Quase um ano depois, não-índios continuam na TI Raposa-Serra do Sol (RR), homologada em abril de 2005

O governo federal não vai cumprir a promessa feita pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e oficializada em decreto assinado no ano passado de retirar, até o dia 15 de abril próximo, todos os posseiros da Terra Indígena Raposa-Serra do Sol, em Roraima. A maior parte dos ocupantes sequer foi indenizada. A regularização fundiária do território de mais de 16 mil Ingarikó, Wapixana, Taurepang, Macuxi e Patamona é propalada frequentemente pelo Palácio do Planalto como o maior trunfo da política indigenista da administração atual.

Segundo a Fundação Nacional do Índio (Funai), de 2002 a 2005, dos mais de 220 ocupantes existentes na área (o número não é definitivo), apenas 52 foram indenizados por benfeitorias construídas de boa-fé. O governo diz que já tem os R$ 754 mil necessários para pagar outros 25 colonos cujos processos já estão finalizados. Resta ainda terminar os processos de aproximadamente 145 posses, o que a Funai promete fazer até o dia 15 de abril próximo.

A retirada de todos os ocupantes pode arrastar-se ainda por vários meses e até anos – tudo depende da agilidade administrativa, da disponibilidade orçamentária e do andamento de eventuais ações judiciais. Os posseiros podem não aceitar os valores oferecidos como indenização. Neste caso, o dinheiro é depositado em juízo e os ocupantes, de acordo com a legislação, podem ser retirados pelo governo. O problema é que principalmente a Justiça Federal local pode conceder liminares garantindo a permanência na TI. Sobretudo os grandes fazendeiros prometem uma longa batalha judicial por suas posses.

Peregrinação no Planalto

Na semana passada, 13 lideranças indígenas de Roraima estiveram em Brasília e fizeram uma verdadeira peregrinação por vários órgãos da administração federal – Casa Civil, Ministério da Justiça, Funai, Polícia Federal, Ministério do Exército – para encaminhar reivindicações sobre uma série de problemas em áreas como meio ambiente, saúde, educação, segurança e questão fundiária. A TI Raposa-Serra do Sol foi o primeiro ponto da pauta. Os representantes indígenas arrancaram a promessa de que a desintrusão (retirada de invasores) da área seria apressada e que a equipe responsável pelo processo seria ampliada. A PF também avalia a possibilidade de manter um contingente de policiais na região.

As lideranças acusam o governo de ter iniciado muito tarde o levantamento fundiário e a avaliação das benfeitorias: o trabalho só começou em setembro do ano passado. Segundo o coordenador-geral de Assuntos Fundiários da Funai, José Aparecido Donizete Briner, o treinamento da equipe responsável pela tarefa começou já em maio, mas logo em seguida a Fundação enfrentou uma greve de 40 dias. Burocracia e problemas administrativos, como a mudança nos procedimentos de algumas licitações, teriam atrasado ainda mais o processo. “Só para ter uma idéia, levamos 35 dias para alugar um carro. Honestamente, em termos de Funai, um ano é um tempo muito curto. Alguns processos como este levam anos”, justifica Briner. Ele garante que mais quatro técnicos devem se integrar ao trabalho nos próximos dias. Apesar de não informar valores, Briner diz que governo já tem disponível o dinheiro para indenizar todos os posseiros.

O advogado Raul Silva Telles do Valle, do Instituto Socioambiental (ISA), considera que os entraves burocráticos possivelmente impedirão que o governo cumpra a meta por ele mesmo estabelecida. “É incrível como o Estado não consegue realizar uma ação concentrada e articulada, mesmo quando o caso é identificado como prioridade política. Se houvesse planejamento estratégico, pelo menos para este caso – que é usado como bandeira da política indigenista do governo federal – as equipes de campo já estariam treinadas e com verba garantida para começar os trabalhos na semana seguinte à homologação, o que significaria que hoje a maior parte dos posseiros de boa-fé já estariam indenizados e fora da área”, defende. Valle ratifica a avaliação de que, com greves e desorganização, o caso possivelmente se arrastará por um longo tempo.

Clima tenso

Enquanto isso, segundo o Conselho Indígena de Roraima (CIR), o clima na região está mais tenso – com constantes ameaças da parte de grupos chefiados por grandes produtores rurais que se recusam a sair da área – à medida que se aproxima a data-limite fixada pelo decreto. O CIR divulgou a informação de que seis homens teriam entrado atirando para o alto na aldeia Cumanã I e ameaçando atear fogo nas casas, na manhã do último dia 9 de março. A PF abriu um inquérito sobre o caso. Segundo a organização indígena, os funcionários da Funai e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) responsáveis pelo trabalho de campo têm sofrido ameaças. Briner confirma a denúncia e informa que, na semana que vem, os técnicos do governo contarão com escolta da PF para chegar a algumas regiões.

“Desde meados do ano passado, a Raposa-Serra do Sol está sem nenhuma segurança. O posto da PF foi desativado. A situação está ficando mais tensa. Muitos fazendeiros dizem que não vão sair, que vão resistir a qualquer ação para retirá-los”, alerta Marinaldo Justino Trajano Macuxi, coordenador do CIR. Ele conta ainda que grandes produtores rurais estão assentando grupos de indígenas cooptados por eles em locais próximos às suas lavouras para tentar justificar sua permanência na TI e até mesmo a exclusão de trechos de seu território. “Esta situação só será resolvida com a desintrusão total de nossas terras”. O CIR também tem denunciado o apoio dado pelo governo e por parlamentares estaduais aos grandes fazendeiros com posses na área.

Em 17 de setembro do ano passado, alguns dias antes do início da festa pela homologação da TI, cerca de cem homens encapuzados e pintados, entre índios e não-índios, invadiram e destruíram a maior parte dos dois prédios do Centro Indígena de Formação e Cultura Raposa-Serra do Sol, na comunidade do Barro, a aproximadamente 200 quilômetros de Boa Vista. Durante a invasão, quatro pessoas ficaram feridas. No dia 22 de setembro, já durante as celebrações, a ponte de acesso à aldeia de Maturuca, centro dos festejos, foi parcialmente incendiada. A suspeita é que o crime teria sido cometido pelo mesmo grupo.

Incêndio de ponte impede o trânsito de 3 mil pessoas na festa da homologação da Raposa-Serra do Sol

Os presidentes do Incra e da Funai estão participando das comemorações. O Ministério da Justiça proibiu a entrada de mais convidados na área por medida de segurança. A suspeita é de que o incêndio tenha sido provocado pelo mesmo grupo que destruiu o Centro de Formação e Cultura Raposa-Serra do Sol, no último sábado. O Conselho Indígena de Roraima vinha recebendo ameaças de que sua sede em Boa Vista também seria incendiada.

O incêndio parcial da ponte que atravessa o rio Urucuri e dá acesso à aldeia Maturuca, a cerca de 290 km de Boa Vista, capital de Roraima, praticamente paralisou o trânsito de mais de 3 mil pessoas na Terra Indígena (TI) Raposa-Serra do Sol. O fogo ocorreu na madrugada de hoje, quinta-feira, 22 de setembro, segundo dia das comemorações pela homologação da TI, assinada pelo presidente Luís Inácio Lula da Silva em abril deste ano. Eram esperadas para o evento cerca de 8 mil pessoas. O Ministério da Justiça proibiu a entrada de mais convidados na área por medida de segurança. Segundo a Polícia Federal (PF), há condições de tráfego reduzido pela ponte. O Exército já teria sido acionado para recuperá-la e a expectativa é que esteja consertada até amanhã, sexta-feira.

O presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Mércio Pereira Gomes, o presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Rolf Hackbart, e a subprocuradora da 6ª Câmara do Ministério Público Federal, Débora Duprat, estão participando da festa. Uma senadora italiana também estaria no local.

A PF deslocou 65 policiais de outros Estados para garantir a segurança das autoridades. Desde a semana passada, a instituição divulgou que estava preparando um esquema especial de segurança para as comemorações com a participação de cerca de cem homens. Até ontem, quarta-feira, apenas um pequeno grupo composto por integrantes do serviço de inteligência da instituição e de outros agentes que acompanham os representantes do governo federal estava no local.

“Não houve falha da PF. Acho que as coisas estão se desenvolvendo a contento. O Estado é muito grande e não há agentes para cobrir todo o seu território”, garantiu Ivan Herrero, superintendente interino da PF em Roraima. Ele não informou com precisão o número de policiais federais lotados no Estado, mas disse que o órgão, em todo o País, depende do deslocamento de novos contingentes em casos semelhantes. “Já abrimos um inquérito para apurar tudo o que está acontecendo”. Herrero disse ainda que a Superintendência em Roraima está recebendo todo apoio do diretor-geral da PF, Paulo Fernando da Costa Lacerda, que está sensibilizado com a "situação caótica" na região.

O superintendente afirmou que teve acesso a informações de que poderia haver seqüestro de pessoas durante a festa, mas que a ameaça não se confirmou. Em maio, a PF desativou a barreira de fiscalização que mantinha próxima à ponte, logo após o desfecho pacífico do seqüestro de quatro policiais federais. Entre 22 e 30 de abril, eles foram mantidos reféns por moradores da aldeia Flechal como uma forma de protesto contra a homologação em área contínua da Terra Indígena.

A assessoria de imprensa da Superintendência afirmou à reportagem do ISA que o clima na região é de “tranqüilidade e de normalidade” e também negou a existência de ameaça de queima de outras pontes.

Nos últimos dias, o Conselho Indígena de Roraima (CIR) vinha recebendo ameaças de que sua sede em Boa Vista também seria incendiada. No início da semana, a organização fez o seguro de suas instalações, temendo por prejuízos.

Existe a suspeita de que o incêndio da ponte no rio Urucuri tenha sido provocado pelo mesmo grupo que destruiu parcialmente o Centro de Formação e Cultura Raposa-Serra do Sol, antiga Missão Surumu, na comunidade do Barro, também localizada na Raposa-Serra do Sol, no último sábado, dia 17 de setembro. Cerca de cem homens encapuzados ou pintados, entre índios e não-índios, armados de espingardas, facões e cacetetes, invadiram, queimaram e depredaram as instalações da escola, entre elas a igreja, o hospital, dormitórios, refeitórios, secretaria e salas de aula. De acordo com a PF, quatro pessoas ficaram feridas. Uma ambulância que saía do local na hora também foi danificada (saiba mais).

Segundo informações colhidas no local pelo CIR, o ataque do sábado teria sido coordenado por Anísio Pedrosa, vice-prefeito de Pacaraima, município localizado na TI São Marcos, ao lado da TI Raposa-Serra do Sol. Genilvaldo Macuxi, vereador e tuxaua (liderança indígena) da aldeia de Contão, também teria participado da invasão. Os dois seriam ligados ao prefeito de Pacaraima, Paulo César Quartiero (PDT), maior produtor de arroz da região. Quartiero foi denunciado pelo MPF como um dos líderes de outro ataque, realizado contra as aldeias de Homologação, Brilho do Sol, Jawari e Lilás, em novembro de 2004 (confira).

As ações seriam uma represália à homologação da Terra Indígena em área contínua decretada em abril deste ano. A grande maioria dos mais de 16 mil indígenas que moram na região é favorável à medida, mas há grupos aliados de políticos, fazendeiros e empresários que discordam e defendem que alguns trechos de território sejam excluídos da TI. Com o reconhecimento oficial definitivo do direito dos índios, grandes produtores rurais, principalmente de arroz, terão de deixar a área.

Homens encapuzados invadem e tocam fogo em Centro Indígena de Formação

Faltando quatro dias para começar a festa da homologação da terra indígena Raposa Serra do Sol, cerca de 150 homens encapuzados e armados com revólveres, espingardas, facões e pedaços de pau, invadiram e tocaram fogo, nesta madrugada, no Centro de Formação e Cultura Raposa Serra do Sol, antiga Missão Surumu, a cerca de 230 quilômetros de Boa Vista.

Segundo informações colhidas por uma equipe do Conselho Indígena de Roraima – CIR, que esteve no local hoje pela manhã, o vandalismo foi coordenado, supostamente, pelo vice-prefeito de Pacaraima, Anísio Pedrosa, e pelo vereador do município e tuxaua da aldeia Contão, Genilvaldo Macuxi. Os dois são ligados ao prefeito de Pacaraima, Paulo César Quartiero, maior produtor de arroz da região.

A antiga Missão Surumu também foi invadida e depredada em janeiro de 2004 pelo mesmo grupo comandado por Quartieiro, que ameaça resistência armada a qualquer tentativa de retirada da área, homologada no dia 15 de abril pelo presidente Lula da Silva. Em 2004, três missionários foram seqüestrados e, mesmo a Polícia Federal tendo indiciado arrozeiros e líderes indígenas, até hoje niguém foi punido.

No ataque desta madrugada, as instalações do Centro foram completamente destruídas: igreja, hospital, dormitórios, refeitório masculino e feminino, banheiros, biblioteca, sala e quartos dos professores. (veja fotos anexadas).

Durante a invasão, um professor do curso de Mecânica e cerca de 30 alunos estavam no Centro de Formação. O professor Júlio que trabalha para o Senai, entidade parceira do Centro, foi agredido fisicamente, mas não corre perigo de morte.

Um veículo Toyota do Convênio do CIR com a Funasa para Atenção Básica à Saúde no Distrito Sanitário Leste de Roraima, que fazia remoção de um paciente para Boa Vista, também foi interceptado pelo grupo. Os motoristas tiveram armas apontadas para suas cabeças, sofreram humilhações, agressões verbais e o carro foi depredado e o paciente indígena agredido fisicamente. Após a agressão, uma aeronave foi fretada para remover a vítima.

A Polícia Federal foi comunicada dos acontecimentos e nas primeiras horas da manhã de hoje enviou uma equipe para o local. Por volta do meio dia, os agentes chegaram em Boa Vista trazendo alunos, professor e lideranças indígenas para prestarem depoimentos.

O Conselho Indígena de Roraima repudia mais essa atitude covarde dos setores contrários aos direitos indígenas, manipulados por grupos políticos e econômicos, que historicamente usam a violência e valem-se da impunidade para conquistar os seus objetivos.

Homens encapuzados ateiam fogo no Centro de Cultura Raposa Serra do Sol

Brasília – Cerca de 150 homens encapuzados atearam fogo no Centro de Cultura Raposa Serra do Sol, em Roraima, depois de invadir as instalações na madrugada de hoje (17). De acordo com o representante do Conselho Indígena de Roraima (CIR), João Carlos, os invasores estavam armados com revólveres, espingardas e facões. Um dos professores do centro foi agredido, mas não corre risco de morte. Não há informações sobre outros feridos.

João Carlos disse que esta não é a primeira vez que ocorrem invasões como esta. "Achamos que são as mesmas pessoas que estão por trás deste acontecimento, porque não é a primeira vez que coisas assim acontecem", acentua.

Ele afirmou que suspeita do prefeito do município de Pacaraima, Paulo César Quartiero. "O prefeito é um dos principais arrozeiros da região. Por isso é um dos principais suspeitos", relata. Segundo Carlos, Quartiero foi indiciado pela Polícia Federal, em 2004, sob a acusação de seqüestrar três missionários que defendiam a área.

A região da reserva indígena Raposa Serra do Sol é disputada por rizicultores, fazendeiros e índios há 20 anos. A primeira demarcação das terras ocorreu em 1998. A situação agravou-se em abril, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva homologou os limites da reserva.

Indígenas de Raposa Serra do Sol conseguem nova vitória na Justiça

As três famílias macuxi que moram na comunidade Brilho do Sol, no sul da terra indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, não são mais obrigadas a deixar a reserva. Na última sexta-feira (dia 10), o ministro Carlos Britto, do Supremo Tribunal Federal (STF) deferiu a liminar pedida por Joênia Batista de Carvalho, coordenadora jurídica do Conselho Indígena de Roraima (CIR), no dia anterior. Nela, a advogada solicitava ao STF que suspendesse imediatamente a execução do mandado de manutenção e reintegração de posse concedido pela 1ª Vara de Justiça Federal de Roraima a José Wilson da Silva, coronel reformado da Polícia Militar (PM). O mandado ordenava que a comunidade deixasse espontaneamente a terra indígena até domingo, sob o risco de ser retirada à força pela Polícia Federal (PF) a partir de hoje (13).

"Essa decisão é mais uma vitória que fortalece a homologação da Raposa, permite que os indígenas possam viver e trabalhar com tranqüilidade. A gente agora aguarda que o STF acabe com a ação possessória que deu origem ao mandado. Esse foi o outro pedido que fizemos ao tribunal", explicou Joênia.

José Wilson foi um dos proprietários de terra que entraram na Justiça em 2004 com ações possessórias que questionavam a portaria 820, de 1998, que estabelecia a demarcação em área contínua da Raposa Serra do Sol. A maioria dessas ações foi revogada porque o plenário do STF as julgou prejudicadas pela "perda de objeto" – já que as terras, agora, eram indígenas –, mas a ação possessória em questão não constava da lista analisada pelos ministros.

A comunidade Brilho do Sol fica na região do Baixo Cutingo, no sul da Raposa Serra do Sol. Ela faz parte de um grupo de cinco aldeias que foram reocupadas pelos indígenas no segundo semestre do ano passado, como uma estratégia do CIR para fazer resistência à expansão dos arrozais dentro da terra indígena.

No dia 23 de novembro, as cinco comunidades tiveram as casas queimadas por um grupo suspostamente liderado pelos rizicultores. O caso está sendo investigado pela Polícia Federal.

Justiça determina que comunidade indígena deve deixar Raposa Serra do Sol (RR)

Manaus – As três famílias indígenas que moram na comunidade Brilho do Sol, no sul da reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima, têm até o dia 12 de junho para deixar espontaneamente o local, sob o risco serem retiradas à força pela Polícia Federal (PF) ou pela Polícia Militar (PM). Além disso, o não cumprimento da ordem judicial obrigará o Conselho Indígena de Roraima (CIR) e a Fundação Nacional do Índio (Funai) a pagar multa diária de R$ 10 mil. A decisão do juiz Helder Girão Barreto, da 1ª Vara de Justiça Federal de Roraima, responde ao mandado de manutenção e reintegração de posse concedido ao coronel reformado da Polícia Militar, José Wilson da Silva.

O mandado foi entregue à comunidade Brilho do Sol por dois oficiais de Justiça, no dia 2 de junho. Segundo Joênia Batista de Carvalho, coordenadora do Departamento Jurídico do CIR, José Wilson foi um dos proprietários de terra que, em 2004, questionaram na Justiça a Portaria 820/98, que estabelecia a demarcação em área contínua da terra indígena Raposa Serra do Sol.

"Quando o Ministério da Justiça editou uma nova portaria de demarcação, em abril deste ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) revogou todas as ações que contestavam a portaria anterior, porque entendeu que elas perderam o objeto. Mas a ação em questão foi ignorada", explica. Na próxima sexta-feira, a advogada deve ingressar no STF com uma petição em nome dos indígenas da comunidade Brilho do Sol, pedindo que a ação movida pelo coronel Wilson também seja extinta.

Marcos Marcelus Goulart, procurador da República em Roraima, afirma que, em novembro, o Ministério Público Federal (MPF) questionou a ação do coronel Wilson. "Alegamos ausência de requisitos para a concessão de liminar porque não se configurava invasão de propriedade particular, pois a terra já estava demarcada". Na última semana, o MPF protocolou uma reclamação no STF, questionando a competência do juiz Girão Barreto para expedir o mandado de reintegração de posse. "Este assunto deve ser tratado no STF", diz o procurador.

A Funai, por meio da Advocacia Geral da União (AGU), também já pediu ao STF a revogação da liminar, informa Gonçalo Santos, administrador regional da autarquia.

Segundo a assessoria de comunicação da Justiça Federal de Roraima, o juiz Girão Barreto não se pronunciará sobre o caso. Já o coronel José Wilson da Silva declarou que a decisão da Justiça foi uma surpresa para ele e seu advogado – e que só concederá entrevista depois que estiver bem informado sobre o assunto.

No dia 15 de abril, um decreto presidencial homologou a terra indígena Raposa Serra do Sol, estabelecendo um prazo de 12 meses para que os não-indígenas deixem a reserva. A comunidade Brilho do Sol fica na região do Baixo Cutingo, no sul da reserva. Ela faz parte de um grupo de cinco comunidades que foram reocupadas pelos indígenas no segundo semestre do ano passado, como uma estratégia do CIR para fazer resistência à expansão dos arrozais dentro da terra indígena. No dia 23 de novembro, as cinco comunidades tiveram as casas queimadas por um grupo suspostamente liderado pelos produtores de arroz. O caso está sendo investigado pela Polícia Federal.

ndice de desmatamento na Amazônia surpreende presidente do Ibama

O presidente do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), Marcus Barros, disse ter sido surpreendido com o crescimento de 6% do desmatamento da Amazônia em um ano, apurado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Acrescentou que o índice esperado para o biênio 2003/2004 era de 2%.

"Estávamos lutando para isso, mas temos noção de que as medidas que adotamos não se consolidaram todas. Elas ainda não estão casadas para ter os resultados que esperamos e assim diminuir mais expressivamente o desmatamento", afirmou.

Além do Plano de Combate ao Desmatamento, iniciado ano passado, uma outra iniciativa para evitar a devastação da Amazônia aguarda aprovação do Congresso Nacional. É o Projeto de Lei Geral sobre Gestão de Florestas, que prevê a concessão de até 13 milhões de hectares de florestas na Amazônia para uso sustentável nos próximos dez anos.

No entanto, para Jean Pierre Leroy, relator de Direitos Humanos e Meio Ambiente da Plataforma Brasileira de Direitos Humanos, Econômicos, Sociais e Culturais (Dhesc), não há garantias de que as empresas farão uma gestão sustentável da floresta. E há dúvida sobre a possibilidade comercial desse tipo de estratégia a longo prazo: "Se não funcionar, as empresas vão abandonar o projeto, deixando tudo para trás".

Em cinco dos nove estados que compõem a Amazônia – Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins – foi registrada redução no tamanho das áreas desmatadas. Em Tocantins, a destruição caiu 44%; no Amazonas, 39%; no Maranhão, 26%; no Acre, 18%; e no Pará, 2%. Já o estado de Mato Grosso foi responsável por quase metade do desmatamento total na Amazônia.

Governo federal anuncia cinco medidas para reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima

O governo federal anuncia, em Boa Vista, a instalação de um comitê gestor responsável por coordenar as ações federais em Roraima. O Conselho Indígena de Roraima (CIR) e a Sociedade dos Indígenas Unidos do Norte de Roraima (Sodiur) participam da reunião no auditório do Tribunal Regional do Trabalho. "O comitê terá um grupo executivo que estará permanentemente no estado. Na medida em que houver entendimento com o governo estadual e, eventualmente, com governos municipais, podemos trabalhar conjuntamente questões e planos que promovam o desenvolvimento sustentável do estado", explica Johaness Eck, coordenador do comitê.

A Agência Brasil teve acesso as cinco medidas que estão sendo anunciadas hoje (5). A primeira delas é que, em trinta dias, a Fundação Nacional do Índio (Funai) vai pagar R$ 1 milhão em indenização para 27 famílias não-indígenas que estão na terra indígena Raposa Serra do Sol – homologada no dia 15 de abril. Com isso, mais de 90% das famílias que deverão deixar a área em até um ano estarão indenizadas.

A segunda medida é que o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) vai reforçar a linha de crédito especial para projetos desenvolvidos em terras indígenas. A linha de crédito tem juros de 4% ao ano e faz parte do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf). A Funai será a responsável por receber os projetos e encaminhá-los ao Banco da Amazônia (Basa). A primeira comunidade já beneficiada é a do Flechal, com a liberação de R$ 127 mil para que 17 famílias plantem feijão. O Flechal é a comunidade na qual quatro policiais federais foram feitos reféns, durante oito dias, por indígenas ligados a Sodiur e contrários à homologação da reserva em área contínua. O Basa tem 30 dias para avaliar outros cinco projetos já apresentados.

O terceiro anúncio é que o Ministério das Minas e Energia, em parceria com a Eletronorte, irá garantir que todas as 63 escolas da Raposa Serra do Sol tenham energia elétrica. Isso será feito por meio do programa Luz para Todos, com a instalação de painéis solares, um investimento de R$ 470 mil. Os painéis já estão disponíveis e devem ser instalados em até 30 dias.

A quarta ação divulgada é que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e a Funai, em conjunto com o povo Ingarikó, irão refazer o plano de gestão do Parque Nacional do Monte Roraima. Segundo a assessoria de comunicação do Palácio do Planalto, o atual Plano de Monitoramento do parque, desenvolvido durante o governo Fernando Henrique Cardoso, não foi discutido com os cerca de mil indígenas Ingarikó que ocupam a reserva. Em 60 dias o novo plano de gestão deverá estar pronto.

A quinta medida anunciada é que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) já iniciou o levantamento dos lotes vagos nos projetos de assentamento de Roraima. Em até 90 dias o trabalho deverá ser concluído. As 28 famílias que receberão indenização da Funai serão as primeiras a serem assentadas.

Presidente Lula homologa seis terras indígenas

Brasília – Em cerimônia comemorativa ao Dia do Índio, que está sendo realizada no Palácio do Planalto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva homologa seis terras indígenas, localizadas nos estados de Roraima, Tocantins, Maranhão, Amazonas e Pará. O anúncio foi feito pelo presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Mércio Pereira Gomes, em entrevista ao programa Repórter Nacional, da NBr, canal de TV a cabo do Poder Executivo.

Segundo a Funai, as terras homologadas totalizam cerca de 600 mil hectares. A medida vai beneficiar povos de oito etnias indígenas. A maior das seis reservas homologadas é a Inãwébohona, com 377 mil hectares, em Tocantins. No local, vivem 97 índios das etnias Avá-Canoeiro – considerados pela Funai povo em extinção -, Javaé e Karajá.

Entre as seis novas reservas, está a Awá (MA), que abriga 198 índios da etnia Guajá, numa área de 116,5 mil hectares. Também são homologadas hoje duas terras indígenas no Amazonas: a São Sebastião, com 61 mil hectares, onde vivem 224 índios das etnias Kaixana e Kokáma, e a Espírito Santo, com 33 mil hectares, onde moram 121 índios Kokáma.

Representantes das etnias Macuxi e Wapixana foram beneficiados com a homologação da terra indígena Tabalascada, em Roraima. Na área, de 13 mil hectares, vivem 302 índios das duas etnias.

O presidente Lula homologou ainda a reserva indígena Maranduba, onde vivem 31 índios da etnia Karajá, numa área de 375 hectares, localizada parte no Pará e parte em Tocantins.

Com a homologação das seis terras indígenas, sobe para 55 o número de reservas homologadas durante o governo Lula. Segundo o presidente da Funai, a meta do governo é homologar 100 terras indígenas até o final de 2006. "Isso é um recorde de determinação do presidente no que se refere à homologação de terras", ressaltou Gomes.

Segundo o presidente da Funai, atualmente vivem no Brasil 440 mil índios, de 220 etnias, que falam 170 línguas. A Funai reconhece 604 terras indígenas, das quais 481 já foram homologadas ou estão em processo de demarcação. "A homologação é o último dos passos para o reconhecimento formal de uma terra indígena. Primeiro precisa ser identificada, demarcada, e então é o presidente que dá o selo oficial da República brasileira pelas terras indígenas", explicou Gomes.

STF concede liminar a Mozarildo Cavalcanti e adia homologação

A ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Ellen Gracie suspendeu, na última segunda-feira, dia 3/1, a portaria 820/98 do Ministério da Justiça que oficializou a demarcação da Terra Indígena Raposa-Serra do Sol, em Roraima. A decisão liminar atendeu a uma Ação Cautelar ajuizada pelo senador Mozarildo Cavalcanti (PPS-RR) e volta a impedir a homologação em área contínua da TI, pelo menos até que os outros ministros do tribunal opinem sobre a questão, o que pode ocorrer em fevereiro. Há ainda a possibilidade do relator do caso, ministro Carlos Aires Britto, cassar a deliberação de sua colega.

Em sua decisão, Gracie argumenta que a TI não poderia ser homologada antes do julgamento de mérito da ação impetrada por alguns fazendeiros contra a portaria 820 ou antes de uma outra decisão do STF, esta sobre a Reclamação 2833 da Procuradoria-Geral da República (PGR) que, por sua vez, questiona um suposto conflito federativo entre a União e o estado de Roraima na mais recente batalha judicial envolvendo o caso.

No último dia 15 de dezembro, Britto havia suspendido as liminares que impossibilitavam a homologação em área contínua. Com isso, a medida voltara a depender apenas da assinatura de um decreto pelo presidente Luís Inácio Lula da Silva. Informações divulgadas pela imprensa nos últimos dias davam conta de que o governo estaria fazendo os ajustes finais no texto do ato e pretendia publicá-lo até o final deste mês.

“É a demora do governo que está permitindo todas essas reações, tanto as ações judiciais quanto os atos de violência”, aponta Joênia Wapixana, advogada do Conselho Indígena de Roraima (CIR). Ela refere-se, em especial, às agressões promovidas por produtores rurais, no final de novembro passado (confira). Joênia alerta que a última decisão do STF pode estimular novos atos de violência. “O governo e o Ministério Público Federal têm de tomar providências urgentes, precisamos garantir a segurança da comunidade”.

Procurada pela reportagem do ISA, a Advocacia-Geral da União(AGU) informou que ainda está estudando a possibilidade de recorrer da decisão de Ellen Gracie.

Há mais de 20 anos, as comunidades indígenas Ingarikó, Macuxi, Patamona, Taurepang e Wapixana lutam pelo reconhecimento definitivo da Terra Indígena Raposa-Serra do Sol, mas somente em 1998 o Ministério da Justiça publicou a portaria que oficializou a demarcação em área contínua, totalizando um território de 1,67 milhão de hectares. Em 1999, com o apoio de políticos, de empresários e do governo estadual, fazendeiros da região impetraram uma ação popular contra a portaria (foi esta última ação que havia sido suspensa por Britto, no dia 15/12).

Argumentos antigos

Em seu pedido de liminar, Cavalcanti repete os argumentos já utilizados na ação popular que originou o processo da Raposa-Serra do Sol. Entre eles, o de que a homologação em área contínua “importará na retirada de milhares de pessoas” e no acirramento dos conflitos na região.

“Quando o território foi demarcado não houve aumento dos conflitos, esse discurso é usado para tentar assustar e constranger a sociedade”, rebate Joênia. Para ela, é a desinformação e a indefinição da situação que vem provocando insegurança na área. “Em outros lugares já foram feitas homologações em condições semelhantes e cada parte encontrou alternativas adequadas”.

A advogada também contesta a idéia de que a homologação em área contínua trará transtorno e mudanças abruptas para as populações não-indígenas. “O processo deve ser gradual, feito dentro da lei e seguindo um plano de retirada que disponibilize novas terras para essas pessoas. O governo diz que tem esse plano e temos informações de que o Incra estaria estudando o caso”.

Ao dizer que a demarcação proposta pelo MJ "abrange três municípios" e que a homologação "importará na retirada de milhares de pessoas" o pedido de liminar superestima a ocupação de não-indígenas na região. Na verdade, apenas a sede do município de Uiramutã está dentro do território demarcado – sua população estimada é de 6,3 mil pessoas, sendo que, de acordo com dados do CIR, cerca de 700 são não-indígenas. A cidade foi criada em 1996, após a identificação da TI.

Cavalcanti também volta a apontar um suposto prejuízo econômico ao estado em virtude da desativação das plantações de arroz existentes na área. A quase totalidade do rebanho bovino e da produção agrícola da região, no entanto, está hoje nas mãos dos próprios índios. Além disso, sabe-se que a frente agrícola mais dinâmica em Roraima está no sul do estado e não na parte abrangida pela Raposa-Serra do Sol.

Um senador contra a causa indígena

Mozarildo Cavalcanti só pôde sair vitorioso na última decisão do STF sobre a Raposa-Serra do Sol porque requereu e conseguiu ser admitido como “terceiro interessado” na Reclamação 2833 da PGR, depois de já ter conquistado a mesma competência na ação popular que originou todo o processo.

O senador tem se mostrado um fiel aliado dos grupos que se opõem à demarcação das TIs em Roraima. Com a apresentação de projetos e a coordenação de investigações parlamentares, ele se destacou, nos últimos anos, como uma das principais vozes dos setores antiindígenas brasileiros no Congresso Nacional, embora se auto-intitule defensor dos interesses dos índios.

Cavalcanti foi eleito para o Senado em 1998, depois de exercer o mandato de deputado federal por duas vezes (1983-1987 e 1987-1991). Atualmente, é líder do Partido Popular Socialista (PPS) e presidente da Comissão Temporária Externa que analisa a questão indígena e fundiária nos estados de Roraima, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Rondônia e Rio Grande do Sul. No ano passado, a comissão apresentou o Projeto de Lei (PLS) 188, que, ao alterar o procedimento para a demarcação, cria uma série de dificuldades para a criação de novas TIs, entre elas, institui o controle do Senado sobre o processo.

Em 2001, o senador já havia sido responsável pelo requerimento para a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre as demarcações de áreas indígenas na Amazônia. Na prática, a investigação acabou tentando atingir os processos relativos às TIs Raposa-Serra do Sol e Yanomami(RR/AM).

O parlamentar também é autor da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 38/99, que limita a 50% do território de cada estado a área total passível de ser reconhecida como Unidade de Conservação (UC) ou TI.

Cavalcanti exerceu ainda a presidência da CPI destinada a investigar a atuação das organizações não-governamentais, mas que, na verdade, ficou marcada pela tentativa de criminalizá-las. No ano passado, ele conseguiu aprovar no Senado o Projeto de Lei 07/03, que impõe restrições ao direito de livre associação e cria uma série de controles burocráticos para restringir a ação das ONGs.