Codevasf estuda concessão de terras para reforma agrária no São Francisco

Além dos 350 mil hectares desapropriados pelo governo na região do Rio São Francisco, dos quais pelo menos 50 mil serão utilizados para assentamentos, outros 100 mil hectares de terras da Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e o Parnaíba (Codevasf) também serão disponibilizados para o projeto de reforma agrária do governo federal. O formato jurídico para a utilização das terras da Codevasf ainda está em estudo pelo Executivo, mas a idéia da Companhia é que as terras sejam disponibilizadas por meio de concessão.

Segundo o presidente da Codevasf, Luiz Carlos Everton de Faria, as terras que serão disponibilizadas pela empresa estão situadas em localidades próximas a projetos de irrigação – o que facilita o plantio de diversas culturas para os futuros assentados. "Eles poderão se utilizar da tecnologia que a Codevasf possui em irrigação. A tecnologia da Codevasf é irrigação, e nós podemos dar essa contribuição em projetos de assentamentos a exemplo do que já estamos fazendo no Piauí", ressaltou.

Luiz Carlos Faria disse que está previsto no projeto de integração do rio São Francisco um levantamento de todas as propriedades adequadas para a criação de assentamentos, assim como as que são consideradas ideais para irrigação e fruticultura. "Ao passar os canais da integração de bacias, tanto o Norte como o Leste, vamos ter um levantamento de todas a propriedades adequadas à irrigação, áreas que são adequadas à reforma agrária", revelou.

Na avaliação do presidente da Codevasf, a concepção de desenvolvimento social prevista no projeto de integração das águas do Velho Chico pode efetivamente melhorar o potencial econômico da região – assim como reduzir as desigualdades no Nordeste brasileiro. "Não se trata simplesmente de água para o consumo humano. É todo o conjunto de ações que podem ser desenvolvidas nessas regiões. A água é um elemento fundamental para alavancar o desenvolvimento. São ações que com certeza vão propiciar auto-sustentabilidade das populações das margens dessa região", enfatizou.

Com a transposição do rio, Luiz Carlos Faria acredita que as águas atualmente perdidas com a evaporação dos açudes poderá garantir aumento da produção. "A integração de bacias nada mais é do que uma segurança hídrica para esses reservatórios de água e para as populações serem beneficiadas", defendeu.

Idéia de integração do São Francisco com a reforma agrária nasceu com Celso Furtado

A idéia de reservar terras para a reforma agrária dentro do projeto de transposição do Rio São Francisco é antiga, e surgiu na década de 60 com a criação da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene). O economista Celso Furtado, que presidiu o órgão entre 1959 e 1964, defendia publicamente a idéia, mas não conseguiu colocá-la em prática.

O ex-presidente Juscelino Kubistchek também tentou vincular a reforma agrária ao projeto de transposição do rio. Ele enviou ao Congresso Nacional em 1959 projeto de lei, conhecido como a "Lei da Irrigação", que determinava a desapropriação de terras para assentamentos antes da implantação de qualquer projeto de irrigação nas margens dos São Francisco. O projeto foi derrotado pelo Congresso Nacional e, com o golpe militar de 1964, acabou sem ser reformulado para nova tentativa de votação pelo Legislativo.

Em entrevista à Agência Brasil em julho de 2003, o economista Celso Furtado criticou o que chamou de "bloqueio das forças reacionárias" à idéia inicial de vincular a reforma agrária à irrigação no Nordeste. Segundo o economista, que morreu em novembro do ano passado, o plano original da Sudene era baseado na "ilusão" de que havia um governo popular chefiado por Juscelino que, com forte apoio popular, conseguiria garantir um processo de transformações da estrutura agrária.

"Por isso, quando nós começamos, a primeira coisa que fizemos na Sudene foi um projeto de lei de reforma agrária disfarçado de uma lei de irrigação. Era preciso aproveitar melhor as terras irrigadas, e nós começamos a reforma agrária por aí. Isso foi levado a sério. Só que as forças reacionárias bloquearam tudo isso. Não foi possível tocar no problema agrário, que é o mais grave no Nordeste, sem dúvida nenhuma", ressaltou.

Na entrevista, realizada no primeiro ano de governo do presidente Lula, Celso Furtado disse estar otimista diante da nova proposta de transposição do São Francisco então em estudo pelo Grupo de Trabalho Interministerial criado em junho de 2003. "Hoje em dia, se há mais recursos para abordar o problema, como eu estou vendo que há muito mais recursos – e mais coragem dos políticos, que já não são mais tão subordinados aos interesses dos latifundiários – isso é um avanço", disse.

O projeto de integração que está em discussão pelo Executivo prevê não apenas a utilização das águas do São Francisco para perenizar os rios e açudes do Nordeste brasileiro no período de estiagem. A prioridade, segundo o governo federal, é melhorar as condições de vida da população que vive às margens do rio ou tem no São Francisco o seu meio de sobrevivência. O Orçamento aprovado no Congresso prevê R$ 600 milhões para a execução do projeto neste ano.

Os estados mais beneficiados seriam a Paraíba, o Rio Grande do Norte e o Ceará. O rio São Francisco possui 2,8 mil km de extensão, nasce em Minas Gerais, na Serra da Canastra, e desemboca no Oceano Atlântico, entre Sergipe e Alagoas.

rea de 50 mil hectares na região da integração do São Francisco será para reforma agrária

Pelo menos 50 mil hectares de terras situadas na região do projeto de integração do Rio São Francisco vão ser destinadas à reforma agrária. A desapropriação das terras foi autorizada em maio do ano passado, por decreto do presidente Lula, que declarou como de interesse social e utilidade pública cinco mil quilômetros quadrados situados ao longo dos 62 quilômetros de extensão da área de abrangência do projeto de transposição.

O decreto autorizou a desapropriação de 350 mil hectares de terras na região. Mas segundo levantamento feito pelo Ministério da Integração Nacional e pelo Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra) nesse período, até agora 50 mil hectares são considerados ideais para agricultura – o que permitiria assentar pelo menos duas mil famílias em lotes de 25 hectares.

Caso o governo decida ampliar o número de hectares destinados à reforma agrária, o número de famílias assentadas pode chegar a 12 mil. "Nas terras do São Francisco, declaramos de utilidade pública 2,5 quilômetros para cada lado dos eixos, que dá ao todo 350 mil hectares. Nós não necessariamente vamos desapropriar tudo, e nem tudo é próprio para reforma agrária", ressaltou o ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes.

Em entrevista à Agência Brasil, o ministro disse que não basta ao governo federal disponibilizar terras para reforma agrária se não der condições aos pequenos produtores de se auto-sustentarem. "Reforma agrária para nós não é só assentar uma pessoa e abandoná-la por lá, como acontecia no passado recente no Brasil. Reforma agrária importa em crédito, e nós multiplicamos por três o volume do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), reforma agrária importa em assistência técnica, e nós demos assistência técnica a 300 mil famílias pela primeira vez na história brasileira no ano passado, e importa também em uma estrutura de apoio e comercialização", defendeu.

Ciro Gomes afirmou que o projeto de integração do rio São Francisco, além de levar água para o Semi-Árido Nordestino, vai cumprir a meta de promover o desenvolvimento sustentável na região. "Além de água, [os moradores] vão ter terra, mas têm também alternativas de produção. Porque simultaneamente está se implantando o programa do biodiesel que é uma alternativa de plantar mamona – uma planta muito própria para o Semi-Árido, com garantia de compra pela Petrobrás", revelou.

Na opinião do ministro, a desapropriação de terras para reforma agrária na região do São Francisco comprova a importância da região nos projetos considerados prioritários para o governo federal. "Hoje, salvo as grandes regiões metropolitanas onde há uma miséria muito sofrida, se poderia dizer que a miséria no Brasil tem endereço, e esse endereço se concentra no Semi-Árido Nordestino e no interior da Amazônia. Por isso, as prioridades para essas regiões", enfatizou.

A primeira parte do projeto de integração do rio São Francisco prevê a construção de dois canais: o Norte, com 402 quilômetros de extensão, e o Leste, com 220 quilômetros. Com 70% das águas do Nordeste, o rio São Francisco tem quase 3000 quilômetros de extensão e drena uma área de 641 mil quilômetros quadrados, constituindo uma bacia hidrográfica, onde estão 504 municípios dos estados da Bahia, Minas Gerais, Goiás, Pernambuco, Sergipe, Alagoas e o Distrito Federal.

Na área diretamente afetada pela obra, a 10 quilômetros dos canais, existem cerca de 700 famílias que poderão passar por um processo de desapropriação de terras. O cadastramento dessas famílias já começou. O governo dispõe, para 2005, de R$ 70 milhões para a compra dos terrenos e reassentamento dos moradores.

Ibama faz audiência sobre licenciamento ambiental do projeto de integração do São Francisco

O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) realiza hoje, em Natal, a segunda audiência pública do processo de licenciamento ambiental do Projeto de Integração da Bacia do São Francisco às Bacias Hidrográficas do Nordeste Setentrional. A expectativa é que participem da audiência representantes de sindicatos, associações de profissionais e de organizações não-governamentais, prefeitos, representantes do governo estadual e da Assembléia Legislativa, de empresas de consultoria e do ministério público, professores universitários, além de cidadãos interessados no tema.

De acordo com o coordenador-geral de Licenciamento Ambiental do Ibama, Luiz Felipe Kunz, um dos maiores conflitos que podem ser apontados na audiência é o que diz respeito à criação de camarões. Entidades ambientalistas se queixam de que a carcinicultura, nos últimos anos, ocupou áreas de mangue e reduziu o potencial pesqueiro em algumas regiões.

“Como uma das finalidades do projeto seria justamente potencializar a cultura do camarão, acredito que haverá entidades se posicionando contrariamente ao projeto”, afirmou Kunz. Ele disse acreditar, no entanto, que o resultado será praticamente favorável ao projeto pelo fato das bacias afetadas pela integração no Rio Grande do Norte serem receptoras (do rio Apodi e Piranhas-Açu). Essa última atravessa também a Paraíba.

Kunz explica que as audiências públicas servem justamente para que a comunidade local aponte impactos ambientais e econômicos que possam ficar de fora do processo de licenciamento. Quem vive na região, disse ele, conhece tudo. “Os técnicos podem não enxergar determinados problemas. É normal, por exemplo, que se dê a licença prévia desde que o empreendedor modifique alguns pontos que são justamente aqueles apontados por participantes das audiências e comprovados posteriormente pelos técnicos na vistoria que se faz posteriormente”, explicou.

Para o gerente-executivo do Ibama no Rio Grande do Norte, Sólon Fagundes, a audiência em Natal certamente trará como contribuições posições polarizadas, como a da Secretaria de Recursos Hídricos do estado, que argumenta que há déficit hídrico no Piranhas-Açu e a do professor da Universidade Federal do RN (UFRN), João Abner. Para Abner, há oferta suficiente de água e até mesmo desperdício em alguns pontos das bacias no estado.

Fagundes defende que o debate em torno da integração seja centrado no âmbito da segurança hídrica, ou seja, da garantia de limites satisfatórios nos reservatórios situados no semi-árido. “Acredito que deve-se levar em conta o impacto social de uma obra desse porte. Além disso, há outro cálculo a ser feito: talvez esteja amortizado com o investimento o que o governo gasta para minimizar os efeitos da seca nas áreas que receberão água do São Francisco”, observou.

Marina descarta pressão para licenciamento ambiental do projeto de integração do S. Francisco

Para que o projeto de Integração do São Francisco saia do papel, deve passar por todas as etapas de audiências pública estipuladas pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), ter seu Estudo de Impacto Ambiental (EIA) aprovado e a licença prévia concedida para o início de licitação das obras.

A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, disse que no cronograma de licenciamento ambiental não há pressão ou atitude do seu ministério, ou do Ibama, para que se tenha um licenciamento "a toque de caixa". A ministra presidiu hoje a reunião extraordinária do Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH), onde foi aprovado parecer da Agência Nacional de Águas (ANA) sobre a capacidade hídrica do Rio são Francisco.

"Não há pressão para um licenciamento a toque de caixa em fevereiro ou qualquer data que não signifique resolver adequadamente todas as questões que devam ser resolvidas no âmbito do licenciamento ambiental", afirmou Marina Silva.

A ministra acrescentou que o processo de audiências públicas, iniciado no fim de semana, é complexo e que não "há insinuação de atropelamento do que deva ser tecnicamente observado".

No fim de semana, Fortaleza sediou durante cerca de seis horas a primeira audiência pública do projeto. De acordo com João Urbano Cagnin, diretor técnico do Ministério da Integração Nacional, as maiores preocupações dos participantes da audiência foram quanto ao local por onde a água passará, o custo dessa água e a questão das desapropriações ao longo do canal.

"São preocupações legítimas e as audiências nos ajudam a levantar estas questões e a dar respostas concretas. Vai haver um programa de ação fundiária, ao longo dos canais, que beneficiará os pequenos produtores rurais de agricultura familiar. Além disso, há um decreto declarando de utilidade pública uma faixa de cinco quilômetros a partir das margens dos canais. O Instituto Brasileiro de Colonização e Reforma Agrária (Incra) já começou a fazer o levantamento na região", contou.

Mais sete audiências estão programadas até o dia 2 de fevereiro, no Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia e Minas Gerais

Projeto de integração foi retomado depois de três anos de paralisação

O projeto de integração do São Francisco foi retomado pelo Ministério da Integração Nacional em 2003, depois de três anos paralisado. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) redefiniu, então, as orientações para reformulação do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e do Relatório de Impacto Ambiental (RIMA). O órgão ambiental recomendou que o ministério refizesse estudos sobre as alternativas tecnológicas e do traçado dos canais de captação, sobre os impactos abaixo dos pontos de captação, e que apontasse os maiores beneficiários.

O Ibama verificou que o Ministério da Integração Nacional havia respondido a todos os itens após ter recebido o novo estudo em julho do ano passado. O edital com o EIA/Rima reformulado foi publicado em setembro e o Ibama marcou a rodada de audiências públicas para dezembro. O processo, no entanto, foi interrompido por duas liminares concedidas pela Justiça, uma pedido da Associação dos Advogados dos Trabalhadores Rurais da Bahia e do Grupo Ambiental da Bahia (Gambá) e a outra a pedido da Associação dos Catadores de Caranguejo do Povoado Saramém, de Sergipe.

A Procuradoria-Geral do Ibama e a Advocacia Geral da União conseguiram suspender a liminar e o Ibama remarcou a rodada de audiências públicas. "É até contraditório, porque as audiências públicas são participativas, fazem parte do processo democrático e sempre foram uma reivindicação de entidades como estas que entraram com a liminar para que não fossem realizadas", observou o o coordenador-geral de Licenciamento Ambiental do Ibama, Luiz Felipe Kunz.

A próxima audiência pública está marcada para quinta-feira (20), em Sousa, na Paraíba. O cronograma segue com audiências em Salgueiro (PE), no dia 22; em Belo Horizonte, no dia 25; em Salvador, no dia 27; em Aracaju, no dia 31; e em Maceió, no dia 2 de fevereiro. A primeira foi realizada em Fortaleza no último dia 15. As entidades que participam das audiências têm prazo de 10 dias depois da última reunião para encaminhar qualquer documentação que considerem relevante para constar no documento do processo de licenciamento. Depois, técnicos do Ibama fazem nova vistoria nos canais de captação para verificar informações apontadas nas audiências e, aí sim, o órgão ambiental fecha o parecer.

O Ibama pode dar um parecer contrário ao projeto, totalmente favorável ou favorável desde que o empreendedor promova modificações. Se favorável, o projeto recebe uma licença prévia e o Ministério da Integração terá que apresentar o projeto executivo – que é o projeto de engenharia da obra – e o programa básico ambiental, que reúne todos os programas e projetos para minimizar os impactos causados pela obra. Se aprovados os dois documentos, o Ibama emite a licença de instalação, que permite o início das obras. O empreendimento prevê a construção de dois canais. O chamado Eixo Leste levará água para o sertão de Pernambuco e Paraíba e o Eixo Norte para os estados do Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte. As bacias beneficiadas serão a do Jaguaribe (CE), Paraíba (PB), Moxotó (PE), Brígida (PE), além do Apodi e Piranhas-açu.

Movimentos sociais vão questionar decisão sobre Rio São Francisco na justiça

A decisão do Conselho Nacional de Recursos Hídricos, que avalia como "suficiente" a capacidade hídrica do Rio São Francisco para o projeto de integração das bacias, será questionada na justiça pela Frente Nacional em Defesa do Rio São Francisco.

"Para nós, o fato do governo ter 51% dos votos não transforma isso numa expressão de democracia. O que nós esperamos é que os interesses da população sejam atendidos. E não é um projeto anti-econômico que vai atender essas necessidades", argumenta Marco Amigo, da Frente Nacional, que é contra o projeto de integração.

A entidade alega que haveria duas ilegalidades no processo de julgamento do parecer da Agência Nacional das Águas (ANA) que considera a existência de capacidade hídrica suficiente para o projeto de integração: a primeira sobre o regime de urgência, que não teria sido respeitado; a segunda é que o tema deveria passar pelas câmaras técnicas.

Durante a reunião do Conselho, a Câmara Técnica de Outorga e Cobrança do Comitê do Rio São Francisco apresentou argumentos de que o projeto não atendia à população do campo. "Vai atender a boa parte da população urbana, mas aquela que migra é que está mais sujeita aos efeitos da seca", criticou Marcelo Cauás Asfora, coordenador da Câmara Técnica.

Outra crítica de Asfora é que o valor destinado para a obra de integração é maior que o da revitalização do semi-árido nordestino. "Enquanto se tem R$ 1 bilhão, quase que garantidos para a obra de transposição, a infra-estrutura, a ordem de grandeza dos valores investidos na revitalização é de milhões", disse.

Asfora defende, no entanto, que não se deve reprovar, mas, sim, discutir o projeto. "Ele deve ser muito bem discutido, porque esta questão de reprovar como um todo, de fazer torcida de futebol, dizendo se é contra ou a favor, não caberia", disse.

Recursos para obras de integração do São Francisco são suficientes, diz ministro interino

Embora os recursos para a integração da bacia do Rio São Francisco, uma das prioridades do governo este ano, sejam inferiores aos R$ 1,07 bilhão previstos inicialmente, eles são suficientes para garantir a execução das obras neste ano. A garantia foi dada pelo ministro interino da Integração Nacional, Pedro Brito, coordenador-geral do projeto.

O orçamento disponível para 2005 é de R$ 600 milhões. "Como as obras não começaram em janeiro, como inicialmente estava previsto, e deverão começar lá para o final de março, esse adiamento, digamos assim, permite que com R$ 600 milhões se construa tudo aquilo que é possível construir nesse ano", afirmou Brito. "O projeto não será prejudicado, já que o cronograma terá seqüência normal, sem qualquer problema", completou.

O ministro interino disse acreditar que as obras poderão começar em abril, depois que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) conceder uma licença prévia. Antes, serão realizadas oito audiências públicas na região a ser atingida pela integração. A primeira está prevista para o dia 15, em Fortaleza (CE), e as outras serão realizadas até fevereiro.

De acordo com Pedro Brito, a população que vive na região do semi-árido é a grande beneficiada do projeto. Estima-se que cerca de 10 milhões de pessoas serão atendidas. "É uma região bastante inóspita, chove muito pouco ali", lembrou o ministro interino. A idéia, segundo ele, é dar condições para que as pessoas tenham água para beber e produzir economicamente.

Brito explicou que serão construídos dois canais: um em direção ao Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte, e outro a Pernambuco e Paraíba. A água será captada entre as barragens de Sobradinho e Itaparica, em Pernambuco. O ministro interino informou que a parcela de água a ser retirada do rio é muito pequena e não vai prejudicar a população ribeirinha. "Corresponde a cerca de 1% da vazão do rio e isso é tão pouco que os instrumentos de medição da ANA (Agência Nacional de Águas), que é responsável pelo controle dos rios, não são capazes de perceber essa mudança", disse.

Além da integração da bacia do são Francisco, o ministro disse que o governo tem também outros instrumentos para atender à necessidade de água da região, como construção de cisternas, reformas e construção de poços.

Visão Rota Brasil Oeste

A transposição do São Francisco é criticada por muitos especialistas como mais uma obra faraônica sem tanta repercussão social. O formato da transposição é apontado como centralizador de renda e de pouco alcance social.

Segundo o secretário executivo do Movimento Organização Comunitária, organização não-governamental que trabalha no semi-árido, Nadilson Quintela, a transposição é um mito. "É um projeto velho, cheio de politicagem que não promove o uso difuso da água, reproduz uma idéia de crescimento, mas não de desenvolvimento social. Está centrada na grande irrigação e não na agricultura familiar, alimenta a concentração de riquezas", afirma.

Um proposta mais interessante e barata, por exemplo, seria a construção de cisternas de capitação de água da chuva. Uma cisterna, ao custo de R$1.470,00, garante o abastecimento de uma família de cinco pessoas durante 11 meses. Além de estimular a indústria de construção local, esta solução tem alcance maior no sertão e descentraliza a propriedade da água.

Construção de cisternas e adutoras busca soluções para semi-árido do São Francisco

Até hoje, moradores do semi-árido da Bacia do São Francisco vivem a poucos quilômetros do rio e não são abastecidos por ele. Para solucionar esse problema, o governo federal criou programas para a construção de adutoras – canais de abastecimento (Pró-Água Semi-Árido), a cargo do Ministério da Integração Nacional, e para a instalação de um milhão de cisternas – sistema que coleta água da chuva e a armazena em um reservatório – em todo o semi-árido, a cargo do Ministério do Desenvolvimento Social, em parceria com a rede de organizações não-governamentais Articulação no Semi-Árido Brasileiro (ASA).

Estudante e mobilizador social, o baiano Orlando Rosa Araújo peregrinou nos últimos meses por diversas comunidades da bacia do rio São Francisco. Ele conta que as ações do governo já começam a surtir efeito, mas a população ainda enfrenta dificuldades. Orlando se diz contrário ao projeto de integração. Para ele, é preciso primeiro resolver, de forma definitiva, o problema dos moradores da própria bacia.

"Esse povo, eles vivem numa situação… Vegetam, escapam, porque abrem buracos na beira da estrada, essa água vai se juntando durante a chuva e, no período da seca, eles vão se mantendo ali", revela Orlando. "Mas hoje, com o programa de cisternas ou captação de água de chuva, eles se mantêm muito bem, porque grande parte da população já tem cisternas de placa, que é uma alternativa para o semi-árido."

O Ministério das Cidades também tem atuado na bacia do São Francisco com ações de saneamento incluídas no programa de revitalização. De acordo com o diretor de Água e Esgoto do ministério, Clóvis Francisco do Nascimento, até o final do governo Lula, estão previstos investimentos de R$ 600 milhões.

"Essas ações visam dotar os municípios de sistemas de abastecimento de água, esgotamento sanitário e coleta de lixo", explica Nascimento. "O rio São Francisco recebe hoje uma grade quantidade de esgotos in natura, o que acaba acarretando uma situação de poluição."

Impacto ambiental de projeto no São Francisco será avaliado em audiências públicas

O Ministério da Integração Nacional espera que, até o fim deste ano, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) encerre as discussões sobre o Relatório de Impacto ao Meio Ambiente (Rima) do projeto de integração da bacia do rio São Francisco e delibere sobre a concessão de Licença Prévia Ambiental (LPA).

Durante reunião ontem (30) do Conselho Nacional de Recursos Hídricos, estava marcada a votação de um parecer da Agência Nacional de Águas (ANA) que garantia haver água suficiente no São Francisco para o projeto de integração de bacias do Nordeste. Caso o parecer fosse aprovado, o conselho publicaria resolução viabilizando a concessão do uso da água e o licenciamento ambiental para o projeto. Uma liminar, entretanto, da juíza substituta da 16ª Vara da Justiça Federal, do Distrito Federal, Iolete Maria Fialho de Oliveira, determinou que o conselho suspendesse a votação. A Advocacia Geral da União (AGU) recorreu da liminar e o pedido de cassação deve ser julgado a partir de hoje pelo Tribunal Regional Federal (TRF).

O relatório de impacto ao meio ambiente foi entregue ao órgão em julho deste ano. O documento será debatido entre 6 e 20 de dezembro em audiências públicas regionais. Serão nove audiências públicas. Os encontros começam em Salvador (BA) e terminam no dia 20 de dezembro em Salgueiro (PE), passando por Belo Horizonte (MG), Juazeiro (BA), Penedo (AL), Aracaju (SE), Fortaleza (CE), Natal (RN) e Souza (PB).

O levantamento que será discutido nas reuniões mostra impactos positivos da obra como abastecimento da população e desenvolvimento da economia. Apresenta também impactos negativos do empreendimento, entre eles a transferência de fauna, a perda de 430 hectares de vegetação nativa e a redução de 2,4% da energia média gerada pela Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf).

Para o coordenador técnico do projeto de integração, João Urbano Cagnin, o benefício que a obra trará vai compensar esses prejuízos. "É um projeto de baixo impacto, porque ele retira do rio apenas cerca de 3% da água, aproveita toda uma infra-estrutura de açudes e barragens e vai atender populações interiores que não têm fontes hídricas seguras", avalia o coordenador.

Entre as medidas compensatórias para os impactos ambientais negativos está a criação de unidade de conservação com 1 milhão de hectares no bioma caatinga. O governo federal também planeja criar um programa de apoio às comunidades indígenas localizadas nas proximidades das áreas onde os canais serão construídos e a água do São Francisco captada.

Representante dos índios que moram na região do Velho Chico, o líder indígena Ailson dos Santos pede que a integração das bacias seja mais discutida com a população ribeirinha. Ailson faz parte da tribo Truká. Com 4 mil índios, ela será diretamente afetada pelas obras.

"A gente vive da cultura de subsistência que é arroz, milho, feijão e mandioca e o que restou da pesca", conta Santos. "A gente já não tem mais a pesca, mas o pouco que restou a gente ainda consegue pescar para sobreviver. Se essa transposição sair, nós literalmente vamos ser um dos mais afetados porque tá em cima da nossa terra."

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A transposição do São Francisco é criticada por muitos especialistas como mais uma obra faraônica sem tanta repercussão social. O formato da transposição é apontado como centralizador e de pouco alcance social.

Segundo o secretário executivo do Movimento Organização Comunitária, organização não-governamental que trabalha no semi-árido, Nadilson Quintela, a transposição é um mito. "É um projeto velho, cheio de politicagem que não promove o uso difuso da água, reproduz uma idéia de crescimento, mas não de desenvolvimento social. Está centrada na grande irrigação e não na agricultura familiar, alimenta a concentração de riquezas", afirma.

Um proposta mais interessante e barata, por exemplo, seria a construção de cisternas de capitação de água da chuva. Uma cisterna, ao custo de R$1.470,00, garante o abastecimento de uma família de cinco pessoas durante 11 meses. Além de estimular a indústria de construção local, esta solução tem alcance maior no sertão e descentraliza a propriedade da água.