No Ceará, confecção de roupas íntimas femininas muda a vida de jovens

Agência Brasil – A história da cidade de Freicheirinhas poderia começar como os contos de fadas – “era uma vez…” –, por incluir a realização do sonho de uma jovem de 27 anos, Maria da Conceição Furtado. Na cidade de 10 mil habitantes no pé da Serra de Tianguá, a 100 quilômetros de Sobral, até bem pouco tempo só havia duas fontes de renda: a Prefeitura e a decadente indústria de extração de cal, poluidora e pouco rentável.

Com um diploma de auxiliar de enfermagem, Maria da Conceição poderia migrar para o Sul ou para o exterior, como a irmã, que foi para a Espanha. Mas ela encontrou uma saída em sua própria cidade: com um molde feito a partir de um conjunto de roupas íntimas, sutiã e calcinha, comprado em uma loja de Sobral, cortou e confeccionou o que seria o primeiro produto de uma fábrica que hoje emprega 72 funcionários.

Quem conta a história é Antonia Suilany Teixeira Barbosa, consultora do escritório do Sebrae em Tianguá e apaixonada pelo “milagre de Freicheirinhas”. Ela acrescenta: “A Conceição não sabia costurar. Precisou da ajuda de uma costureira que também nunca tinha costurado em tecido elástico. As primeiras peças, portanto não possuíam grande qualidade. Mas ela insistiu. A irmã que mora na Espanha emprestou o dinheiro para comprar a primeira máquina overloque. E a costureira começou a vender primeiro para as colegas do curso de enfermagem em Sobral e depois para lojas de lá.”

Competitividade

A pequena confecção prosperou e logo surgiram outras. Era o momento de investir. Mas onde encontrar um banco que apostasse em meia dúzia de fabriquetas de fundo de quintal no sertão do Ceará? Nesse momento que apareceu na história “a fada madrinha”: o programa Competir.

Nascido do acordo de cooperação entre os governos alemão e brasileiro, o Competir foi desenvolvido a partir de 1996, numa parceria entre o Sebrae, o Senai e a GTZ, a agência alemã de cooperação técnica. O objetivo é ajudar pequenas e micro-empresas da região Nordeste a se tornarem competitivas, aumentando a qualidade e a produtividade tanto no gerenciamento do negócio quanto no próprio processo de produção.

As pequenas confecções de fundo de quintal aprenderam a se profissionalizar, administrando custos, qualificando a mão-de-obra e ampliando os horizontes da comercialização. Muitas saíram do fundo do quintal, como a pioneira Di Pérola, a fábrica da Conceição, que está ampliando suas instalações para saltar de uma produção de 64 mil peças por mês para 100 mil nos próximos três meses.

O gerente de produção, Josean Donato Ferreira, de 23 anos, explica que a fábrica passará a funcionar em um espaço maior, com mais 400 metros quadrados. “E já estamos treinando 30 novos funcionários, que serão contratados para formar o novo turno de trabalho”, acrescenta.

Treinamento

A palavra-chave em Freicheirinhas é treinamento. No pequeno Centro da Associação, seis jovens estão debruçados sobre as máquinas de costura. Em 90 dias, eles estarão aptos a aplicar na linha de produção tudo o que aprenderam no curso de capacitação. Alguns são rapazes que, mesmo num tradicional reduto machista como o sertão nordestino, não se sentem nem um pouco constrangidos em costurar sutiãs e calcinhas.

Afinal, a fabricação de roupas íntimas gera mais de 400 empregos diretos e injeta mensalmente R$ 1,5 milhão na economia da cidade. Se não fosse isso, Freicheirinhas talvez se mantivesse vegetando ao pé da Serra do Tianguá, vendo seus filhos partirem.

Olga Bardawil

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