aqui.”

Procurada pela Agência Brasil desde terça-feira (8), a Fundação Nacional do Índio (Funai) informou, por meio da assessoria de imprensa, que o presidente do órgão, Mário Meira, não tinha agenda disponível para comentar os resultados do relatório, disponibilizados com antecedência para órgãos de imprensa.

Expansão sucroalcooleira ameaça índios do Mato Grosso do Sul, alerta Ministério Público

Ao abrir novas oportunidades para produtores rurais e para a indústria sucroalcooleira, a expansão das lavouras de cana-de-açúcar poderá resultar no aumento da exploração de trabalhadores rurais em situação degradante, inclusive de indígenas. A preocupação é do subprocurador-geral do Trabalho, Luís Camargo, coordenador Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo do Ministério Público do Trabalho (MPT).

“Se em situação normal já ocorre a exploração, imagina com a perspectiva de instalação de mais de uma centena de empresas, destilarias de açúcar e álcool, que serão implantadas no país atendendo a um crescimento enorme para essa produção”, questiona ele. De acordo com Camargo, no caso dos indígenas, a preocupação é que com a entrada de novas empresas no mercado voltem a ocorrer problemas como os verificados durante quase vinte anos no estado do Mato Grosso do Sul.
Na semana passada, o grupo de fiscalização da Delegacia Regional do Trabalho (DRT) do Mato Grosso do Sul resgatou 409 trabalhadores em situação degradante, no canavial da Destilaria Centro Oeste Iguatemi, uma usina de álcool localizada no município de Iguatemi. Desses, 150 eram indígenas das etnias guarani e terena, que dormiam nas dependências da empresa, num alojamento de alvenaria construído para abrigar 50 pessoas, segundo informações do Ministério do Trabalho e Emprego.

“O trabalhadores indígenas no Mato Grosso do Sul sabem cortar cana-de-açúcar, ou seja, eles têm o know how, conhecem a atividade, então são muito requisitados”, explica o subprocurador. Segundo Camargo, até o início de 2001, a mão-de-obra indígena era explorada sem carteira assinada.

“Era como se os indígenas prestassem serviço sem um vínculo de emprego, o que é um completo absurdo. Nós tivemos que entrar com inúmeras ações civis públicas, e só depois de ganhar todas as ações na Justiça é que nós conseguimos com que os usineiros registrassem os contratos de trabalho”. O procurador teme que “com essa enorme quantidade de destilaria s, voltemos a nos deparar com esse episódio de exploração”.

Outra preocupação, segundo Camargo, é com o grau de exploração dos trabalhadores rurais. Segundo ele, muitas empresas exigem que cada trabalhador corte cerca de 15 toneladas de cana-de-açúcar por dia. Para o subprocurador, o volume é “humanamente absurdo”. Apenas no interior de São Paulo, de acordo com ele, pelo menos seis trabalhadores rurais morreram nos últimos anos em função desse exigência.

“Há alguns anos, o chamado campeão do corte, ou seja, aquele trabalhador que cortava muito, cortava oito, nove toneladas de cana por dia. Hoje, trabalhadores que cortam oito toneladas de cana já não são mais admitidos, já não prestam mais para esse serviço, porque não atingem os índices mínimos exigidos. O que se exige hoje é um número absurdo, e por conta disso há pessoas que estão morrendo de exaustão”.

Para minimizar os riscos de expansão das lavouras de cana-de-açúcar no país, Camargo defende que o processo de implantação das empresas seja feito de forma racional, com regularização da contratação da mão-de-obra. “Se houver uma implantação indiscriminada, com o objetivo de lucro rápido e imediato, a exploração dos trabalhadores e a degradação do meio ambiente vai ser inevitável”, alertou.

Segundo a DRT/MS, os 409 trabalhadores resgatados em Iguatemi eram mantidos em condições degradantes. “Os trabalhadores estavam lá sem fornecimento de alimentação, eles tinham que trazer alimento de casa, sem fornecimento de água em condições adequadas, sem instalação sanitária na frente de trabalho, sem local para refeição”, acrescenta o chefe da Seção de Inspeção do Trabalho da DRT do Mato Grosso do Sul, Antonio Maria Pena.

Segundo ele, nove empresas do ramo estão instaladas no estado. “Essa usina em que a gente encontrou a situação degradante é uma usina que está começando agora, talvez por isso não se prestou a devida atenção ao cumprimento da legislação no que diz respeito ao ambiente de trabalho”.

Pena informou que o grupo de fiscalização da DRT prepara mais uma ação numa dessas empresas para verificar denúncias de exploração de indígenas em situação de trabalho degradante. Para não prejudicar a operação, ele preferiu não adiantar o nome da usina nem a data da ação.

Terra Indígena Raposa Serra do Sol: retirada dos invasores deve continuar

"O governo federal deu início, finalmente, ao processo de retirada definitiva dos invasores da terra indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, através da Operação Upatakon 3, da Polícia Federal.

Esta terra foi declarada como tradicionalmente ocupada pelos índios em 1998, através da Portaria MJ 820/98 e homologada pelo presidente Luis Inácio Lula da Silva, em abril de 2005. Desde então, todos os ocupantes não-índios deveriam ter deixado aquela área.

O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), desde 2005, vem viabilizando a saída de dezenas de famílias, pequenos e médios ocupantes de boa fé, oferecendo áreas alternativas para cultivo em Roraima, com indenização por benfeitorias, créditos e apoio técnico para sua realocação e continuidade na produção, na própria região rural do estado.

Ocorre que um pequeno grupo de invasores, estes de má fé, cinco plantadores de arroz comandados por Paulo César Quartiero, nunca aceitou deixar a área. São de má fé desde o início, pois entraram na região, invadindo grandes extensões de terra, quando esta já estava em procedimento demarcatório como terra indígena. O governo federal chegou, recentemente, a oferecer a transferência de terras da União ao governo de Roraima, para que este procedesse a realocação que melhor conviesse aos arrozeiros, mas estes não aceitaram a negociação, desejando permanecer invadindo a terra indígena, como tal, também propriedade da União.

Os arrozeiros e seu líder ignoram a Constituição Federal, ignoram as leis, ignoram a demarcação e a homologação da terra indígena; ignoram todas as decisões que não lhes interessam, seja da presidência da República, seja do Supremo Tribunal Federal; ignoraram a Funai e os prazos dados por esta para sua saída da Raposa Serra do Sol; ignoram a Polícia Federal em Roraima.

Quando da homologação, em 2005, os arrozeiros criaram um bando para-militar, composto por jagunços armados, que aterrorizaram as comunidades indígenas; queimaram pontes, casas, salas de aula, equipamentos e carros; espancaram professores e alunos; ameaçaram de morte religiosos, comunidades inteiras e lideranças indígenas; destruíram patrimônio dos indígenas; seqüestraram funcionários públicos e seguiram impunes. Nos últimos anos, muitos indígenas foram espancados e ameaçados de morte pela quadrilha armada e financiada pelos arrozeiros, sem que ninguém fosse punido.

Paulo César Quartiero tem um tom racista e fascista em suas declarações públicas. Quando da homologação, chegou a pregar a “resistência armada” contra o governo Lula, em programas da Rádio Equatorial, de Boa Vista, aliás fundada pelo ex-membro do Comando de Caça aos Comunistas (CCC), ex-deputado federal, já falecido, Moisés Lipnick. Este, aliás, por sua vez, foi ligado também à União Democrática Ruralista (UDR) e a seus líderes, mentores do famoso “Caso Lubeca” uma farsa eleitoral que contribuiu para inviabilizar a eleição para presidente da República de Lula, em 1989.

Paulo César Quartiero afirma que quer se articular com as Forças Armadas, para que elas “coloquem ordem em Roraima”, acusando a Polícia Federal de “incompetente”. Em declarações recentes disse, com orgulho, que comprou 8.000 estacas de madeira para ampliar sua invasão na terra indígena Raposa Serra do Sol.

Depois de detido pela Polícia Federal na última segunda-feira, dia 31 de março, acusado de quatro crimes, entre estes o de “estimular a desordem pública” e “desacato à autoridade”, foi solto sob fiança e, em liberdade, atacou a Polícia Federal e afirmou que vai continuar convocando a “resistência” contra o governo federal, dentro da área indígena.

Agora, o governador de Roraima, José Anchieta Junior, e políticos locais, afirmam que irão exigir do ministro da Justiça o fim da Operação Upatakon 3. O líder arrozeiro não faz por menos e afirma ao jornal “Folha de Boa Vista”, em 2 de abril, que “tudo deve voltar à estaca zero”, com relação à demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol, ou seja, exige simplesmente a sua anulação.

O Cimi vem a público exigir do governo federal a continuidade da Operação Upatakon 3, até a retirada completa desses invasores de má fé e, pior, criminosos e com concepções racistas e práticas terroristas, da terra indígena Raposa Serra do Sol. Tais pessoas sempre colocaram – e agora colocam mais ainda – em sério risco de vida as comunidades e lideranças indígenas, além de todos aqueles que prestam serviços àquelas comunidades.

A permanência dos arrozeiros e demais invasores na terra indígena Raposa Serra do Sol, além de ilegal, é uma afronta aos poderes legalmente constituídos, é uma agressão à democracia e aos direitos humanos e se constitui como um palco para demonstrações de apego ao fascismo, que não possui, há muito tempo, espaço no Estado de Direito, felizmente reconquistado pela sociedade brasileira."

Brasília, 02 de abril de 2008
Cimi – Conselho Indigenista Missionário

Líder indígena em Raposa Serra do Sol denuncia à PF atentados a bomba

O tuxaua Moacildo da Silva Santos, equivalente a um cacique, da comunidade do Barro, localizada dentro da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, nas proximidades do distrito de Surumu, denunciou hoje (2) à Polícia Federal atentados contra sua vida e contra a estrutura física da escola que atende os índios.

Santos disse ter sido atingido por uma bomba caseira jogada na porta de sua casa por um motoqueiro. “A bomba me atingiu, desmaiei lá dentro e fui acordar já na nossa casa de apoio”, afirmou o tuxaua, que teve ferimentos nos braços e pernas. Em entrevista à Agência Brasil, ele creditou o ataque a “pistoleiros do Paulo César [Quartiero, líder dos arrozeiros]”.

O líder indígena ressaltou que sua comunidade não trabalha com os arrozeiros, por preferir investir nas roças próprias: "Plantamos mandioca, jerimum, milho, melancia e feijão. Nós temos nossa comida e não precisamos de arrozeiro.”

E prometeu que se a Polícia Federal não retirar os arrozeiros da área, os índios irão para o combate: “Nós mesmos vamos fazer.”

O tuxaua esteve na delegacia acompanhado pela advogada Joênia Carvalho, do Conselho Indígena de Roraima (CIR). Ela relatou ter sido este o primeiro depoimento de índios da comunidade sobre ataques que se iniciaram há alguns dias. Um deles teria atingido a Escola Padre José de Anchieta, onde as aulas foram interrompidas nesta semana.

“A escola foi invadida, ocupada, teve portas arrombadas, conforme os depoentes, por moradores de Boa Vista levados por Paulo César Quartiero e pelo deputado federal Márcio Junqueira [DEM-RR]. Cadeiras, armários e merenda escolar foram furtados”, descreveu a advogada.

A destruição de pontes com dinamite e motosserras, promovida por manifestantes contrários à homologação da áreas, acrescentou, ainda prejudica o deslocamento de doentes. A Polícia Federal se comprometeu a investigar a autoria dos ataques à comnidade.

Hoje, a reportagem tentou contato com Paulo César Quartiero para que ele respondesse às denúncias dos índios, mas o arrozeiro estava com o telefone celular desligado. O filho dele, Renato Quartiero, de 23 anos, está internado em um hospital de Boa Vista, também por ter sido atingido por uma bomba na segunda-feira (31). Renato foi ferido na mão esquerda, nos braços e no tórax, quando participava de um protesto contra a homologação da terra indígena.

A Polícia Federal negou ter arremessado a bomba contra os manifestantes.

Arrozeiro é preso por cometer atentados contra comunidades indígenas

O arrozeiro Paulo César Quartieiro acaba de ser preso pela Polícia Federal, no município de Surumu, em Roraima, na região conhecida como Raposa Serra do Sol. No local, um grupo de aproximadamente cem pessoas interditou a ponte de acesso à região com carros, tratores e pneus. Houve conflito com a Polícia Federal e, na explosão de uma bomba, Renato Quartieiro, o filho do arrozeiro, ficou ferido.

Na noite de ontem (30), empregados de Quatieiro e moradores não indígenas – invasores da terra indígena de Raposa Serra do Sol – interditaram a BR-174, nas proximidades da ponte do rio Cauamé, que liga o município de Sumuru a Boa Vista. Segundo o Conselho Indígena de Roraima (CIR), a ação foi provocada após a confirmação de que seria dado início à operação de desintrusão dos não índios da área.

Na quarta-feira passada (26), lideranças indígenas se reuniram com representantes de órgãos envolvidos na operação de desintrusão da terra indígena (Ibama, Agência Nacional de Águas, Funai, Polícia Federal, Advocacia Geral da União e Incra), quando foram informadas do início da retirada dos não índios da terra indígena Raposa Serra do Sol.

Na noite deste mesmo dia, um grupo de empregados de Quartieiro, conhecidos como "motoqueiros", colocaram fogo na maloca da comunidade indígena que vive em Surumu. O fogo foi controlado pelos próprios indígenas antes que se alastrasse. As lideranças temem que novas ações violentas sejam efetuadas contra as comunidades.

As provocações contra as comunidades indígenas tiveram início na terça-feira passada, 25 de março, quando o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), julgou o processo de Paulo César Quartiero assegurando seu retorno ao cargo de prefeito do município de Pacaraima, em Roraima. O mandato de Quartieiro havia sido cassado pelo Tribunal Regional Eleitoral de Roraima, em 2006.

A sede de Pacaraima está localizada na terra indígena São Marcos e tem abrangência até a terra indígena Raposa Serra do Sol. Segundo a coordenação do CIR, Quartieiro vem utilizado o mandato de prefeito para interferir na organização social das comunidades de indígenas.

Na noite do dia 25, empregados  do arrozeiro juntaram-se a moradores não índios que ainda permanecem na comunidade de Barro, na região de Surumu, para comemorar o retorno de Quartieiro à Prefeitura de Pacaraima.

Após várias manifestações regadas a bebidas alcoólicas, eles resolveram sair em passeata pelas ruas que atravessam a comunidade indígena. Lançaram foguetes em direção às casas de palhas dos indígenas e ameaçam a comunidade. Ficaram lá até às 3h da madrugada e informaram que voltaria na noite seguinte para tocar fogo em quatro casas.

A coordenação do CIR registrou a ocorrência destes crimes praticados contra as comunidades indígenas na superintendência do departamento da Polícia Federal em Roraima.

Outro fato noticiado pela imprensa também tem causado preocupação às lideranças indígenas. É a participação do deputado federal Márcio Junqueira (PFL/RR) em atividades contrárias à retirada dos invasores da terra indígena Raposa Serra do Sol, incitando os invasores a resistirem à ação do poder público federal. Sobre este aspecto, o assessor jurídico do Cimi (Conselho Indigenista Missionário), Paulo Machado Guimarães, destaca a necessidade do Conselho de Ética da Câmara dos Deputados apurar estas notícias, “tendo em vista o risco de caracterização de conduta atentatória ao decoro parlamentar”.

Toré – Celebração e resistência no Planalto Central

Há 39 anos, indígenas de diversas partes do País encontram refúgio em uma das últimas áreas de cerrado nativo do Distrito Federal. O Santuário dos Pajés, comunidade pluriétnica situada entre o Parque Burle Marx e o Parque Nacional de Brasília, permite a índios Fulni-ô, Kariri-Xocó, Korubo, Tuxá, entre outros que ali repousam quando em trânsito pela capital, manterem suas tradições culturais, rezas e cantos peculiares.

No espaço, há plantação baseada na permacultura, de onde é possível colher o feijão, o milho, verduras e legumes, além de fitoterápicos utilizados em curas de acordo com a sabedoria ancestral. O artesanato, a culinária típica e os hábitos tribais que resistem ao tempo servem de pano de fundo às reuniões e discussões com visitantes, pesquisadores, estudantes e amigos do local.

Todo esse manancial de cultura deverá ceder espaço ao projeto de Expansão Urbana Noroeste, mais um novo bairro direcionado à classe média alta do Plano Piloto. À frente do empreendimento estão José Roberto Arruda e seu vice, o empresário do ramo imobiliário Paulo Octávio.

No dia 8 de março de 2008, os moradores do local organizaram o chamado Toré do milho, festividade em que agradecem ao Grande Espírito por mais uma colheita. Mais que uma festa, o evento torna-se um ato de resistência e fortalecimento para uma luta que se repete há 508 anos, agora na capital federal.

O filme "Toré-Celebração e resistência no Planalto Central", realizado por Eduardo Garcês, traz os cantos e os rituais indígenas mesclados às visões e reivindicações dos povos que ali residem e trabalham sua relação com a terra e com o cerrado.

Drogas atrapalham desempenho de estudantes indígenas em Tabatinga, diz professor

O consumo de álcool e drogas começa logo cedo na vida dos jovens da aldeia de Umariaçu 2, em Tabatinga (AM), e acaba repercutindo no desempenho escolar dos estudantes. A avaliação é do professor de artes Nilson Alexandre Ferreira.

"A gente está enfrentando um sério problema, devido ao contato direto com a cidade. Eles estão perdendo sua cultura e trazendo outra cultura que não é deles e estão enfrentando problemas sociais, como as drogas e a violência."

Por causa das drogas, muitos alunos deixam de estudar. "Eles desistem e não vão para a aula. É uma preocupação muito grande dos professores e das autoridades. A situação é muito difícil e nós temos que nos preocupar com os jovens, oferecer o melhor para eles, porque são o nosso futuro. Oferecer esporte e cultura seria um meio de minimizar a situação. Está faltando apoio das autoridades", diz o professor.

Ele admite que há pouco o que fazer em relação aos traficantes. "Todo mundo tem medo. Ninguém sabe a que horas eles vêm. É um problema sério", avaliou Ferreira.

De acordo com o coordenador de Assuntos Indígenas da Prefeitura de Tabatinga, Alberto Gaspar Jorge, o que dificulta o combate ao tráfico na aldeia é justamente sua posição, próxima ao Rio Solimões, em frente à margem peruana e a poucos quilômetros da Colômbia.

"Quem produz droga na Colômbia e no Peru vem vender droga na comunidade. É um problema para nós e para o país também. A cocaína é trazida de fora", revela Alberto Gaspar Jorge, que mora na aldeia.

Segundo ele, a produção de cocaína já envolve os indígenas dos países vizinhos. "Na comunidade peruana indígena, que fica a aproximadamente três horas de viagem, estão plantando. Na Colômbia é a mesma coisa. Os índios peruanos e colombianos são incentivados por comerciantes brasileiros e colombianos. Se o governo federal não tomar providência, acho que [as comunidades] vão acabar. A coca está acabando com a juventude."