Ministro classifica de "gravíssima" decisão do STF que suspendeu operação em reserva

O ministro da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, Paulo Vannuchi, classificou hoje (18) de “gravíssima” a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que suspendeu a operação de retirada de arrozeiros da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima. Segundo ele, a homologação da área de 1,7 milhão de hectares cumpriu todos os requisitos legais e, portanto, a desocupação deve ser concluída.

“Com todo o respeito que é obrigatório a um cidadão em relação ao STF, a intervenção interrompe um processo de mais de três anos, com todas as fases de convencimento postergadas, e que é um ato jurídico perfeito”, afirmou Vannuchi, em discurso na abertura do seminário O Caso Guarani Kaiowá: uma História de Violação dos Direitos Humanos. O evento ocorre na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP).

Para o ministro, a decisão do STF, em caráter liminar, é “surpreendente”, uma vez que a ocupação da reserva por agricultores é, segundo ele, inconstitucional e o Supremo é justamente o tribunal encarregado de zelar pelo cumprimento da Constituição.

Vannuchi disse, no entanto, que não é a primeira vez que o STF toma uma decisão contrária aos direitos dos povos indígenas.

Ele lembrou uma determinação semelhante, de dezembro de 2005, em que o tribunal suspendeu a desocupação de uma área indígena Ñanderu Marangatu, no Mato Grosso do Sul.

A área foi ratificada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em março de 2005. O então presidente do STF, Nelson Jobim, concedeu liminar suspendendo a demarcação até o julgamento do mérito, ainda não concluído.

Em dezembro do mesmo ano, a Polícia Militar do estado cumpriu ordem de despejo e os índios montaram um acampamento na beira de uma estrada ao lado da terra. Em 24 de dezembro, o líder guarani Dorvalino Rocha foi morto a tiros.

Segundo Vannuchi, a medida acarretou conflitos entre índios e agricultores da região. “O Judiciário é a instituição mais defasada no que diz respeito aos direitos humanos”, avaliou Vannuchi.

Assim como o ministro, o professor da Faculdade de Direito da USP Dalmo de Abreu Dallari criticou a decisão do Supremo. Segundo ele, a resolução dos conflitos em Roraima é simples. “Cumpra-se a Constituição”, afirmou o professor em palestra ministrada durante o evento, acrescentando que os indígenas têm direito sobre a área. 

Para Dallari, tanto o Judiciário como o Ministério Público, que não denuncia os agricultores por manterem uma “quadrilha” na reserva, falham no trabalho de garantir os direitos indígenas. Ele destacou ainda que omissões do governo federal também colaboram para os conflitos.

“A Constituição diz que o governo é responsável pela demarcação das áreas indígenas, ele [o governo] é deficiente no cumprimento desse dever constitucional.”

Em entrevista, Paulo Vannuchi reconheceu falhas do Executivo e relacionou os problemas à falta de orçamento. O ministro disse que as críticas são bem-vindas e serão levadas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Por que a demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol virou debate no STF?

Há mais de 30 anos os povos Macuxi, Wapixana, Taurepang, Ingaricó lutam pela demarcação de suas terras. A reivindicação destes povos está amparada pela Constituição Federal, em seu Artigo 231. Nesta terra, ao longo de mais três décadas, ocorreram dezenas de conflitos, onde lideranças indígenas foram assassinadas, torturadas, comunidades agredidas, malocas incendiadas, pessoas seqüestradas e terras devastadas por garimpos ilegais e pela ação predatória de centenas de invasores.

Em 2005, o governo federal decidiu pela homologação desta terra. Este ato do presidente brasileiro não foi uma concessão e nem atitude de benevolência. Foi o cumprimento de uma determinação constitucional, orientada e delimitada pelos resultados de longos anos de estudos e comprovações antropológicas, históricas, arqueológicas e sociológicas da ocupação tradicional dos povos indígenas naquele território. Também foi conseqüência de décadas de mobilizações e campanhas de solidariedade em âmbito nacional e internacional pela defesa dos direitos indígenas.

A recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de suspender a operação que finalmente retiraria os invasores das terras indígenas dos povos de Roraima, mostra que a “Suprema Corte Brasileira”, os considera uma ameaça à soberania nacional, ou, como disse o próprio presidente da República, “entraves ao desenvolvimento”. Estes povos que sistematicamente defenderam o território brasileiro, ali construíram suas histórias, enfrentaram as mais terríveis adversidades, os mais poderosos inimigos, inclusive da Pátria, para defender o Brasil de invasores clandestinos, de contrabandistas, narcotraficantes, mineradores, garimpeiros, de colonizadores genocidas, de gente sem pátria.

Quando se pensava que a demarcação de suas terras, trariam às comunidades indígenas, paz para continuar vivendo com dignidade de acordo com seus costumes e suas culturas específicas, o STF volta a debater a demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol. São preocupantes algumas declarações de importantes ministros daquele Corte:

“A demarcação desta terra trará problemas a soberania nacional” (ministro Celso de Mello).

“O que não pode é você criar um estado e depois criar uma reserva que tenha 50%, 60% do seu tamanho” (ministro Gilmar Mendes).

Por que só agora os ilustres ministros resolverem considerar que a demarcação da referida terra indígena traz perigo a soberania do país? Por que meia dúzia de arrozeiros, invasores da terra indígena, poderão produzir arroz se sobrepondo aos direitos constitucionais de mais de 18 mil indígenas? E ainda, por que os seis arrozeiros produzirão riquezas ao Estado e os povos indígenas, legítimos ocupantes daquela região, produzirão apenas prejuízos?

Quais os fundamentos legais para que ministros do STF qualifiquem os indígenas como entraves ao desenvolvimento e a soberania nacional, enquanto os invasores, praticantes de inúmeras ilegalidades constitucionais porque ocupam indevidamente e de má fé propriedade da União, além de praticarem crimes contra as comunidades indígenas e à sociedade de Roraima com a destruição de patrimônio público, como a queima de pontes, são considerados, pelos ilustres ministros, agentes do desenvolvimento econômico?

É preciso chamar a atenção dos ministros do STF para o fato de 3,1 milhões de hectares de terras na Amazônia Legal estarem nas mãos de estrangeiros. A informação é do próprio presidente do Incra, Rolf Hackbart. A área corresponde a 39 mil imóveis rurais, mas pode ser ainda maior. O avanço do agronegócio e os altos preços dos grãos têm chamado a atenção dos estrangeiros, o que tem aumentado a especulação imobiliária na região. Terras estariam sendo vendidas até pela internet. As terras indígenas, ao contrário, quando reconhecidas tornam-se patrimônio da União, cabendo aos índios apenas o seu usufruto.

Cabe ainda questionar, se por trás do debate instalado no STF sobre a demarcação de Raposa Serra do Sol, não há questões políticas envolvidas. Os direitos dos povos indígenas não estariam mais uma vez servindo de “moeda de troca” no jogo político nacional?

O caso Raposa Serra do Sol evidencia para quais dos lados penderão as análises e as interpretações de nossas autoridades. Ou aos Povos Indígenas portadores de direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, e que a Constituição Federal lhes assegura, ou para os invasores, que apenas pretendem obter o lucro fácil em terras alheias, como é o caso dos invasores arrozeiros da terra Raposa Serra do Sol.

Porto Alegre (RS), 16 de abril de 2008.

Roberto Antonio Liebgott
Vice-Presidente do Cimi

Sem arrozeiros, índios vizinhos à Raposa Serra do Sol dizem viver em paz

No meio da tarde, o wapichana Manduca Tavares, 46 anos, colhe melancias na roça da Comunidade do Milho, na Terra Indígena São Marcos, área de 111 mil hectares vizinha à Raposa Serra do Sol – em que a Polícia Federal (PF) pode deflagrar a qualquer momento uma ofensiva para a retirada de arrozeiros e não-índios, como manda o decreto de homologação de 2005.

“Desenvolvemos nossa área com nossa própria produção. Não precisamos de arrozeiro”, resume o anfitrião, que é vice-coordenador da Associação dos Povos da Terra Indígena São Marcos

A lista de produtos inclui ainda mandioca e banana, vendidos nas cidades, assim como carne bovina e suína. “Comemos arroz porque compramos”, ressaltou, ao revelar o apoio da Fundação Nacional do Índio (Funai) e o recebimento de recursos do Programa Nacional de Agricultura Familiar (Pronaf) pelas famílias para investir no cultivo próprio.

Na bem-estruturada vila da comunidade – com escola, telefone, igreja e antena parabólica – Maria Elza Tavares, mulher de Manduca, garante ser “um bom lugar para criar os filhos, tranqüilo e sem perturbação”. A conversa com o marido dela se aprofunda em uma sombra que alivia o calor de Roraima, sob olhar atento de jovens, mulheres e crianças dali. Um gole d’água e Manduca diz o que pensa sobre o iminente confronto na área vizinha, que tem 1,7 milhão de hectares: “Eles [arrozeiros] são invasores. Não são de Roraima, não têm 20 anos aqui e vieram usufruir sem dar porcentagem para a população”.

A divisão dos indígenas da Raposa Serra do Sol entre o apoio e o repúdio aos arrozeiros seria, conforme Manduca, reflexo da ocupação da área por não-índios: “A gente vive integrado, mas quando alguém coloca na cabeça dos parentes promessa de ajuda…”. Uma pausa e a reflexão continua: “Os parentes apoiam [arrozeiros] sem ter conhecimento. São poucos índios que trabalham com eles”.

A presença do arrozeiros na região poderia ser até admitida, argumentou Manduca, mas diante de um novo tipo de relacionamento com as comunidades tradicionais: “Podem voltar como parceiros e não invasores. E precisam dar maior assistência”.

Para ele, o fato de os índios da área já adotarem costumes típicos de quem vive nas cidades não significa que possam viver no mesmo espaço que os brancos. A explicação vem com uma metáfora:

“Um homem tinha um tamanduá e passou cinco anos dando leite para ele beber. Mas o tamanduá não virou bezerro nem vaca”, disse. “Podemos usar sapatos e calças bonitas, pegar um avião para ir em Brasília, mas vamos morrer índios”, acrescentou.

O caminho de volta a Boa Vista inclui uma travessia de balsa sobre o rio Uraricoera. Apesar de não ser o foco do iminente confronto entre a PF e os não-índios da região, a Terra Indígena São Marcos – que engloba 39 comunidades – já foi prejudicada com a destruição de duas pontes em estradas que dão acesso à Raposa Serra do Sol.

Terra Indígena Raposa Serra do Sol: retirada dos invasores deve continuar

"O governo federal deu início, finalmente, ao processo de retirada definitiva dos invasores da terra indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, através da Operação Upatakon 3, da Polícia Federal.

Esta terra foi declarada como tradicionalmente ocupada pelos índios em 1998, através da Portaria MJ 820/98 e homologada pelo presidente Luis Inácio Lula da Silva, em abril de 2005. Desde então, todos os ocupantes não-índios deveriam ter deixado aquela área.

O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), desde 2005, vem viabilizando a saída de dezenas de famílias, pequenos e médios ocupantes de boa fé, oferecendo áreas alternativas para cultivo em Roraima, com indenização por benfeitorias, créditos e apoio técnico para sua realocação e continuidade na produção, na própria região rural do estado.

Ocorre que um pequeno grupo de invasores, estes de má fé, cinco plantadores de arroz comandados por Paulo César Quartiero, nunca aceitou deixar a área. São de má fé desde o início, pois entraram na região, invadindo grandes extensões de terra, quando esta já estava em procedimento demarcatório como terra indígena. O governo federal chegou, recentemente, a oferecer a transferência de terras da União ao governo de Roraima, para que este procedesse a realocação que melhor conviesse aos arrozeiros, mas estes não aceitaram a negociação, desejando permanecer invadindo a terra indígena, como tal, também propriedade da União.

Os arrozeiros e seu líder ignoram a Constituição Federal, ignoram as leis, ignoram a demarcação e a homologação da terra indígena; ignoram todas as decisões que não lhes interessam, seja da presidência da República, seja do Supremo Tribunal Federal; ignoraram a Funai e os prazos dados por esta para sua saída da Raposa Serra do Sol; ignoram a Polícia Federal em Roraima.

Quando da homologação, em 2005, os arrozeiros criaram um bando para-militar, composto por jagunços armados, que aterrorizaram as comunidades indígenas; queimaram pontes, casas, salas de aula, equipamentos e carros; espancaram professores e alunos; ameaçaram de morte religiosos, comunidades inteiras e lideranças indígenas; destruíram patrimônio dos indígenas; seqüestraram funcionários públicos e seguiram impunes. Nos últimos anos, muitos indígenas foram espancados e ameaçados de morte pela quadrilha armada e financiada pelos arrozeiros, sem que ninguém fosse punido.

Paulo César Quartiero tem um tom racista e fascista em suas declarações públicas. Quando da homologação, chegou a pregar a “resistência armada” contra o governo Lula, em programas da Rádio Equatorial, de Boa Vista, aliás fundada pelo ex-membro do Comando de Caça aos Comunistas (CCC), ex-deputado federal, já falecido, Moisés Lipnick. Este, aliás, por sua vez, foi ligado também à União Democrática Ruralista (UDR) e a seus líderes, mentores do famoso “Caso Lubeca” uma farsa eleitoral que contribuiu para inviabilizar a eleição para presidente da República de Lula, em 1989.

Paulo César Quartiero afirma que quer se articular com as Forças Armadas, para que elas “coloquem ordem em Roraima”, acusando a Polícia Federal de “incompetente”. Em declarações recentes disse, com orgulho, que comprou 8.000 estacas de madeira para ampliar sua invasão na terra indígena Raposa Serra do Sol.

Depois de detido pela Polícia Federal na última segunda-feira, dia 31 de março, acusado de quatro crimes, entre estes o de “estimular a desordem pública” e “desacato à autoridade”, foi solto sob fiança e, em liberdade, atacou a Polícia Federal e afirmou que vai continuar convocando a “resistência” contra o governo federal, dentro da área indígena.

Agora, o governador de Roraima, José Anchieta Junior, e políticos locais, afirmam que irão exigir do ministro da Justiça o fim da Operação Upatakon 3. O líder arrozeiro não faz por menos e afirma ao jornal “Folha de Boa Vista”, em 2 de abril, que “tudo deve voltar à estaca zero”, com relação à demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol, ou seja, exige simplesmente a sua anulação.

O Cimi vem a público exigir do governo federal a continuidade da Operação Upatakon 3, até a retirada completa desses invasores de má fé e, pior, criminosos e com concepções racistas e práticas terroristas, da terra indígena Raposa Serra do Sol. Tais pessoas sempre colocaram – e agora colocam mais ainda – em sério risco de vida as comunidades e lideranças indígenas, além de todos aqueles que prestam serviços àquelas comunidades.

A permanência dos arrozeiros e demais invasores na terra indígena Raposa Serra do Sol, além de ilegal, é uma afronta aos poderes legalmente constituídos, é uma agressão à democracia e aos direitos humanos e se constitui como um palco para demonstrações de apego ao fascismo, que não possui, há muito tempo, espaço no Estado de Direito, felizmente reconquistado pela sociedade brasileira."

Brasília, 02 de abril de 2008
Cimi – Conselho Indigenista Missionário

Líder indígena em Raposa Serra do Sol denuncia à PF atentados a bomba

O tuxaua Moacildo da Silva Santos, equivalente a um cacique, da comunidade do Barro, localizada dentro da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, nas proximidades do distrito de Surumu, denunciou hoje (2) à Polícia Federal atentados contra sua vida e contra a estrutura física da escola que atende os índios.

Santos disse ter sido atingido por uma bomba caseira jogada na porta de sua casa por um motoqueiro. “A bomba me atingiu, desmaiei lá dentro e fui acordar já na nossa casa de apoio”, afirmou o tuxaua, que teve ferimentos nos braços e pernas. Em entrevista à Agência Brasil, ele creditou o ataque a “pistoleiros do Paulo César [Quartiero, líder dos arrozeiros]”.

O líder indígena ressaltou que sua comunidade não trabalha com os arrozeiros, por preferir investir nas roças próprias: "Plantamos mandioca, jerimum, milho, melancia e feijão. Nós temos nossa comida e não precisamos de arrozeiro.”

E prometeu que se a Polícia Federal não retirar os arrozeiros da área, os índios irão para o combate: “Nós mesmos vamos fazer.”

O tuxaua esteve na delegacia acompanhado pela advogada Joênia Carvalho, do Conselho Indígena de Roraima (CIR). Ela relatou ter sido este o primeiro depoimento de índios da comunidade sobre ataques que se iniciaram há alguns dias. Um deles teria atingido a Escola Padre José de Anchieta, onde as aulas foram interrompidas nesta semana.

“A escola foi invadida, ocupada, teve portas arrombadas, conforme os depoentes, por moradores de Boa Vista levados por Paulo César Quartiero e pelo deputado federal Márcio Junqueira [DEM-RR]. Cadeiras, armários e merenda escolar foram furtados”, descreveu a advogada.

A destruição de pontes com dinamite e motosserras, promovida por manifestantes contrários à homologação da áreas, acrescentou, ainda prejudica o deslocamento de doentes. A Polícia Federal se comprometeu a investigar a autoria dos ataques à comnidade.

Hoje, a reportagem tentou contato com Paulo César Quartiero para que ele respondesse às denúncias dos índios, mas o arrozeiro estava com o telefone celular desligado. O filho dele, Renato Quartiero, de 23 anos, está internado em um hospital de Boa Vista, também por ter sido atingido por uma bomba na segunda-feira (31). Renato foi ferido na mão esquerda, nos braços e no tórax, quando participava de um protesto contra a homologação da terra indígena.

A Polícia Federal negou ter arremessado a bomba contra os manifestantes.

Arrozeiro é preso por cometer atentados contra comunidades indígenas

O arrozeiro Paulo César Quartieiro acaba de ser preso pela Polícia Federal, no município de Surumu, em Roraima, na região conhecida como Raposa Serra do Sol. No local, um grupo de aproximadamente cem pessoas interditou a ponte de acesso à região com carros, tratores e pneus. Houve conflito com a Polícia Federal e, na explosão de uma bomba, Renato Quartieiro, o filho do arrozeiro, ficou ferido.

Na noite de ontem (30), empregados de Quatieiro e moradores não indígenas – invasores da terra indígena de Raposa Serra do Sol – interditaram a BR-174, nas proximidades da ponte do rio Cauamé, que liga o município de Sumuru a Boa Vista. Segundo o Conselho Indígena de Roraima (CIR), a ação foi provocada após a confirmação de que seria dado início à operação de desintrusão dos não índios da área.

Na quarta-feira passada (26), lideranças indígenas se reuniram com representantes de órgãos envolvidos na operação de desintrusão da terra indígena (Ibama, Agência Nacional de Águas, Funai, Polícia Federal, Advocacia Geral da União e Incra), quando foram informadas do início da retirada dos não índios da terra indígena Raposa Serra do Sol.

Na noite deste mesmo dia, um grupo de empregados de Quartieiro, conhecidos como "motoqueiros", colocaram fogo na maloca da comunidade indígena que vive em Surumu. O fogo foi controlado pelos próprios indígenas antes que se alastrasse. As lideranças temem que novas ações violentas sejam efetuadas contra as comunidades.

As provocações contra as comunidades indígenas tiveram início na terça-feira passada, 25 de março, quando o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), julgou o processo de Paulo César Quartiero assegurando seu retorno ao cargo de prefeito do município de Pacaraima, em Roraima. O mandato de Quartieiro havia sido cassado pelo Tribunal Regional Eleitoral de Roraima, em 2006.

A sede de Pacaraima está localizada na terra indígena São Marcos e tem abrangência até a terra indígena Raposa Serra do Sol. Segundo a coordenação do CIR, Quartieiro vem utilizado o mandato de prefeito para interferir na organização social das comunidades de indígenas.

Na noite do dia 25, empregados  do arrozeiro juntaram-se a moradores não índios que ainda permanecem na comunidade de Barro, na região de Surumu, para comemorar o retorno de Quartieiro à Prefeitura de Pacaraima.

Após várias manifestações regadas a bebidas alcoólicas, eles resolveram sair em passeata pelas ruas que atravessam a comunidade indígena. Lançaram foguetes em direção às casas de palhas dos indígenas e ameaçam a comunidade. Ficaram lá até às 3h da madrugada e informaram que voltaria na noite seguinte para tocar fogo em quatro casas.

A coordenação do CIR registrou a ocorrência destes crimes praticados contra as comunidades indígenas na superintendência do departamento da Polícia Federal em Roraima.

Outro fato noticiado pela imprensa também tem causado preocupação às lideranças indígenas. É a participação do deputado federal Márcio Junqueira (PFL/RR) em atividades contrárias à retirada dos invasores da terra indígena Raposa Serra do Sol, incitando os invasores a resistirem à ação do poder público federal. Sobre este aspecto, o assessor jurídico do Cimi (Conselho Indigenista Missionário), Paulo Machado Guimarães, destaca a necessidade do Conselho de Ética da Câmara dos Deputados apurar estas notícias, “tendo em vista o risco de caracterização de conduta atentatória ao decoro parlamentar”.

Raposa Serra do Sol precisa ser desocupada

Os ministros da Justiça, Tarso Genro, e da Defesa, Nelson Jobim, discutiram nesta segunda-feira (29), em Brasília, ações para solucionar o impasse sobre a desocupação de não-índios da reserva indígena Raposa Serra do Sol, no norte de Roraima. Há quase cinco meses, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu retirar agricultores da área e manter o decreto presidencial que garante 1,74 milhão de hectares para os 18 mil índios da região.

De acordo com o ministro Tarso Genro, a área reservada aos índios já foi devidamente demarcada, mas ainda serão necessárias providências para desocupar as áreas sem causar conflitos com a população não-indígena. “A avaliação do Ministério da Justiça é de que a decisão [do STF] precisa ser rigorosamente cumprida. É preciso agir de forma mais tranqüila para que se minimizem os conflitos diretos”, disse.

Tarso garantiu que não houve pedido de auxílio das Forças Armadas e também não estabeleceu prazos para a liberação das terras. “Trouxe algumas questões ambientais para o ministro Jobim avaliar. Esse assunto tem importância econômica e repercussão política internacional”, disse o ministro sem entrar em detalhes.

O ministro Nelson Jobim não conversou com os jornalistas após a reunião com Tarso Genro.

Estima-se que ainda existam sete produtores de arroz na área indígena. O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) ofereceu uma área de 24 mil hectares para assentar os agricultores, mas ainda há resistência.

Vivem na reserva cerca de 14 mil índios das etnias Macuxi, Wapixana, Ingarikó, Taurepang e Patamona. 

Agricultores têm de deixar terra indígena em Roraima, diz STF

Os cerca de 14 mil índios das etnias Macuxi, Wapixana, Ingarikó, Taurepang e Patamona, habitantes da reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima, não terão mais que conviver com agricultores e pecuaristas. O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu hoje (4) manter a homologação da reserva de 1,7 milhão de hectare e garantir a desocupação de não-índios. A homologação do território foi regulamentada por meio de decreto presidencial em 2005. A sentença do STF foi unânime.

Durante o julgamento, o relator do mandado de segurança da Itikawa Indústria e Comércio contestando o decreto, ministro Carlos Ayres Britto, afastou a argumentação de que somente o Congresso Nacional teria poderes para homologação de terras indígenas. Britto lembrou que o Estatuto do Índio confere esses poderes ao presidente da República e, portanto, reconheceu a legalidade da reserva Raposa Serra do Sol. Os demais ministros acompanharam o voto do relator.

A advogada da Advogacia-Geral da União (AGU), Gracie Maria Fernandes, explicou que com a decisão, a Fundação Nacional do Índio (Funai) poderá prosseguir na proteção do território e atuar na expulsão e expropriação de não-índios da reserva. Entre eles, rizicultores e criadores de gado.

“O que STF fez foi reconhecer a legitimidade de toda atuação da administração pública com relação ao procedimento demarcatório e com relação ao decreto do presidente. Com isso, permite que os trabalhos de remoção da Funai tenham continuidade”.

Fernandes informou que no processo de expropriação, as benfeitorias consideradas de boa fé, ou seja, que não desrespeitam normas de proteção ao meio ambiente ou trabalho, por exemplo, serão indenizadas.

O advogado dos agropecuaristas Luiz Valdemar Albrecht reconheceu que, no momento, o grupo está “descoberto” e precisará de uma nova liminar para não ser expulso imediatamente da área. E destacou a importância da produção de arroz para região que abastece o estado de Roraima e a cidade de Manaus (AM). “Os produtores estão estabelecidos na região há muitos anos. Na região aprimoraram e ampliaram as atividades. Ao ter que sair, quem vai substituí-los?”, questionou.

A conciliação entre indígenas e rizicultores seria impossível na avaliação de Albrecht. O advogado acredita que organizações internacionais pressionam os índios para usufruírem da biodiversidade amazônica. “Hoje há uma infiltração de ONGs estrangeiras fazendo biopirataria de todo tipo. Como o indígena é tutelado, não tem vontade própria, não é ele que administração a terra”.

Terêncio Salamão, da etnia Wapixana, acredita que a decisão do STF sinaliza um fim de disputas de terras na região. “Durante 30 anos lutamos para que estas sejam áreas de comunidades indígenas. Uma luta muito difícil, onde muitos dos nosso sofreram com a morte e as ameaças de rizicultores”, afirmou.

Durante o julgamento, o ministro Carlos Ayres Britto também descartou a hipótese de violação de direitos aos agropecuaristas, que afirmavam não terem sido ouvidos no processo que culminou na demarcação da reserva.

A decisão do Supremo não é definitiva dependendo do julgamento do mérito da ação.

O território Raposa Serra do Sol  fica ao norte do estado de Roraima na fronteira com a Guiana e a Venezuela. É habitado por cinco etnias com cerca de 150 comunidades. A homologação de terras indígenas é a última etapa de um processo que se iniciou com estudos de identificação e delimitação do território.

STF vai julgar ações judiciais que impedem a conclusão da demarcação da TI Raposa-Serra do Sol (RR)

Foram julgadas ontem (28/06) no Supremo Tribunal Federal – STF duas ações judiciais (Reclamações nº. 3331 e nº. 3813) que pedem que todos os processos relativos à demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, sejam por ele analisados. Por dez votos a um, os ministros do tribunal decidiram ser de sua competência o processamento e julgamento de diversas ações que questionavam a validade da Portaria nº. 534, do Ministro da Justiça, que estabelece os limites da área indígena.

Desde 2004, deputados e fazendeiros da região vêm questionando o processo demarcatório da terra indígena junto ao STF, o que atrasou a conclusão do processo administrativo. O mesmo acontece, há mais tempo, na Justiça Federal de Roraima, na qual já foram ajuizadas diversas ações pedindo a nulidade da demarcação da área, sob o argumento de que isso estaria lesando o patrimônio público estadual, já que supostamente se estaria reduzindo substancialmente a área do Estado de Roraima. No começo do ano passado, no entanto, o STF julgou improcedente todas essas ações, abrindo caminho para que o processo administrativo de demarcação fosse finalizado .

Apesar disso, desde o ano passado a Justiça Federal em Roraima vem proferindo liminares em diversas ações possessórias interpostas por fazendeiros locais, que não aceitam a demarcação da TI e se recusam a sair da área, mesmo com o pagamento das benfeitorias pela Fundação Nacional do Índio (Funai). Essas liminares vêm atrasando a finalização do processo de regularização fundiária da área e expulsando indígenas de aldeias que estão dentro dos limites da terra indígena. Em todas as suas decisões o juiz argumenta que o processo administrativo de demarcação é inválido, baseado exclusivamente nas conclusões de um laudo pericial que, além de haver sido apresentado em um processo já julgado extinto, ainda apresenta graves falhas de metodologia e de conteúdo, como ficou demonstrado em análise efetuada por técnicos do Ministério Público Federal.

O relator das duas ações em curso no STF, ministro Carlos Ayres Britto, entendeu ser de competência daquela corte julgar todas as ações possessórias que tenham como objeto disputa por terras inseridas dentro dos limites da TI Raposa-Serra do Sol. Esse posicionamento, aliás, havia sido exposto no julgamento de outras ações parecidas, o que apenas confirma a coerência da decisão de ontem. O único ministro a divergir dessa posição foi Marco Aurélio Mello que entende ser de competência dos juízes de primeiro grau julgar ações possessórias, mesmo que incidam dentro de terra indígena homologada.

Espera-se agora, que a decisão do STF seja respeitada, e que todas as ações sejam realmente julgadas de maneira uniforme pelo tribunal. A decisão, vai contrariar o Juiz Helder Girão Barreto, da 1ª Vara Federal de Boa Vista, que em várias ações possessórias interpostas por fazendeiros deferiu medidas liminares quase idênticas, nas quais alega ser de competência da Justiça Federal de primeira instância o julgamento de tais casos, apesar de decisão anterior do STF determinando o contrário. Segundo seu magistério, "nunca, jamais, em tempo algum da história constitucional republicana esta matéria (disputa sobre direitos indígenas) foi de competência originária do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, como penso haver demonstrado em trabalho acadêmico" (Decisão Liminar no Processo nº 2006.42.00.000098-7 e no Processo nº 2006.42.00.000737-0, ambos em curso na 1ª Vara Federal da Seção Judiciária de Roraima).

O processo de desintrusão, realizado pela Funai e pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), é a última etapa do procedimento demarcatório. Leia mais. No caso da Raposa-Serra do Sol, está longe de terminar, apesar do esforço concentrado de ambas as instituições. Há ainda várias liminares da Justiça Federal de Roraima que impedem a continuidade do trabalho. Com a decisão de ontem, esses processos serão julgados pelo STF, que deverá avaliar se há fundamento para mantê-las ou não.

Nenhum posseiro de Raposa Serra do Sol foi indenizado no prazo de um ano

A uma semana de expirar o prazo para a retirada de todos os ocupantes não-índios da terra indígena Raposa Serra do Sol, conforme estabelecido no decreto de homologação, assinado em 15 de abril de 2005, nenhum posseiro foi indenizado, de um total estimado de 250 famílias.

O administrador da Funai em Boa Vista, Gonçalo Teixeira, informa que a Instituição tem recursos para pagar 28 processos de famílias em que o levantamento fundiário já foi concluído.

De acordo com o decreto homologatório, o Governo Federal deveria, no prazo de um ano, indenizar os ocupantes de boa-fé e reassenta-los em áreas do Incra, Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária.

A competência do Incra é reassentar clientes da reforma agrária, em áreas de 100 ou 500 hectares, a depender do tamanho da posse. A maioria absoluta dos posseiros é considerada pequeno produtor.

Raimundo Lima, diretor de Programas para a Região Norte, do Incra Nacional, garante que o Instituto já dispõe de áreas para reassentar as famílias. “Apenas os rizicultores (grandes produtores), que se negaram a discutir uma alternativa para a desintrusão, não serão atendidos de imediato pelo Governo”, informa.

Além de receberem a indenização e os lotes de terra do Incra, os pequenos produtores poderão acessar financiamentos do Pronaf [Programa Nacional da Agricultura Familiar]. “Essa uma forma que o Governo Federal está buscando para amparar as famílias”, acrescenta Lima.

Nagib Lima, coordenador do Comitê Gestor, encarregado de cumprir as metas pós-homologação, inclusive a desintrusão da terra indígena, assegura que até o dia 15 de abril, todos os posseiros serão cadastrados. “A partir do dia 17 de abril, eles [posseiros] poderão procurar o escritório do Grupo de Trabalho formado por Funai e Incra, para receberem as indenizações”, comenta Lima.

O coordenador destaca, ainda, que até hoje, 10/4, cerca de 95% dos posseiros já foram cadastrados e que a única resistência enfrentada pelo Grupo de levantamento fundiário foi nas lavouras de arroz e na vila Surumu.  Para que o trabalho seja concluído, a Polícia Federal está fazendo a segurança dos servidores.

O Conselho Indígena de Roraima – CIR, está atuando no sentido de que o Comitê Gestor conclua o levantamento fundiário e o Governo Federal pague as indenizações imediatamente. Devido aos rumores de possíveis conflitos na região da Raposa Serra do Sol, o CIR solicitou a presença da Polícia Federal para garantir a segurança das comunidades indígenas.

Apesar de toda a tensão vivenciada na terra indígena Raposa Serra do Sol, principalmente na região de Surumu (próxima aos arrozais), nenhum incidente foi constatado até esta data.