Lançado Plano de Turismo Sustentável na Bacia do Rio São Francisco

Gerar desenvolvimento social e econômico na região da Bacia do Rio São Francisco através da exploração do turismo é um dos principais objetivos do Plano de Turismo Sustentável na Bacia do Rio São Francisco, lançado hoje (23) em Brasília.

A meta, segundo Fernando Ferreira, coordenador de Turismo Sustentável do Programa de Revitalização da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, é explorar o potencial dos recursos naturais da região de modo que haja, além do desenvolvimento do turismo, a melhoria da infra-estrutura local. Para ele, “o turismo sustentável pode contribuir significativamente para a revitalização do rio São Francisco”.

Fazem parte da Bacia Hidrográfica do São Francisco os estados da Bahia, Minas Gerais, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Goiás e o Distrito Federal. O rio se estende por 2.700 quilômetros e atravessa quatro trechos, que correspondem às regiões geográficas do Baixo, Submédio, Médio e Alto São Francisco. Em cada uma dessas regiões, o turismo a ser explorado vai desde as praias fluviais e câniones até a cultura, gastronomia e folclores sertanejos.

No Baixo São Francisco, de acordo com o Plano, o Cânion do São Francisco e a Foz do Velho Chico, em Alagoas, e o Pólo Foz do Velho Chico, em Sergipe, são as principais regiões turísticas. A caatinga também apresenta grande potencial, mas o documento elaborado pelo Ministério do Meio Ambiente ressalta que o baixo grau de escolaridade da população e o alto grau de pobreza, junto com a falta de água e pouca oferta de emprego, restringem o desenvolvimento socioeconômico da região. A degradação ambiental também é grande: apenas 2% da vegetação são protegidos por unidades de conservação.

No Submédio São Francisco, formado 25 municípios da Bahia, destacam-se o sítios paleontológicos e o passado histórico do Cangaço e da saga de Antônio Conselheiro. Também são destaques as unidades de conservação Raso da Catarina e Parque Nacional do Catimbau. “Esse é o grande interesse do turista: conhecer a história do sertanejo, como é que viveu Lampião. Como foi a história de Canudos. Hoje o sertanejo convive com o semi-árido e isso é atratividade turística”, explicou o coordenador. Ele acrescentou que “as unidades de conservação são o cerne do desenvolvimento do ecoturismo”.

A oferta de meios de transporte, hospedagem e alimentação aparecem com um dos principais desafios para o desenvolvimento do turismo na região. No Médio São Francisco, região formada por Minas Gerais, Goiás, Bahia e Distrito Federal, os parques nacionais são apontados como atrativos-chave. O Plano sugere a população seja instruída sobre o funcionamento do turismo na região, tipo ainda como atividade incipiente.

No Alto São Francisco, 40 municípios, divididos em três pólos turísticos, são grandes potenciais para o desenvolvimento da atividade. Eles compreendem o Parque Nacional da Serra da Canastra, o Lago Três Marias, o Parque Nacional da Serra do Cipó, além da nascente do São Francisco. Também apresenta vasto patrimônio cultural e, diferentemente dos outros trechos pelos quais o rio passa, possui infra-estrutura básica para o turismo.

Fernando Ferreira destaca que a principal vantagem da região da Bacia Hidrográfica do rio São Francisco é o clima quente durante a maior parte do ano. “Isso facilita o acesso aos atrativos. São áreas de interesse turístico muito grande e que a gente pode transformar em produto turístico se nós tivermos infra-estrutura e serviços agregados a esses atrativo”

O Plano de Turismo Sustentável na Bacia do Rio São Francisco levou três anos para ser concluído. Ao todo foram identificadas 385 ações que deverão ser desenvolvidas ao longo da implementação do projeto. De acordo com Ferreira, elas serão iniciadas na Serra da Canastra e deverão alcançar populações de mais de 180 municípios da Bacia do São Francisco.

Fernando Ferreira informou ainda que parte dos investimentos para a implementação do Plano, cerca de R$ 13 milhões, provém do Programa de Revitalização do rio São Francisco, previsto no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Frente em Defesa do São Francisco quer aprovar PEC que cria fundo para revitalização

A Frente Parlamentar em Defesa do São Francisco, que foi reinstalada hoje (12) na Câmara, tem como principal objetivo a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que cria o fundo de Revitalização do São Francisco.

Segundo o coordenador da frente, deputado Fernando Ferro (PT-PE), o projeto prevê a destinação de R$ 6 bilhões em 20 anos para a revitalização do São Francisco. "O projeto prevê, não apenas a  transposição, mas cria as condições para um uso sustentável da bacia e para que se pague uma dívida histórica com o rio ao longo de anos de degradação", disse.

O deputado acrescentou que a PEC vai tratar, também, da recuperação dos afluentes do São Francisco. "O Fundo prevê também o saneamento das cidades ribeirinhas, a revitalização das matas ciliares e a redução do despejo de agrotóxicos e queimadas nas margens de seus afluentes", afirmou.

A PEC que cria o Fundo aguarda votação em plenário. Em seguida retorna ao Senado para aprovação em dois turnos.

Ministério Público e movimentos sociais criticam licença para transposição do São Francisco

A autorização do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para o início das obras de integração do Rio São Francisco às bacias da região Nordeste recebeu críticas do Ministério Público e de movimentos sociais. Os impactos ambientais e a possibilidade de prejuízo aos cofres públicos, em caso de paralisação das obras, são os principais pontos contestados.

Coordenadora interestadual das Promotorias de Justiça do São Francisco, Luciana Khouri ressaltou que a transposição é alvo de 12 ações no Supremo Tribunal Federal (STF). Caso o governo comece logo as obras, ela disse acreditar que os trabalhos correm o risco de ser paralisados pelo Supremo – e isso, na avaliação dela, provocará prejuízos aos cofres públicos.

A procuradora aconselhou o governo a esperar a posição do STF sobre o assunto antes de iniciar qualquer obra, mesmo com a licença de instalação concedida. “Como não existe decisão definitiva, a licença pode ser revogada a qualquer momento. E nesse caso os trabalhos não passariam de desperdício de recursos públicos”, advertiu.

Como o caso tramita no Supremo, somente a Procuradoria-Geral da República (PGR) pode recorrer da licença do Ibama. Luciana, no entanto, informou que o Ministério Público da Bahia vai pedir à PGR que tente suspender a licença judicialmente. “Muito provavelmente, essa licença vai motivar a 13ª ação contra a transposição”, disse.

A decisão do Ibama também desagradou aos movimentos sociais. Membro do Fórum de Defesa do Rio São Francisco, movimento que reúne 60 entidades da sociedade civil contrárias à transposição, Cícero Félix dos Santos disse temer que uma eventual paralisação das obras provoque prejuízos ao meio ambiente: “Se o governo começar a construir e tiver que parar tudo, as conseqüências para a região serão ainda piores do que se o canal estivesse pronto – imagine o esqueleto que ficará lá”.

Para Cícero, que também é coordenador da Comissão Pastoral da Terra (CPT) em Juazeiro (BA), a decisão do Ibama foi precipitada. “Em primeiro lugar, o rio precisa passar por um trabalho de recuperação ambiental, com a vegetação das margens replantada, o tratamento do esgoto despejado no rio e a contenção das erosões”, alertou.

Os possíveis impactos sociais e ambientais são os principais pontos questionados no STF. Uma das críticas diz respeito às consultas públicas sobre a transposição. “As audiências foram realizadas longe das comunidades atingidas pelo desvio do rio e convocadas com apenas dois dias de antecedência. A população do semi-árido não foi ouvida”, apontou a procuradora, para quem os estudos de impacto ambiental não esclareceram os danos que poderia causar o desvio de parte do São Francisco para abastecer outros estados. "Os estudos foram lacônicos e, ao contrário do que o Ibama alega, não se pode dizer que a obra é ambientalmente viável", disse.

De autoria do Ministério Público da Bahia, em conjunto com o Comitê da Bacia do São Francisco e movimentos sociais, as ações apontam mais problemas legais em torno da transposição. Um dos processos trata da passagem do canal por comunidades indígenas e quilombos. A captação da água, em Cabrobó (PE), ocorrerá em terras dos índios Truká. Segundo Luciana, qualquer alteração no uso da água em áreas indígenas tem de ser autorizada pelo Congresso Nacional.

A possibilidade de a água retirada do rio ser usada com fins econômicos também serve de motivo para que a transposição seja contestada na Justiça. “O Comitê de Bacia, que é formado pela sociedade, só autorizou a captação da água para o consumo humano e animal, não para o agronegócio e a indústria”, ressaltou Cícero Félix dos Santos.

Correndo pra lugar nenhum: os dez rios mais ameaçados do mundo

As maiores fontes de abastecimento de água do mundo – rios em todos os continentes – estão secando ou severamente ameaçados. Má gestão e proteção inadequada indicam que já não há como presumir que estes rios correrão para sempre, segundo a rede WWF.

No relatório "Os dez rios mais ameaçados do mundo", divulgado em antecipação ao Dia Mundial da Água (22 de março), a rede WWF enumera os rios que mais rapidamente estão secando como resultado das mudanças climáticas, poluição e barragens.

“Todos os rios do relatório simbolizam uma crise dos recursos hídricos, que vem sendo sinalizada há anos, alarme ao qual se tem feito ouvidos de mercador”, disse Jamie Pittock, Diretor do Programa Global de Água Doce da rede WWF. “Da mesma forma como as mudanças climáticas têm, agora, a atenção dos governos e da iniciativa privada, queremos que os governantes e lideranças percebam a emergência enfrentada pela água agora, não mais tarde”.

Cinco dos dez rios mencionados no relatório estão na Ásia: Yangtze, Mekong, Salween, Ganges e Indus.  O Danúbio, na Europa, os rios Prata e Grande/Bravo – nas Américas -, a bacia africana Nilo-Lago Vitória e a australiana Murray-Darling também compõem a lista.

Barragens ao longo do Rio Danúbio – um dos maiores da Europa – já destruíram 80% das áreas inundáveis e áreas úmidas da bacia.  Mesmo sem o aquecimento que ameaça degelar o Himalaia, o Rio Indus enfrenta escassez devida à superexploração de suas águas para a agricultura.  As populações de peixes, maior fonte de proteínas e mais importante fonte de vida para centenas de milhares de famílias em todo o planeta, também se encontram ameaçadas.

O Brasil, a Lei e o PAC

A bacia do Prata é a segunda maior bacia da América do Sul. É formada pelos rios Paraguai, Paraná e Uruguai que juntos drenam uma área correspondente a 10,5% do território brasileiro, com 3,2 milhões de km².  Ela permeia passa pelos as fronteiras do Brasil, Argentina, Bolívia, Paraguai e Uruguai e já  possui 27 grandes barragens. O Prata é um dos rios mais ameaçados do mundo pelo grau de fragmentação que sofreu. Segundo Denise Hamú, secretária geral do WWF-Brasil, a conseqüência é a rompimento do equilíbrio ecológico dos rios e o impacto social em função do deslocamento de milhares de pessoas. “Além disso, os Governos não vêm aplicando as recomendações da Comissão Mundial das Barragens para os projetos de represas”.

Os demais rios brasileiros não estão livres de ameaças, segundo Samuel Barrêto, coordenador do Programa Água para a Vida de Gestão e Conservação de Recursos Hídricos, da ONG ambiental brasileira WWF-Brasil, que compõe a rede mundial.  “A Lei das Águas está completando dez anos e há avanços importantes como a criação da Agência nacional de Águas  – ANA e a aprovação do Plano Nacional de Recursos Hídricos (PNRH), mas ainda existem lacunas e vulnerabilidades”, afirma Barrêto.

O especialista também inclui o componente climático como um dos fatores de risco sobre a quantidade e qualidade da água, comprometendo a segurança hídrica de milhões de brasileiros. “É também preciso considerar o aspecto econômico”, avalia Samuel, pois, segundo ele, o Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), da forma como foi apresentado, não deixa claro como as diretrizes ambientais e o capital natural irão permear o projeto, deixando uma brecha para o crescimento a qualquer custo, com degradação dos recursos naturais, ameaçando o nosso capital essencial, para a manutenção dos negócios a médio e longo prazos.

O relatório da rede mundial conclama os governos a protegerem melhor os recursos hídricos para garantir os ecossistemas e a vida das pessoas.

“A conservação de rios e áreas úmidas deve ser vista como parte e parcela da segurança nacional, saúde e sucesso econômico”, acrescentou Pittock.  “Devem-se incentivar formas eficientes de utilização dos recursos hídricos para a agricultura e outros fins.”

A rede WWF acrescentou que acordos de cooperação para a gestão de recursos coletivos preconizados pela Convenção dos Cursos D’água das Nações Unidas devem ser ratificados e financiados.

“A crise hídrica é maior do que apenas os dez rios mencionados neste relatório, mas ele reflete como o crescimento descontrolado reduz a capacidade de natureza de atender às nossas próprias crescentes demandas”, concluiu Pittock.  “Devemos mudar nosso comportamento agora ou pagar o preço em um futuro não muito distante.”

Bispo de Barra critica declarações do novo ministro da Integração

O bispo da Diocese de Barra (BA), Dom Luiz Cappio, rebateu as declarações do novo ministro da Integração, Geddel Vieira Lima, de que algumas pessoas defendem a revitalização sem ter suficiente conhecimento sobre o assunto. O bispo afirmou que é o ministro quem demonstra não conhecer a fundo o projeto. “Se ele conhecesse, não faria este tipo de pronunciamento. O tipo de revitalização que o governo federal quer fazer realmente não vai trazer benefício nenhum”.

D. Cappio reafirmou que o projeto de revitalização que o governo defende, e que ele classifica como “pobre”, tem de ser revisto. Em 2005, o bispo católico fez uma greve de fome de dez dias contra a transposição do rio. Naquele ano, ele conseguiu, em uma audiência com o presidente, o compromisso de que a proposta de transposição do rio seria debatida com a sociedade.

Já a proposta de Geddel Vieira de promover uma campanha para informar a população sobre a transposição do São Francisco foi classificada como “ótima” por Ruben Siqueira, um dos coordenadores do acampamento Pela Vida do Rio São Francisco e do Nordeste, Contra a Transposição, cujos participantes permaneceram em Brasília a semana inteira em busca de apoio político para impedir o início do projeto.

“Mas uma campanha com informações verdadeiras, não mentiras. Se o governo continuar mentindo não servirá para nada”.

Acampamento pela Vida do Rio São Francisco faz balanço positivo de mobilização

Representantes de organizações e movimentos sociais que integram o Acampamento pela Vida do Rio São Francisco e do Nordeste contra a Transposição fizeram hoje (16) um balanço dos cinco dias das mobilizações realizadas em Brasília.

Em nota, os cerca de 600 acampados se disseram vitoriosos ao deixarem a capital federal por terem cumprido seu objetivo: “sensibilizar as autoridades da República e a opinião pública para a inviabilidade do projeto de transposição do rio São Francisco para o Nordeste Setentrional”.

Para eles, os encontros com autoridades dos poderes Judiciário e Legislativo, realizados ao longo da semana, também foram positivos.

“Fomos recebidos pelos presidentes do Senado [Renan Calheiros (PMDB-AL)] e da Câmara [Arlindo Chinaglia (PT-SP)], que disseram que esse projeto não pode ser levado à frente sem uma profunda revitalização do rio e sem o debate para esclarecer de todas as dúvidas”, diz o texto.

Eles também afirmaram ter ficado decepcionados por não terem sido recebidos pelo “primeiro escalão” do Palácio do Planalto.

“Nos empurraram para o Ministério da Integração, com o argumento de que esse é o responsável pela transposição e de que foi determinado pelo presidente Lula como nosso único interlocutor”.

Na avaliação do representante do Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP), Alzení Tomaz, isso demonstra que “cai a máscara do governo no momento em que ele não se coloca à disposição para dialogar com a sociedade e com o povo da bacia do São Francisco.

Para bispo de Barra (BA), dom Luiz Flávio Cappio, o fato de os acampados não terem sido recebidos pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva também demonstra o sucesso do movimento.

“O fato de o Executivo não querer dialogar com o povo desmascara aquela propaganda enganosa do governo, que dizia que a transposição é para beneficiar os pobres, pois, na hora em que os pobres chegam para dialogar com o governo, não são recebidos”.

A nota destaca, ainda, o lançamento do edital de licitação das obras da primeira etapa da transposição, no valor de R$ 3,3 bilhões. Segundo o documento, essa é a mesma quantia que poderia ser usada nas 530 obras de pequeno porte, propostas pelo Atlas Nordeste da Agência Nacional das Águas (ANA), que levaria água para 34 milhões de pessoas.

Ainda segundo a nota, na segunda-feira (19), a comissão de articulação do acampamento vai ao Tribunal de Contas da União (TCU) para tratar dos gastos que estão sendo feitos com a obra de transposição.

Hoje, uma comissão protocolou uma ação contra o projeto no Supremo Tribunal Federal (STF). A medida é baseada em pareceres do Tribunal de Contas da União (TCU), que questionam as obras no Projeto de Integração do Rio São Francisco com as Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional.

Participaram do acampamento entidades como o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (Conic), Comissão Pastoral da Terra (CPT), Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Centro Pastoral Popular (CPP), Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apionme) e Fórum Permanente em Defesa do São Francisco.

Bispo diz que transposição do São Francisco é "golpe fatal" à vida e ao povo que vive do rio

O bispo da cidade de Barra (BA), dom Luiz Flávio Cappio, disse hoje (16) que o projeto de transposição do Rio São Francisco é um “golpe fatal à vida do rio” e, como tal, acaba sendo um golpe mortal ao povo que depende do rio.

A afirmação foi feita durante coletiva à imprensa, no encerramento do Acampamento pela Vida do Rio São Francisco e do Nordeste contra a Transposição. No início da semana, representantes de movimentos sociais contrários ao programa de integração montaram acampamento em Brasília, em protesto contra o projeto.

Dom Cappio classificou a obra de “insana, louca e desvairada”. Segundo ele, o objetivo do acampamento era mostrar que, mesmo não sendo a favor da obra, as diversas entidades que participam do movimento estão dispostas a dialogar com o governo.

“Nós, como povo do velho Chico [como o rio é tradicionalmente conhecido na cultura regional], como conhecedores que somos da nossa realidade, gostaríamos de dar nossa sugestão, nossas idéias”, declarou. “E gostaríamos de vê-las aceitas, porque ninguém mais do que nós, que dependemos do rio para viver, queremos que o rio viva”.

Ele diz que, por estar aberto ao diálogo, não aceita a forma como o projeto vem sendo tratado. “De maneira autoritária, sem consultar diretamente aqueles que estão ligados ao rio”, afirmou, ao acrescentar que as decisões não devem ser tomadas “dentro de quatro paredes de um palácio; através da cabeça de meia dúzia de burocratas”.

Indagado se voltaria a fazer outra greve de fome para protestar contra as obras, ele respondeu que, por enquanto, não pensa em repetir ação. Em 2005, ele ficou sem comer em protesto contra o proejto.

“Uma greve de fome só se utiliza em ultimo caso, e acreditamos que ainda temos muitas alternativas para lançarmos mão antes de um grito desesperado, como o de uma greve de fome”.

Durante a semana, representantes de movimentos sociais em defesa do São Francisco participaram de audiências públicas na Câmara dos Deputados e no Supremo Tribunal Federal (STF).

Eles se reuniram com o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia, do Senado Federal, Renan Calheiros, e com a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.

No final do mês passado, o bispo esteve em Brasília para entregar um projeto alternativo para amenizar a falta de água no semi-árido nordestino. Ele protocolou uma carta no Palácio do Planalto na qual sugere que, em lugar da transposição, sejam construídos canais para desviar a água do Rio São Francisco.

Além disso, pede a revitalização do rio, a construção de cisternas para armazenar a água da chuva e a execução de 530 projetos da Agência Nacional de Águas (ANA) que, segundo ele, resolveriam os problemas de abastecimento hídrico na região até 2015.

Transposição do São Francisco recebe críticas em audiência pública na Câmara

A transposição do Rio São Francisco foi criticada hoje (15) durante audiência pública na Comissão de Meio Ambiente e de Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados.

O pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco João Suassuna afirmou em seu depoimento que o projeto é desnecessário porque no Nordeste tem muita água. O que falta, segundo ele, são políticas efetivas para fazer essa água chegar à população.

“Entendemos que não há escassez (de água) no Nordeste, o problema não é de escassez, é de distribuição”, afirmou.

Para Suassuna, a solução passa por interligar as bacias já existentes no Nordeste e utilizar a águas dos poços, que segundo ele são cerca de 60 mil na região. O uso das cisternas também é defendido pelo especialista, que calcula que uma cisterna de 15 mil litros abasteça uma família de cinco pessoas durante oito meses de estiagem.

O doutor em recursos hídricos da Universidade Federal do Rio Grande do Norte João Abner Guimarães considerou que o projeto de transposição pouco tem a ver com o que é mostrado pelo governo e a mídia. Para ele, a transposição irá abastecer grandes açudes e não os que sofrem com a seca. “É o momento de acabarmos com a indústria da seca no Nordeste, alertou.

Para a promotora Luciana Khoury, da Bahia, o projeto não está de acordo com as leis brasileiras. “O projeto não atende as leis do país. Há necessidade de aprimoramento, de mudanças”, defendeu. E argumenta que o Congresso Nacional não foi ouvido e que os estudos de impacto ambiental são falhos.

A realização das audiências pública é outro ponto fraco em defesa da transposição apontado pela promotora. Segundo ela, as audiências foram realizadas nas capitais e as comunidades ribeirinhas foram avisadas com poucos dias de antecedência. Essas condições, segundo a promotora, dificultaram o acesso dos ribeirinhos (aos locais das audiências).

Com uma camiseta com a frase “Revitalização sim, transposição não”, o morador de Penedo, em Alagoas, Antônio Gomes dos Santos, defendeu que a revitalização não deve ser feita ao mesmo tempo, mas sim antes da transposição, porque “o rio está fraco”. “O rio se enchia onde se criava o camarão, se plantava o arroz, hoje estão plantando cana o que é um crime ecológico”, denunciou.

A voz dissonante na audiência foi a do ex-presidente do Departamento Nacional de Obras contra a Seca (Dnocs) Cássio Aguiar Braga. Favorável à transposição, Braga contestou os argumentos contrários apresentados pelos especialistas e pela promotora.

O ministro da Integração nacional, Pedro Brito, foi convidado para a audiência, mas não compareceu. Parlamentares da comissão lamentaram a ausência de representantes do ministério.

Governo publica edital de supervisão de obras de transposição do São Francisco

Foi publicado hoje (6), no Diário Oficial da União, o edital de supervisão das obras de transposição do Rio São Francisco. O Ministério da Integração Nacional irá contratar serviços de consultoria para acompanhamento técnico e supervisão do fornecimento dos equipamentos da primeira etapa de implementação do projeto.

O edital foi lançado inicialmente em maio de 2005, mas foi suspenso por causa de liminares da Justiça que impediam o licenciamento e as licitações da obra. Em dezembro do ano passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou as liminares.

Em fevereiro deste ano, o procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, pediu novamente ao STF a suspensão do processo de licenciamento ambiental da obra. O pedido ainda não foi julgado.

Em 12 de janeiro, o Ministério da Integração lançou o edital de projetos executivos para implementação do projeto de transposição do São Francisco. O edital de obras deve ser publicado nas próximas semanas.

O edital de supervisão pode ser adquirido a partir de hoje no Ministério da Integração. A entrega das propostas será feita no dia 25 de abril.

Visão Rota Brasil Oeste

A transposição do São Francisco é criticada por muitos especialistas como mais uma obra faraônica sem tanta repercussão social. O formato da transposição é apontado como centralizador e de pouco alcance social.

Segundo o secretário executivo do Movimento Organização Comunitária, organização não-governamental que trabalha no semi-árido, Nadilson Quintela, a transposição é um mito. "É um projeto velho, cheio de politicagem que não promove o uso difuso da água, reproduz uma idéia de crescimento, mas não de desenvolvimento social. Está centrada na grande irrigação e não na agricultura familiar, alimenta a concentração de riquezas", afirma.

Um proposta mais interessante e barata, por exemplo, seria a construção de cisternas de capitação de água da chuva. Uma cisterna, ao custo de R$1.470,00, garante o abastecimento de uma família de cinco pessoas durante 11 meses. Além de estimular a indústria de construção local, esta solução tem alcance maior no sertão e descentraliza a propriedade da água.

Um novo desfile e a mesma fantasia

Haja fôlego, paciência, persistência. Há uns 15 anos vem o autor destas linhas transcrevendo periodicamente graves questões levantadas por cientistas, administradores públicos, Tribunais de Contas, a respeito do famigerado projeto de transposição das águas do Rio São Francisco. A todas responde a administração federal – quando responde – com argumentos do tipo “não se pode negar uma caneca de água a 12 milhões de vítimas da seca”. E vai em frente, até que surja uma nova barreira – como foi a greve de fome do bispo dom Luiz Flávio Cappio.

Agora, esquecido o bispo e derrubadas na Justiça medidas liminares, anuncia o Ministério da Integração Nacional que fará imediatamente licitações (no valor aproximado de R$ 100 milhões) para contratar empresas que façam os projetos executivos da obra, orçada em R$ 6,6 bilhões nesta etapa. E o bispo manda nova carta ao presidente, lembrando que o Tribunal de Contas da União diz que o projeto não beneficiará o número de pessoas que se alardeia, que a Agência Nacional de Águas propõe obras em 530 municípios para solucionar os mesmos problemas com metade dos recursos previstos para a transposição e que populações a 500 metros do rio continuarão, apesar da transposição, a sofrer com a falta de água. Já o Comitê de Gestão da bacia (que por 44 votos a 2 foi contra a transposição) diz que esta atende a menos de 20% do semi-árido, que 44% da população do meio rural continuará sem acesso a água – “exatamente os que mais precisam” – e que a revitalização do rio prometida pelo Ministério da Integração Nacional precisa “sair do campo da retórica”. E o Ministério Público volta a recorrer à Justiça, lembrando que nos termos da Constituição, por atingir terras indígenas, a obra precisa de autorização do Congresso Nacional, o que ainda não aconteceu.

Como já foi dito aqui, parece uma assombração que some e reaparece de tempos em tempos. Sem falar no governo imperial, foi no começo da década de 1980, ainda nos tempos do “Brasil Grande” da ditadura militar, que o projeto ressuscitou, para uma vida muito breve. Pouco mais de uma década depois, embora o então ministro do Meio Ambiente Rubens Ricupero dissesse que o São Francisco já era “um rio ameaçado de extinção”, por causa do desmatamento nas regiões onde nascem e por onde passam seus formadores, o Ministério do Interior voltou à carga, com um projeto de transpor 150 metros cúbicos por segundo, a um custo de US$ 1,5 bilhão. Mas ele foi fulminado por um parecer do Tribunal de Contas da União, que mostrava ser um fantasma esdrúxulo, pois o Ministério do Planejamento dele não sabia, assim como os Ministérios da Agricultura (que cuida de irrigação), da Reforma Agrária e da Fazenda (que libera recursos). Além disso, o projeto implicava prejuízos de US$ 1 bilhão anuais na geração de energia, inviabilizava mais áreas para irrigação a montante do que beneficiava a jusante e concentrava os benefícios num pequeno número de grandes produtores rurais.

Foi para o limbo até 1998, quando ressurgiu em nova versão de túneis que levariam água para o abastecimento de cidades, ao custo de US$ 700 milhões. Durou pouco a reaparição. Mas já estava de volta no final de 2000, numa versão em que 127 metros por segundo transpostos beneficiariam 8 milhões de pessoas e o abastecimento de água de 268 cidades, além de irrigar 260 mil hectares. O professor Aziz Ab’Saber, da USP, lembrou na época que os beneficiados seriam menos de um terço das vítimas da seca (27 milhões). A Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) observou que pelo menos 30% da água se perderia por evaporação. E a Cáritas mostrou que a solução para comunidades isoladas está na implantação de cisternas de placa (das quais já há 160 mil), não na transposição, que não chegaria a esses lugares.

Levou algum tempo para recuperar-se o combalido. Mas retornou em 2003. Dessa vez, teve a oposição do Comitê de Gestão da bacia, da CNBB, da OAB, das arquidioceses à beira-rio. Custaria R$ 4,2 bilhões para uma transposição de 53 metros cúbicos por segundo. Vários especialistas (professor Aldo Rebouças, da USP, professor Abner Curado, da UFRN, professor João Suassuna, da Fundação Joaquim Nabuco, entre muitos) mostraram a desnecessidade: o problema no semi-árido é de gestão, não de escassez.

Mesmo levantando mais de 40 questões, o Ibama concedeu em 2005 licença prévia. Sabendo que 70% da água seria para irrigação e 26% para o abastecimento de cidades, e não para proporcionar “uma caneca de água para as vítimas da seca”. Que não estava equacionada a questão dos subsídios necessários para uma água que poderia custar até cinco vezes mais que a então disponível. Que a maior parte da água transposta iria para açudes onde se perde até 75% por evaporação. Que havia enormes discrepâncias a cada citação do número de beneficiados (12 milhões? 7,24 milhões? 9,02 milhões? 7,21 milhões?) e dos hectares irrigados (161 mil? 186 mil?). Mais grave que tudo: o próprio estudo de impacto ambiental dizia que 20% dos solos que se pretendia irrigar “têm limitações para uso agrícola”; e “somados aos solos líticos, notadamente impróprios, respondem por mais de 50% do total” das terras que seriam irrigadas. Não bastasse, “62% dos solos precisam de controle, por causa da forte tendência à erosão”. Ainda assim, concedeu licença prévia ao projeto, pois as objeções do Comitê de Gestão haviam sido ignoradas pelo Conselho Nacional de Recursos Hídricos, onde o governo federal, sozinho, tem a maioria dos votos.

Agora, o velho abantesma retorna à avenida, sem responder a nenhuma das muitas questões levantadas principalmente por cientistas.

E retorna com a mesma fantasia.

Washington Novaes é jornalista
Texto originalmente publicado em "Espaço Aberto" no jornal "O Estado de São Paulo"