Sem arrozeiros, índios vizinhos à Raposa Serra do Sol dizem viver em paz

No meio da tarde, o wapichana Manduca Tavares, 46 anos, colhe melancias na roça da Comunidade do Milho, na Terra Indígena São Marcos, área de 111 mil hectares vizinha à Raposa Serra do Sol – em que a Polícia Federal (PF) pode deflagrar a qualquer momento uma ofensiva para a retirada de arrozeiros e não-índios, como manda o decreto de homologação de 2005.

“Desenvolvemos nossa área com nossa própria produção. Não precisamos de arrozeiro”, resume o anfitrião, que é vice-coordenador da Associação dos Povos da Terra Indígena São Marcos

A lista de produtos inclui ainda mandioca e banana, vendidos nas cidades, assim como carne bovina e suína. “Comemos arroz porque compramos”, ressaltou, ao revelar o apoio da Fundação Nacional do Índio (Funai) e o recebimento de recursos do Programa Nacional de Agricultura Familiar (Pronaf) pelas famílias para investir no cultivo próprio.

Na bem-estruturada vila da comunidade – com escola, telefone, igreja e antena parabólica – Maria Elza Tavares, mulher de Manduca, garante ser “um bom lugar para criar os filhos, tranqüilo e sem perturbação”. A conversa com o marido dela se aprofunda em uma sombra que alivia o calor de Roraima, sob olhar atento de jovens, mulheres e crianças dali. Um gole d’água e Manduca diz o que pensa sobre o iminente confronto na área vizinha, que tem 1,7 milhão de hectares: “Eles [arrozeiros] são invasores. Não são de Roraima, não têm 20 anos aqui e vieram usufruir sem dar porcentagem para a população”.

A divisão dos indígenas da Raposa Serra do Sol entre o apoio e o repúdio aos arrozeiros seria, conforme Manduca, reflexo da ocupação da área por não-índios: “A gente vive integrado, mas quando alguém coloca na cabeça dos parentes promessa de ajuda…”. Uma pausa e a reflexão continua: “Os parentes apoiam [arrozeiros] sem ter conhecimento. São poucos índios que trabalham com eles”.

A presença do arrozeiros na região poderia ser até admitida, argumentou Manduca, mas diante de um novo tipo de relacionamento com as comunidades tradicionais: “Podem voltar como parceiros e não invasores. E precisam dar maior assistência”.

Para ele, o fato de os índios da área já adotarem costumes típicos de quem vive nas cidades não significa que possam viver no mesmo espaço que os brancos. A explicação vem com uma metáfora:

“Um homem tinha um tamanduá e passou cinco anos dando leite para ele beber. Mas o tamanduá não virou bezerro nem vaca”, disse. “Podemos usar sapatos e calças bonitas, pegar um avião para ir em Brasília, mas vamos morrer índios”, acrescentou.

O caminho de volta a Boa Vista inclui uma travessia de balsa sobre o rio Uraricoera. Apesar de não ser o foco do iminente confronto entre a PF e os não-índios da região, a Terra Indígena São Marcos – que engloba 39 comunidades – já foi prejudicada com a destruição de duas pontes em estradas que dão acesso à Raposa Serra do Sol.

Terra Indígena Raposa Serra do Sol: retirada dos invasores deve continuar

"O governo federal deu início, finalmente, ao processo de retirada definitiva dos invasores da terra indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, através da Operação Upatakon 3, da Polícia Federal.

Esta terra foi declarada como tradicionalmente ocupada pelos índios em 1998, através da Portaria MJ 820/98 e homologada pelo presidente Luis Inácio Lula da Silva, em abril de 2005. Desde então, todos os ocupantes não-índios deveriam ter deixado aquela área.

O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), desde 2005, vem viabilizando a saída de dezenas de famílias, pequenos e médios ocupantes de boa fé, oferecendo áreas alternativas para cultivo em Roraima, com indenização por benfeitorias, créditos e apoio técnico para sua realocação e continuidade na produção, na própria região rural do estado.

Ocorre que um pequeno grupo de invasores, estes de má fé, cinco plantadores de arroz comandados por Paulo César Quartiero, nunca aceitou deixar a área. São de má fé desde o início, pois entraram na região, invadindo grandes extensões de terra, quando esta já estava em procedimento demarcatório como terra indígena. O governo federal chegou, recentemente, a oferecer a transferência de terras da União ao governo de Roraima, para que este procedesse a realocação que melhor conviesse aos arrozeiros, mas estes não aceitaram a negociação, desejando permanecer invadindo a terra indígena, como tal, também propriedade da União.

Os arrozeiros e seu líder ignoram a Constituição Federal, ignoram as leis, ignoram a demarcação e a homologação da terra indígena; ignoram todas as decisões que não lhes interessam, seja da presidência da República, seja do Supremo Tribunal Federal; ignoraram a Funai e os prazos dados por esta para sua saída da Raposa Serra do Sol; ignoram a Polícia Federal em Roraima.

Quando da homologação, em 2005, os arrozeiros criaram um bando para-militar, composto por jagunços armados, que aterrorizaram as comunidades indígenas; queimaram pontes, casas, salas de aula, equipamentos e carros; espancaram professores e alunos; ameaçaram de morte religiosos, comunidades inteiras e lideranças indígenas; destruíram patrimônio dos indígenas; seqüestraram funcionários públicos e seguiram impunes. Nos últimos anos, muitos indígenas foram espancados e ameaçados de morte pela quadrilha armada e financiada pelos arrozeiros, sem que ninguém fosse punido.

Paulo César Quartiero tem um tom racista e fascista em suas declarações públicas. Quando da homologação, chegou a pregar a “resistência armada” contra o governo Lula, em programas da Rádio Equatorial, de Boa Vista, aliás fundada pelo ex-membro do Comando de Caça aos Comunistas (CCC), ex-deputado federal, já falecido, Moisés Lipnick. Este, aliás, por sua vez, foi ligado também à União Democrática Ruralista (UDR) e a seus líderes, mentores do famoso “Caso Lubeca” uma farsa eleitoral que contribuiu para inviabilizar a eleição para presidente da República de Lula, em 1989.

Paulo César Quartiero afirma que quer se articular com as Forças Armadas, para que elas “coloquem ordem em Roraima”, acusando a Polícia Federal de “incompetente”. Em declarações recentes disse, com orgulho, que comprou 8.000 estacas de madeira para ampliar sua invasão na terra indígena Raposa Serra do Sol.

Depois de detido pela Polícia Federal na última segunda-feira, dia 31 de março, acusado de quatro crimes, entre estes o de “estimular a desordem pública” e “desacato à autoridade”, foi solto sob fiança e, em liberdade, atacou a Polícia Federal e afirmou que vai continuar convocando a “resistência” contra o governo federal, dentro da área indígena.

Agora, o governador de Roraima, José Anchieta Junior, e políticos locais, afirmam que irão exigir do ministro da Justiça o fim da Operação Upatakon 3. O líder arrozeiro não faz por menos e afirma ao jornal “Folha de Boa Vista”, em 2 de abril, que “tudo deve voltar à estaca zero”, com relação à demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol, ou seja, exige simplesmente a sua anulação.

O Cimi vem a público exigir do governo federal a continuidade da Operação Upatakon 3, até a retirada completa desses invasores de má fé e, pior, criminosos e com concepções racistas e práticas terroristas, da terra indígena Raposa Serra do Sol. Tais pessoas sempre colocaram – e agora colocam mais ainda – em sério risco de vida as comunidades e lideranças indígenas, além de todos aqueles que prestam serviços àquelas comunidades.

A permanência dos arrozeiros e demais invasores na terra indígena Raposa Serra do Sol, além de ilegal, é uma afronta aos poderes legalmente constituídos, é uma agressão à democracia e aos direitos humanos e se constitui como um palco para demonstrações de apego ao fascismo, que não possui, há muito tempo, espaço no Estado de Direito, felizmente reconquistado pela sociedade brasileira."

Brasília, 02 de abril de 2008
Cimi – Conselho Indigenista Missionário

Líder indígena em Raposa Serra do Sol denuncia à PF atentados a bomba

O tuxaua Moacildo da Silva Santos, equivalente a um cacique, da comunidade do Barro, localizada dentro da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, nas proximidades do distrito de Surumu, denunciou hoje (2) à Polícia Federal atentados contra sua vida e contra a estrutura física da escola que atende os índios.

Santos disse ter sido atingido por uma bomba caseira jogada na porta de sua casa por um motoqueiro. “A bomba me atingiu, desmaiei lá dentro e fui acordar já na nossa casa de apoio”, afirmou o tuxaua, que teve ferimentos nos braços e pernas. Em entrevista à Agência Brasil, ele creditou o ataque a “pistoleiros do Paulo César [Quartiero, líder dos arrozeiros]”.

O líder indígena ressaltou que sua comunidade não trabalha com os arrozeiros, por preferir investir nas roças próprias: "Plantamos mandioca, jerimum, milho, melancia e feijão. Nós temos nossa comida e não precisamos de arrozeiro.”

E prometeu que se a Polícia Federal não retirar os arrozeiros da área, os índios irão para o combate: “Nós mesmos vamos fazer.”

O tuxaua esteve na delegacia acompanhado pela advogada Joênia Carvalho, do Conselho Indígena de Roraima (CIR). Ela relatou ter sido este o primeiro depoimento de índios da comunidade sobre ataques que se iniciaram há alguns dias. Um deles teria atingido a Escola Padre José de Anchieta, onde as aulas foram interrompidas nesta semana.

“A escola foi invadida, ocupada, teve portas arrombadas, conforme os depoentes, por moradores de Boa Vista levados por Paulo César Quartiero e pelo deputado federal Márcio Junqueira [DEM-RR]. Cadeiras, armários e merenda escolar foram furtados”, descreveu a advogada.

A destruição de pontes com dinamite e motosserras, promovida por manifestantes contrários à homologação da áreas, acrescentou, ainda prejudica o deslocamento de doentes. A Polícia Federal se comprometeu a investigar a autoria dos ataques à comnidade.

Hoje, a reportagem tentou contato com Paulo César Quartiero para que ele respondesse às denúncias dos índios, mas o arrozeiro estava com o telefone celular desligado. O filho dele, Renato Quartiero, de 23 anos, está internado em um hospital de Boa Vista, também por ter sido atingido por uma bomba na segunda-feira (31). Renato foi ferido na mão esquerda, nos braços e no tórax, quando participava de um protesto contra a homologação da terra indígena.

A Polícia Federal negou ter arremessado a bomba contra os manifestantes.

Arrozeiro é preso por cometer atentados contra comunidades indígenas

O arrozeiro Paulo César Quartieiro acaba de ser preso pela Polícia Federal, no município de Surumu, em Roraima, na região conhecida como Raposa Serra do Sol. No local, um grupo de aproximadamente cem pessoas interditou a ponte de acesso à região com carros, tratores e pneus. Houve conflito com a Polícia Federal e, na explosão de uma bomba, Renato Quartieiro, o filho do arrozeiro, ficou ferido.

Na noite de ontem (30), empregados de Quatieiro e moradores não indígenas – invasores da terra indígena de Raposa Serra do Sol – interditaram a BR-174, nas proximidades da ponte do rio Cauamé, que liga o município de Sumuru a Boa Vista. Segundo o Conselho Indígena de Roraima (CIR), a ação foi provocada após a confirmação de que seria dado início à operação de desintrusão dos não índios da área.

Na quarta-feira passada (26), lideranças indígenas se reuniram com representantes de órgãos envolvidos na operação de desintrusão da terra indígena (Ibama, Agência Nacional de Águas, Funai, Polícia Federal, Advocacia Geral da União e Incra), quando foram informadas do início da retirada dos não índios da terra indígena Raposa Serra do Sol.

Na noite deste mesmo dia, um grupo de empregados de Quartieiro, conhecidos como "motoqueiros", colocaram fogo na maloca da comunidade indígena que vive em Surumu. O fogo foi controlado pelos próprios indígenas antes que se alastrasse. As lideranças temem que novas ações violentas sejam efetuadas contra as comunidades.

As provocações contra as comunidades indígenas tiveram início na terça-feira passada, 25 de março, quando o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), julgou o processo de Paulo César Quartiero assegurando seu retorno ao cargo de prefeito do município de Pacaraima, em Roraima. O mandato de Quartieiro havia sido cassado pelo Tribunal Regional Eleitoral de Roraima, em 2006.

A sede de Pacaraima está localizada na terra indígena São Marcos e tem abrangência até a terra indígena Raposa Serra do Sol. Segundo a coordenação do CIR, Quartieiro vem utilizado o mandato de prefeito para interferir na organização social das comunidades de indígenas.

Na noite do dia 25, empregados  do arrozeiro juntaram-se a moradores não índios que ainda permanecem na comunidade de Barro, na região de Surumu, para comemorar o retorno de Quartieiro à Prefeitura de Pacaraima.

Após várias manifestações regadas a bebidas alcoólicas, eles resolveram sair em passeata pelas ruas que atravessam a comunidade indígena. Lançaram foguetes em direção às casas de palhas dos indígenas e ameaçam a comunidade. Ficaram lá até às 3h da madrugada e informaram que voltaria na noite seguinte para tocar fogo em quatro casas.

A coordenação do CIR registrou a ocorrência destes crimes praticados contra as comunidades indígenas na superintendência do departamento da Polícia Federal em Roraima.

Outro fato noticiado pela imprensa também tem causado preocupação às lideranças indígenas. É a participação do deputado federal Márcio Junqueira (PFL/RR) em atividades contrárias à retirada dos invasores da terra indígena Raposa Serra do Sol, incitando os invasores a resistirem à ação do poder público federal. Sobre este aspecto, o assessor jurídico do Cimi (Conselho Indigenista Missionário), Paulo Machado Guimarães, destaca a necessidade do Conselho de Ética da Câmara dos Deputados apurar estas notícias, “tendo em vista o risco de caracterização de conduta atentatória ao decoro parlamentar”.

Raposa Serra do Sol precisa ser desocupada

Os ministros da Justiça, Tarso Genro, e da Defesa, Nelson Jobim, discutiram nesta segunda-feira (29), em Brasília, ações para solucionar o impasse sobre a desocupação de não-índios da reserva indígena Raposa Serra do Sol, no norte de Roraima. Há quase cinco meses, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu retirar agricultores da área e manter o decreto presidencial que garante 1,74 milhão de hectares para os 18 mil índios da região.

De acordo com o ministro Tarso Genro, a área reservada aos índios já foi devidamente demarcada, mas ainda serão necessárias providências para desocupar as áreas sem causar conflitos com a população não-indígena. “A avaliação do Ministério da Justiça é de que a decisão [do STF] precisa ser rigorosamente cumprida. É preciso agir de forma mais tranqüila para que se minimizem os conflitos diretos”, disse.

Tarso garantiu que não houve pedido de auxílio das Forças Armadas e também não estabeleceu prazos para a liberação das terras. “Trouxe algumas questões ambientais para o ministro Jobim avaliar. Esse assunto tem importância econômica e repercussão política internacional”, disse o ministro sem entrar em detalhes.

O ministro Nelson Jobim não conversou com os jornalistas após a reunião com Tarso Genro.

Estima-se que ainda existam sete produtores de arroz na área indígena. O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) ofereceu uma área de 24 mil hectares para assentar os agricultores, mas ainda há resistência.

Vivem na reserva cerca de 14 mil índios das etnias Macuxi, Wapixana, Ingarikó, Taurepang e Patamona. 

Agricultores têm de deixar terra indígena em Roraima, diz STF

Os cerca de 14 mil índios das etnias Macuxi, Wapixana, Ingarikó, Taurepang e Patamona, habitantes da reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima, não terão mais que conviver com agricultores e pecuaristas. O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu hoje (4) manter a homologação da reserva de 1,7 milhão de hectare e garantir a desocupação de não-índios. A homologação do território foi regulamentada por meio de decreto presidencial em 2005. A sentença do STF foi unânime.

Durante o julgamento, o relator do mandado de segurança da Itikawa Indústria e Comércio contestando o decreto, ministro Carlos Ayres Britto, afastou a argumentação de que somente o Congresso Nacional teria poderes para homologação de terras indígenas. Britto lembrou que o Estatuto do Índio confere esses poderes ao presidente da República e, portanto, reconheceu a legalidade da reserva Raposa Serra do Sol. Os demais ministros acompanharam o voto do relator.

A advogada da Advogacia-Geral da União (AGU), Gracie Maria Fernandes, explicou que com a decisão, a Fundação Nacional do Índio (Funai) poderá prosseguir na proteção do território e atuar na expulsão e expropriação de não-índios da reserva. Entre eles, rizicultores e criadores de gado.

“O que STF fez foi reconhecer a legitimidade de toda atuação da administração pública com relação ao procedimento demarcatório e com relação ao decreto do presidente. Com isso, permite que os trabalhos de remoção da Funai tenham continuidade”.

Fernandes informou que no processo de expropriação, as benfeitorias consideradas de boa fé, ou seja, que não desrespeitam normas de proteção ao meio ambiente ou trabalho, por exemplo, serão indenizadas.

O advogado dos agropecuaristas Luiz Valdemar Albrecht reconheceu que, no momento, o grupo está “descoberto” e precisará de uma nova liminar para não ser expulso imediatamente da área. E destacou a importância da produção de arroz para região que abastece o estado de Roraima e a cidade de Manaus (AM). “Os produtores estão estabelecidos na região há muitos anos. Na região aprimoraram e ampliaram as atividades. Ao ter que sair, quem vai substituí-los?”, questionou.

A conciliação entre indígenas e rizicultores seria impossível na avaliação de Albrecht. O advogado acredita que organizações internacionais pressionam os índios para usufruírem da biodiversidade amazônica. “Hoje há uma infiltração de ONGs estrangeiras fazendo biopirataria de todo tipo. Como o indígena é tutelado, não tem vontade própria, não é ele que administração a terra”.

Terêncio Salamão, da etnia Wapixana, acredita que a decisão do STF sinaliza um fim de disputas de terras na região. “Durante 30 anos lutamos para que estas sejam áreas de comunidades indígenas. Uma luta muito difícil, onde muitos dos nosso sofreram com a morte e as ameaças de rizicultores”, afirmou.

Durante o julgamento, o ministro Carlos Ayres Britto também descartou a hipótese de violação de direitos aos agropecuaristas, que afirmavam não terem sido ouvidos no processo que culminou na demarcação da reserva.

A decisão do Supremo não é definitiva dependendo do julgamento do mérito da ação.

O território Raposa Serra do Sol  fica ao norte do estado de Roraima na fronteira com a Guiana e a Venezuela. É habitado por cinco etnias com cerca de 150 comunidades. A homologação de terras indígenas é a última etapa de um processo que se iniciou com estudos de identificação e delimitação do território.

Agentes denunciaram ameaças de tartarugueiros um dia antes do atentado em Roraima

Manaus – Agentes ambientais voluntários que atuam no rio Jauaperi, em Barcelos (AM), estiveram na última segunda-feira na sede da superintendência regional do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), em Manaus, denunciando tentativas de agressão e ameaças por partes de caçadores ilegais de tartarugas. A visita aconteceu um dia antes do atentado contra uma equipe a serviço do Ibama em Caracaraí (RR), que causou a morte do colaborador José Santos Cruz. O local da emboscada, no baixo rio Branco, fica próximo ao rio Jauapery, na divisa entre os dois estados.

“Dois líderes comunitários vieram conversar comigo e relataram o risco de que os tartarugueiros (traficantes de tartarugas) reagissem às tentativas de fiscalização”, revelou hoje (17) à Radiobrás o chefe de Fiscalização do Ibama no Amazonas, Adilson Cordeiro. “Estávamos preparando uma ação para atender às denúncias, mas os fatos se precipitaram e a coisa saiu do plano estadual”, completou.

O superintendente do Ibama no Amazonas, Henrique Pereira, confirmou que aguarda orientações da direção nacional do órgão. “Já nos colocamos à disposição para atuar na região da fronteira com Roraima, com apoio da Polícia Federal”, contou. Tanto ele quanto Cordeiro ponderaram que a divulgação de detalhes dessa operação, como a data de início e a quatidade de agentes, poderia atrapalhar o sucesso dela.

A carne de tartaruga é uma iguaria muito apreciada na Amazônia, mas o animal (que costuma ser vendido vivo) só pode ser comercializado se for proveniente de cativeiro autorizado pelo Ibama. O Amazonas tem 57 criadouros de quelônio legalizados. Cada tartaruga deve ser identificada com um selo individual, colocado no seu casco.

“Pedimos à população que não compre animais de origem duvidosa. Com isso, as pessoas  ajudarão a combater a captura da tartaruga amazônica, que está em risco de extinção”, apelou Cordeiro, lembrando que o comércio ilegal de quelônios está também ligado à violência rural. “A população pode ajudar não comprando e denunciando. Até porque esses animais ilegais são caros (custam entre R$ 300 a R$ 1000, de acordo com o tamanho e a época), grande parte da população não tem mesmo acesso a eles”.

Cordeiro informou ainda que a multa por cada quelônio capturado ilegalmente é de R$ 500. O infrator está sujeito também a um processo penal, que a princípio pode levar à sua prisão, embora na prática isso raramente aconteça. O telefone do disque denúncia do Ibama no Amazonas é: (92) 3613-3081.

Confirmada a morte de prestador de serviços contrado pelo Ibama

Manaus – O prestador de serviços do Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis (Ibama), José Santos Cruz, que foi vítima de um atentado na
última
terça-feira, foi encontrado morto. Seu corpo foi localizado
nas águas do baixo rio Branco, no município de Caracaraí (RR). A
informação foi confirmada hoje (17) pelo plantonista da Companhia de
Busca e Salvamento do Corpo de Bombeiros Militar de Roraima, que se
identificou como tentente Jerner. Cruz trabalhava na identificação dos
locais de desova de tartarugas, a serviço do Ibama.

Desde
ontem a Polícia Federal está no local da emboscada, que é isolado e de
difícil comunicação. Para ir da capital de Boa Vista o hotel de selva
Ecotur, que está servindo de base para a operação, são cerca de 45
minutos de vôo. De lá até a região do conflito, gasta-se mais quatro
horas de viagem em voadeira (canoa motorizada).

“Não posso
informar quantos policiais são, nem qual o delegado responsável pela
investigação. Por enquanto, não há pistas dos assassinos. O que se sabe
é que o ataque provavelmente aconteceu em represália à fiscalização da
caça ilegal de quelônios”, declarou o responsável pela comunicação da
Superintendência da Polícia Federal, José Giovanni Maia Negreiros.

José
Santos Cruz fazia parte da equipe de sete pessoas que estava em
Caracaraí para marcar as covas de tartarugas do tabuleiro (local de reprodução dos quelônios) de Santa Fé. Na
terça-feira, por volta das 17h00 (horário local), cinco integrantes do
grupo foram baleados por quatro homens, que seriam tartarugueiros
(traficantes de tartarugas). O atentado ocorreu
quando eles estavam dentro da canoa, em direção à praia.

Das
cinco vítimas, quatro pularam na água e conseguiram sobreviver apenas
com ferimentos leves. Uma delas, o analista ambiental Raimundo Cruz,
ficou oficialmente desaparecida até ontem, quando o Ibama confirmou sua
localização. José Santos Cruz morava em Caracaraí e havia sido
contratado temporariamente pelo Ibama. Ele recebeu um tiro à queima
roupa e caiu na canoa, que foi roubada peos agressores.

Local de ameaças de tartarugueiros, Rio Jauapery poderia se transformar em reserva extrativista

Brasília – Desde 2002 o Conselho Nacional de Populações Tradicionais (CNPT) do Ibama estuda a criação de uma reserva extrativista no Rio Jauapery, que englobaria também a margem esquerda do baixo Rio Branco, no Amazonas. O coordenador do CNPT no Amazonas, Leonardo Pacheco, revelou que esse processo está sendo coordenado em parceria com o CNPT de Roraima e que os trabalhos avançaram bastante no último ano.

A discussão poderia ser uma das alternativas para ajuda no combate às ameças dos tartarugueiros que caçam ilegalmente o animal na região. Nesta semana, uma equipe a serviço do Ibama em Caracaraí, em Roraima, que causou a morte do colaborador José Santos Cruz. O local da emboscada, no baixo rio Branco, fica próximo ao Rio Jauapery, na divisa entre os dois estados. O Rio Jauapery também teve ameaças a agentes ambientais voluntários que buscam proteger as tartarugas.

Os agentes ambientais voluntários são lideranças comunitárias treinadas pelo Ibama. Eles realizam atividades de educação ambiental e monitoramento de crimes contra o meio ambiente. Podem, inclusive, lavrar autos de constatação, que servem como pontos de partida para atuação dos fiscais do Ibama. Na região do Rio Jauaperi atuam 11 desses agentes – ao todo, o Amazonas já formou 1.269 deles, consagrando-se como estado líder no Programa Nacional de Agentes Ambientais Voluntários, criado em maio do ano passado.

A carne de tartaruga é uma iguaria muito apreciada na Amazônia, mas o animal (que costuma ser vendido vivo) só pode ser comercializado se for proveniente de cativeiro autorizado pelo Ibama. O Amazonas tem 57 criadouros de quelônio legalizados. Cada tartaruga deve ser identificada com um selo individual, colocado no seu casco.

“Pedimos à população que não compre animais de origem duvidosa. Com isso, as pessoas  ajudarão a combater a captura da tartaruga amazônica, que está em risco de extinção”, apelou Cordeiro, lembrando que o comércio ilegal de quelônios está também ligado à violência rural. “A população pode ajudar não comprando e denunciando. Até porque esses animais ilegais são caros [custam entre R$ 300 a R$ 1.000, de acordo com o tamanho e a época], grande parte da população não tem mesmo acesso a eles”.

Cordeiro informou ainda que a multa por cada quelônio capturado ilegalmente é de R$ 500. O infrator está sujeito também a um processo penal, que a princípio pode levar à sua prisão, embora na prática isso raramente aconteça. O telefone do disque denúncia do Ibama no Amazonas é: (92) 3613-3081.

Quase um ano depois, não-índios continuam na TI Raposa-Serra do Sol (RR), homologada em abril de 2005

Dos mais de 220 posseiros existentes na área, apenas 52 foram indenizados por benfeitorias construídas de boa-fé. O governo diz que já tem os R$ 754 mil necessários para pagar outros 25 colonos cujos processos estão finalizados. Resta ainda terminar os processos de aproximadamente 145 posses, o que a Funai diz que vai fazer até o dia 15 do próximo mês. A retirada de todos os ocupantes promete arrastar-se ainda por vários meses e até anos.

O governo federal não vai cumprir a promessa feita pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e oficializada em decreto assinado no ano passado de retirar, até o dia 15 de abril próximo, todos os posseiros da Terra Indígena Raposa-Serra do Sol, em Roraima. A maior parte dos ocupantes sequer foi indenizada. A regularização fundiária do território de mais de 16 mil Ingarikó, Wapixana, Taurepang, Macuxi e Patamona é propalada frequentemente pelo Palácio do Planalto como o maior trunfo da política indigenista da administração atual.

Segundo a Fundação Nacional do Índio (Funai), de 2002 a 2005, dos mais de 220 ocupantes existentes na área (o número não é definitivo), apenas 52 foram indenizados por benfeitorias construídas de boa-fé. O governo diz que já tem os R$ 754 mil necessários para pagar outros 25 colonos cujos processos já estão finalizados. Resta ainda terminar os processos de aproximadamente 145 posses, o que a Funai promete fazer até o dia 15 de abril próximo.

A retirada de todos os ocupantes pode arrastar-se ainda por vários meses e até anos – tudo depende da agilidade administrativa, da disponibilidade orçamentária e do andamento de eventuais ações judiciais. Os posseiros podem não aceitar os valores oferecidos como indenização. Neste caso, o dinheiro é depositado em juízo e os ocupantes, de acordo com a legislação, podem ser retirados pelo governo. O problema é que principalmente a Justiça Federal local pode conceder liminares garantindo a permanência na TI. Sobretudo os grandes fazendeiros prometem uma longa batalha judicial por suas posses.

Peregrinação no Planalto

Na semana passada, 13 lideranças indígenas de Roraima estiveram em Brasília e fizeram uma verdadeira peregrinação por vários órgãos da administração federal – Casa Civil, Ministério da Justiça, Funai, Polícia Federal, Ministério do Exército – para encaminhar reivindicações sobre uma série de problemas em áreas como meio ambiente, saúde, educação, segurança e questão fundiária. A TI Raposa-Serra do Sol foi o primeiro ponto da pauta. Os representantes indígenas arrancaram a promessa de que a desintrusão (retirada de invasores) da área seria apressada e que a equipe responsável pelo processo seria ampliada. A PF também avalia a possibilidade de manter um contingente de policiais na região.

As lideranças acusam o governo de ter iniciado muito tarde o levantamento fundiário e a avaliação das benfeitorias: o trabalho só começou em setembro do ano passado. Segundo o coordenador-geral de Assuntos Fundiários da Funai, José Aparecido Donizete Briner, o treinamento da equipe responsável pela tarefa começou já em maio, mas logo em seguida a Fundação enfrentou uma greve de 40 dias. Burocracia e problemas administrativos, como a mudança nos procedimentos de algumas licitações, teriam atrasado ainda mais o processo. “Só para ter uma idéia, levamos 35 dias para alugar um carro. Honestamente, em termos de Funai, um ano é um tempo muito curto. Alguns processos como este levam anos”, justifica Briner. Ele garante que mais quatro técnicos devem se integrar ao trabalho nos próximos dias. Apesar de não informar valores, Briner diz que governo já tem disponível o dinheiro para indenizar todos os posseiros.

O advogado Raul Silva Telles do Valle, do Instituto Socioambiental (ISA), considera que os entraves burocráticos possivelmente impedirão que o governo cumpra a meta por ele mesmo estabelecida. “É incrível como o Estado não consegue realizar uma ação concentrada e articulada, mesmo quando o caso é identificado como prioridade política. Se houvesse planejamento estratégico, pelo menos para este caso – que é usado como bandeira da política indigenista do governo federal – as equipes de campo já estariam treinadas e com verba garantida para começar os trabalhos na semana seguinte à homologação, o que significaria que hoje a maior parte dos posseiros de boa-fé já estariam indenizados e fora da área”, defende. Valle ratifica a avaliação de que, com greves e desorganização, o caso possivelmente se arrastará por um longo tempo.

Clima tenso

Enquanto isso, segundo o Conselho Indígena de Roraima (CIR), o clima na região está mais tenso – com constantes ameaças da parte de grupos chefiados por grandes produtores rurais que se recusam a sair da área – à medida que se aproxima a data-limite fixada pelo decreto. O CIR divulgou a informação de que seis homens teriam entrado atirando para o alto na aldeia Cumanã I e ameaçando atear fogo nas casas, na manhã do último dia 9 de março. A PF abriu um inquérito sobre o caso. Segundo a organização indígena, os funcionários da Funai e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) responsáveis pelo trabalho de campo têm sofrido ameaças. Briner confirma a denúncia e informa que, na semana que vem, os técnicos do governo contarão com escolta da PF para chegar a algumas regiões.

“Desde meados do ano passado, a Raposa-Serra do Sol está sem nenhuma segurança. O posto da PF foi desativado. A situação está ficando mais tensa. Muitos fazendeiros dizem que não vão sair, que vão resistir a qualquer ação para retirá-los”, alerta Marinaldo Justino Trajano Macuxi, coordenador do CIR. Ele conta ainda que grandes produtores rurais estão assentando grupos de indígenas cooptados por eles em locais próximos às suas lavouras para tentar justificar sua permanência na TI e até mesmo a exclusão de trechos de seu território. “Esta situação só será resolvida com a desintrusão total de nossas terras”. O CIR também tem denunciado o apoio dado pelo governo e por parlamentares estaduais aos grandes fazendeiros com posses na área.

Em 17 de setembro do ano passado, alguns dias antes do início da festa pela homologação da TI, cerca de cem homens encapuzados e pintados, entre índios e não-índios, invadiram e destruíram a maior parte dos dois prédios do Centro Indígena de Formação e Cultura Raposa-Serra do Sol, na comunidade do Barro, a aproximadamente 200 quilômetros de Boa Vista. Durante a invasão, quatro pessoas ficaram feridas. (saiba mais). No dia 22 de setembro, já durante as celebrações, a ponte de acesso à aldeia de Maturuca, centro dos festejos, foi parcialmente incendiada. A suspeita é que o crime teria sido cometido pelo mesmo grupo (confira).