MOP 3 começa com nova posição brasileira sobre rotulagem de transgênicos e ataques de Requião

A Terceira Reunião das Partes do Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança (MOP 3) começou ontem (13/3) em Curitiba em clima de resistência à expansão dos produtos transgênicos no Brasil e com o fim do suspense em relação à posição brasileira sobre a rotulagem de produtos geneticamente modificados destinados à exportação, a principal polêmica do encontro.

CURITIBA – Enquanto o governador do Paraná, Roberto Requião, centrava seu discurso na abertura do evento em ataques à transnacional Monsanto, uma das maiores produtoras de Organismos Vivos Modificados (OVMs), a Ministra Marina Silva, do Meio Ambiente, anunciava à noite em São Paulo que o governo Lula defenderia na reunião a rotulagem de OVMs com o termo “contém”, ao invés da genérica expressão “pode conter”. Na MOP 2, realizada em 2005, em Montreal, no Canadá, o Brasil se alinhou à Nova Zelândia na defesa desta rotulagem abrangente, impedindo a definição do artigo 18b do Protocolo, que trata da rotulagem de produtos transgênicos exportados.

O dia começara na MOP 3 com a constatação de que a Ministra Marina Silva não assumiria a presidência do encontro, numa manifestação clara de que a titular do Meio Ambiente não aceitaria a posição até então defendida pela maioria dos delegados do governo brasileiro em relação a rotulagem. Enquanto os Ministérios da Agricultura, Ciência e Tecnologia e Desenvolvimento, Indústria e Comércio defendiam uma terminologia genérica, com a expressão "pode conter", o MMA queria um controle mais estrito, com a expressão "contém" obrigatória em todos os produtos transgênicos que cruzam fronteiras. A rotulagem explícita é, inclusive, prevista na legislação nacional para a comercialização interna.

A mudança de posição se deu durante reunião ocorrida em Brasília entre Marina Silva, Roberto Rodrigues, ministro da Agricultura, Dilma Roussef, ministra-cehefe da Casa Civil, e o presidente Lula. No final, chegou-se ao consenso pela rotulagem “contém”, mas desde que os produtores que hoje não realizam o rastreamento na cadeia produtiva possam ter quatro anos para adaptar-se às novas regras. A posição brasileira, que deve ser oficializada na MOP hoje, prevê que os produtores que já realizam a separação de sua produção transgênica deverão rotular “contém”assim que o Protocolo definir a questão.

A nova posição brasileira leva a um suposto consenso que não exporia as fissuras internas do governo Lula aos demais membros do Protocolo. O Brasil parece viver, no momento em que recebe o maior evento de políticas ambientais do planeta desde a Rio 92, uma crise de identidade: não sabe se permanece ao lado dos países megadiversos, como nos embates da COP de proteção à biodiversidade e remuneração dos países cujos territórios abrigam o grosso dos recursos naturais do planeta, ou se migra de vez para o bloco dos países exportadores de grãos.

A nova posição, contudo, foi classificada por especialistas de organizações ambientais como "uma emenda pior do que o soneto". O Greenpeace classificou como injustificável o prazo de 4 anos para a adaptação a rotulagem estrita.

O advogado do ISA, Fernando Mathias, avalia que a nova posição brasileira cria uma insegurança em relação a quais cultivos estariam sob a regra do "contém" e quais sob a regra de transição do "pode conter". "Há divergência por exemplo em relação a soja: a importação do grão estaria sob a regra do contém ou do pode conter? O Greenpeace, por exemplo, acha que a importação estaria sob o contém. Já o Ministério da Agricultura e Pecuária interpreta que a importação estaria sob o “pode conter”, porque a legislação de rotulagem não se aplica a importação de cargas de commodities, mas apenas ao produto final nas prateleiras do mercado interno."

A expectativa nos corredores da MOP, contudo, é que até sexta-feira os países enfim cheguem a um consenso para acabar com o principal impasse do tratado sobre Biossegurança.

De acordo com Rubens Nodari do Ministério do Meio Ambiente, que integra a delegação brasileira na MOP, a decisão do Brasil pelo "contém" certamente influenciará a de outros países também. "O prazo de 4 anos para que todos se adaptem às novas regras foi uma forma de acabar com o impasse entre os ministérios. Isso significa que agora, todos terão de seguir o mesmo rumo", avalia.

A ministra Marina Silva em entrevista ontem à noite em São Paulo foi enfática ao dizer que a decisão pelo “contém” já estava valendo e que o prazo de 4 anos era cumulativo.

Requião faz duras críticas

Muitos delegados envolvidos na polêmica entre os termos “contém” e “pode conter”, se surpreenderam com o discurso direto feito na abertura do evento pelo governador do Paraná. Roberto Requião destacou a política do estado de não permitir a produção, a comercialização e a exportação de produtos transgênicos. E criticou duramente os países que aceitam as pressões das grandes empresas de biotecnologia. "Paraná é o único estado livre de transgênicos não porque sejamos intransigentes, mas porque prezamos nossa autonomia, nossa soberania e a biossegurança em nossas plantações". O governador não poupou o governo federal, que não apoiaria o estado na luta contra os OVMs. "Há uma pressão enorme para federalizar o Porto de Paranaguá, onde atualmente executamos um controle rígido para vetar a entrada de cargas transgênicas", denunciou o governador. Requião também disse que o governo paranaense quer disseminar as informações sobre os riscos dos OVMs para dificultar que a produção de soja transgênica prospere no País.

O primeiro dia da MOP 3 ainda foi marcado por protestos de membros das organizações Via Campesina, Movimentos dos Sem-Terra (MST) e Movimentos dos Atingidos por Barragem (MAB), que não puderam entrar no espaço onde a reunião está sendo realizada. A ausência de representantes de movimentos sociais e da sociedade civil em Curitiba, por sinal, destoou da reunião anterior, MOP 1, realizada na Malásia, em 2004, quando os representantes de povos indígenas e populações locais tiveram entrada livre no evento.

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